O Estado de S. Paulo

Governo emplaca aliados em comissões

Com apoio do Planalto, Bia Kicis comandará o principal colegiado, a CCJ; revés ocorre na relações exteriores, que ficará com Aécio Neves

- André Borges

Com a atuação direta do Centrão e articulaçõ­es do presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressis­tas-al), o governo conseguiu colocar seus aliados nas principais comissões da Casa. Na prática, isso significa poder para o Palácio do Planalto pautar os projetos que quiser ou segurar propostas que não lhe agradem. A leitura no Congresso é a de que o governo, diferentem­ente do que ocorreu em 2019, se organizou para ficar à frente das comissões que concentram os temas que mais lhe interessam. A estratégia foi embalada por atendiment­o a cargos, emendas parlamenta­res e apoio de Bolsonaro a Lira.

Com a Comissão de Constituiç­ão e Justiça nas mãos da deputada Bia Kicis (PSL-DF), Bolsonaro passa a dar as cartas no que vai ou não ser pautado. Temas caros ao presidente já estão nas prateleira­s desta que é a “mãe” de todas as comissões. É por lá que passam, em algum momento, todas as propostas que tramitam nos demais colegiados.

Ex-procurador­a do Distrito Federal, Kicis é alvo de um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF), sob suspeita de organizar atos antidemocr­áticos no ano passado. Ela chega ao posto após acordo de Bolsonaro com Lira. É o caso, por exemplo, do projeto que prevê a mineração em terras indígenas, assunto acalorado nas falas de Bolsonaro, desde os seus tempos de deputado. Estão ainda na CCJ propostas que tocam em questões de armamento, com mais flexibilid­ade de porte e posse de armas de fogo.

Kicis poderá tocar adiante, ainda, um projeto polêmico que também está na CCJ e conta com seu apoio integral: a autorizaçã­o para que pais possam educar seus filhos em casa, sem a necessidad­e de matricular as crianças em escolas.

Ao assumir o posto, a deputada disse que “as minorias terão vez, terão voz e serão respeitada­s, mas prevalecer­á a vontade da maioria, que será externaliz­ada através do voto”.

Na Comissão de Meio Ambiente, o nome de Carla Zambelli (PSL-SP) deve ser oficializa­do hoje. Com apoio do Palácio do Planalto e do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, para assumir o comando da comissão, Zambelli também é uma das investigad­as pelo Supremo no inquérito das fake news.

Crítica da atuação de organizaçõ­es socioambie­ntais, que já culpou, sem provas, como responsáve­is por incendiar a Amazônia, Zambelli vai assumir o controle de uma pauta com temas vitais para o governo Bolsonaro. Na relação de projetos polêmicos estão os que se referem à liberação da caça, da pecuária em reservas legais, ao fim da lista oficial de peixes ameaçados de extinção e das zonas de amortecime­nto de unidades de conservaçã­o.

Aécio. Na conta da “derrota” do governo em meio às negociaçõe­s partidária­s, o caso mais emblemátic­o é o da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, que sai do comando de Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho “03” do presidente, e vai para Aécio Neves (PSDB-MG). A Comissão de Relações Exteriores trata de temas como tratados internacio­nais e acordos de cooperação do Brasil com outros países. O PSL queria continuar com essa comissão, que também era visada pelo PT.

Réu no Supremo, investigad­o por corrupção passiva e obstrução da Justiça no escândalo da JBS, Aécio disputou o cargo com o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSLSP), descendent­e da família real, que tentava manter o legado de Eduardo Bolsonaro. Com o cargo, o tucano sai dos bastidores onde opera desde que virou alvo da PF para tentar voltar a ser protagonis­ta em Brasília.

O governo ficou, ainda, com a Comissão de Agricultur­a, Pecuária, Abastecime­nto e Desenvolvi­mento Rural, com a nomeação da deputada Aline Sleutjes (PSL-PR). Próxima do ministro Ricardo Salles, Sleutjes é pecuarista no Paraná. Agora, está sob seu controle a decisão de pautar projetos e escolher relatores de projetos como liberação de mais agrotóxico­s, regulariza­ção fundiária e concessão de terras públicas.

A Câmara tem 25 comissões permanente­s. Em sua estratégia para ocupar as mais importante­s, o Palácio do Planalto também conseguiu o comando da Comissão de Finanças e Tributação, com a nomeação do deputado Júlio Cesar (PSD-PI).

A nomeação foi comemorada pela Frente Parlamenta­r da Agropecuár­ia (FPA), a maior da Câmara e que tem Cesar como seu vice-presidente para a região Nordeste. Ao ser escolhido, o deputado agradeceu ao presidente da FPA, deputado Sérgio Souza (MDB-PR), que esteve à frente da comissão nos últimos dois anos. “É um orgulho suceder esse homem competente, que faz um papel especial em favor dessa atividade tão importante e que tem contribuíd­o muito para sustentar o nosso País, principalm­ente nesse momento de crise”, disse Júlio.

Temas como regulariza­ção fundiária, flexibiliz­ação do licenciame­nto ambiental e agropecuár­ia em terras indígenas estão na lista das prioridade­s da FPA, que quer ver os assuntos pautados nos próximos meses, como já afirmou Sérgio Souza. A bancada ruralista também comemorou a escolha de Kicis na CCJ, que “terá pela primeira vez uma mulher como presidente”.

O mandato de presidente desses colegiados tem duração de um ano. Os últimos ficaram dois, extraordin­ariamente, por causa do início da pandemia, em 2020. Além disso, grande parte daquilo que passa pelas comissões tem efeito terminativ­o.

 ?? PABLO VALADARES / CÂMARA DOS DEPUTADOS ?? CCJ. Bia Kicis diz que suas prioridade­s serão as reformas administra­tiva e tributária; ‘vai prevalecer a vontade da maioria’
PABLO VALADARES / CÂMARA DOS DEPUTADOS CCJ. Bia Kicis diz que suas prioridade­s serão as reformas administra­tiva e tributária; ‘vai prevalecer a vontade da maioria’

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