Cartão da XP acirra disputa com bancos
Nos cálculos da corretora, metade do dinheiro de seus três milhões de clientes está nos grandes bancos; segundo o fundador e presidente da empresa, Guilherme Benchimol, a XP pode dobrar os ativos sob custódia sem nenhum novo cliente
Dentro da estratégia de avançar sobre os produtos tradicionais dos grandes bancos, a XP Investimentos lançou ontem um cartão de crédito. Depois de testar o produto nos últimos meses com funcionários, agentes autônomos e alguns clientes, a plataforma se mune, agora, de uma importante arma para brigar pelo dinheiro investido nos grandes bancos. “Vamos continuar sendo contra os bancos pela forma com que eles tratam os clientes e continuar lutando contra a concentração bancária”, disse ontem o fundador e presidente da maior corretora do País, Guilherme Benchimol.
Segundo ele, no cálculo da empresa, metade do dinheiro dos três milhões de clientes da XP está nos grandes bancos. “Sem nenhum novo cliente, podemos dobrar nossos ativos sob custódia e chegar em R$ 1,4 trilhão”, disse Benchimol, sem abrir as metas para esse novo mercado. O movimento marca, contudo, a entrada mais nítida da XP em produtos bancários. “A concorrência só está começando e nosso projeto só está engatinhando”, destacou.
Benchimol afirmou que a XP segue tendo seu foco em investimentos e que o objetivo dos lançamentos de serviços bancários é complementar seu ecossistema. “Não é porque não somos um banco que não podemos oferecer aos nossos clientes bons produtos.” Em um primeiro momento, o cartão estará disponível apenas para os clientes com mais de R$ 50 mil na XP (a plataforma não abriu quantos são), mas a ideia é que chegue a todos até o fim do ano. Até o início desta semana, 35 mil pessoas estavam usando o produto, no esquema de teste. Com essa amostra, a XP observou, por exemplo, que esses usuários aumentaram seus investimentos na corretora em 10%, o que já indicaria uma dinâmica de fluxo de recursos dos bancos para a plataforma.
Os grandes bancos sempre estiveram na mira da XP. São eles que são apontados como seus maiores concorrentes, já que, apesar de as plataformas de investimento serem cada dia mais populares, 90% dos investimentos dos brasileiros ainda estão nos grandes bancos.
O responsável pela área digital da XP, Bruno Guarnieri, afirmou que não haverá cobrança de anuidade e que a taxa de juros é, em média, 50% mais baixa do que a cobrada do mercado. “Não queremos capitalizar sobre o cliente e ganhar nos juros. O que queremos é que a relação do cliente com a XP fique mais interessante”, disse o executivo. Ao longo do ano, a XP promete incorporar mais serviços bancários em sua plataforma, como a conta digital, e tem a meta de que, até o fim de 2021, o cliente possa ter toda sua vida financeira concentrada ali, sem precisar ter uma conta em um grande banco.
‘Investback’. A ideia por trás do novo cartão é colocar consumo e investimento lado a lado. Para isso, os usuários do cartão terão uma espécie de cashback, ou melhor, um ‘investback’, ao invés do tradicional programa de milhas comum dos cartões de crédito. Com ele, o cliente da XP que usar o cartão terá parte do gasto do cartão de volta (1%), mas depositado em um fundo de investimento exclusivo da XP, com liquidez diária (para isso grande parte dos ativos deve ser aplicado em títulos do tesouro) e sem taxa de administração.
Fora isso, a XP já lançou seu marketplace, hoje com 25 lojistas, número que passará a 50 em breve. O objetivo é dar um impulso ao uso do cartão da plataforma. Nesses parceiros, o cashback poderá ser maior do que em compras realizadas fora do aplicativo.
Em seu primeiro ano de companhia de capital aberto, o crescimento da XP foi superlativo, na esteira de taxas de juros muito baixas no Brasil que empurraram um número maior de brasileiros para a Bolsa, por exemplo. A XP fechou o ano com R$ 660 bilhões em ativos sob custódia e 2,8 milhões de clientes ativos, além de lucro líquido ajustado de R$ 2,27 bilhões, aumento de 111% em relação a 2019. Para o professor e coordenador do curso de Economia da FGV, Joelson Sampaio, o lançamento do cartão de crédito pela XP reflete uma tendência que deve ser repetida por outras instituições financeiras.
“Temos poucos bancos comerciais no Brasil e você acaba tendo concentração bancária. Então ter em alguns produtos mais concorrência, e o cartão de crédito é um deles, é muito bom para o consumidor, para o usuário final”, comenta Sampaio.