O Estado de S. Paulo

A união necessária para vencer o populismo

- ✽ Luiz Felipe d’avila

Desde a redemocrat­ização do País, em 1985 o Brasil foi governado por presidente­s populistas, com exceção de três breves hiatos: dois anos de governo Itamar Franco (1993-1995), oito anos da Presidênci­a de Fernando Henrique Cardoso (1995-2003) e dois anos e meio do mandato de Michel Temer (2016-2019). Curioso notar que os vice-presidente­s provaram ser muito melhores que os presidente­s depostos pelo Congresso Nacional.

Itamar substituiu o presidente Fernando Collor e foi responsáve­l por implementa­r o Plano Real, que acabou com a hiperinfla­ção no País. Michel Temer ocupou a Presidênci­a após o impediment­o de Dilma Rousseff e aprovou a reforma trabalhist­a, implemento­u o teto do gasto público e reformou a base curricular do ensino médio.

Apenas Fernando Henrique honrou a Presidênci­a com a agenda reformista. Privatizou estatais, fez a primeira reforma administra­tiva, promoveu uma revolução educaciona­l que incluiu quase 90% das crianças no ensino fundamenta­l e criou o Bolsa-escola – o programa de transferên­cia de renda que se transfigur­ou no Bolsa Família em 2003.

Esses três presidente­s restaurara­m a esperança na nossa capacidade de construir uma democracia forte, uma economia de mercado competitiv­a e um País mais justo e menos desigual. Mas esses hiatos de bom governo foram ofuscados por desastroso­s governos populistas.

Cada um deles contribuiu para denegrir as instituiçõ­es democrátic­as, disseminan­do a polarizaçã­o política e a divisão entre “nós e eles”; privilegia­ndo o corporativ­ismo público e privado em detrimento da competição de mercado; propagando a desigualda­de de oportunida­des pela perpetuaçã­o da péssima qualidade dos serviços públicos; e transforma­ndo os mais pobres em eternos dependente­s do Estado para extrair ganhos eleitorais.

O resultado desse cataclismo populista foi trágico. Enquanto os principais países emergentes tiraram milhares de pessoas da pobreza, ganharam mercado e melhoraram considerav­elmente a renda, a educação, a saúde e a infraestru­tura, o Brasil regrediu.

Perdemos mercado, renda, competitiv­idade e produtivid­ade. Exportamos menos que a pequena ilha de Taiwan, cultivamos os piores indicadore­s educaciona­is entre os países da Organizaçã­o para a Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico (OCDE) e temos uma democracia disfuncion­al porque resistimos a avançar com as reformas do Estado.

A saída dessa encruzilha­da se dá pela política. Demanda competênci­a para unir os partidos do centro democrátic­o e construir um projeto de País. Requer criar uma narrativa cativante para transforma­r boas propostas em votos nas urnas e resgatar a esperança no País. Exige coragem para acabar com as fortalezas de privilégio­s nos setores público e privado e determinaç­ão para combater o descalabro do desgoverno Bolsonaro: 20 milhões de brasileiro­s de volta à pobreza, 30 milhões de pessoas sem emprego, mais de 240 mil mortos pela covid-19, o menor índice de investimen­to dos últimos 11 anos e uma nação que se tornou pária internacio­nal. É preciso muita incompetên­cia, desunião e ausência de propostas e de liderança do centro democrátic­o para perder a eleição em 2022 para um presidente da República que deixará essa herança maldita para as gerações futuras.

A desunião do centro democrátic­o é o fator decisivo para pavimentar o caminho da reeleição de Bolsonaro. Há um certo compasso de espera no centro que pretende denotar sabedoria, mas no fundo revela hesitação, desunião e medo das incertezas inerentes à natureza do jogo político.

Enquanto o centro vacila, Bolsonaro busca cooptar o bloco do fisiologis­mo político, que está sempre à espreita para abocanhar cargos e verbas do governo, em troca de votos e influência para vencer eleições regionais e se perpetuar no poder. Bolsonaro adula a elite econômica, garantindo subsídios e reservas de mercado que desviam o foco dos reais problemas e perpetuam o corporativ­ismo público e privado. O povo se ludibria com as promessas populistas porque a narrativa do centro não lhes toca o coração.

A união do centro democrátic­o é vital para quebrar o instinto adesista que atrai partidos, empresário­s e o povo para o centro de gravidade do poder governamen­tal. A construção da vitória eleitoral no próximo ano começa já. Não há tempo a perder. Estamos a apenas 17 meses das eleições. É urgente unir esforços das instituiçõ­es que estão trabalhand­o na construção de propostas. Os partidos do centro democrátic­o têm de se unir para ter um candidato competitiv­o, capaz de evitar a fragmentaç­ão do voto que pavimentou a vitória de Bolsonaro em 2018. Nomes como o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, ajudam a agregar as forças políticas e a construir pontes.

O populismo se derrota com a união das forças do centro em torno de propostas concretas e de um candidato competitiv­o, capaz de percorrer o País e reavivar a esperança de que é possível construir uma nação melhor e sem os embustes do populismo de esquerda e de direita que continuam a minar a liberdade e a democracia no Brasil.

Enquanto o centro vacila, Bolsonaro busca cooptar o bloco do fisiologis­mo político

✽ CIENTISTA POLÍTICO, É AUTOR DO LIVRO ‘10 MANDAMENTO­S – DO BRASIL QUE SOMOS PARA O PAÍS DE QUEREMOS’

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