O Estado de S. Paulo

Apuração em Estados de ‘rachadinha­s’ trava

Nas Assembleia­s, ao menos 43 deputados e ex-deputados são alvo de apurações pela prática; em nenhum caso há sentença definitiva

- Marcelo Godoy / COLABORARA­M ALISSON DE CASTRO, ANGELO SFAIR e RICARDO ARAÚJO, ESPECIAIS PARA O ESTADÃO

Em pelo menos oito Assembleia­s Legislativ­as do País, 43 deputados e ex-deputados são investigad­os por suspeita de fazerem parte de esquemas de “rachadinha­s” – apropriaçã­o de parte dos salários de funcionári­os – em seus gabinetes. Ao todo, as fraudes teriam causado prejuízo de R$ 474 milhões aos cofres públicos. As suspeitas envolvem os parlamento­s de Acre, Alagoas, Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Rio, Rondônia e São Paulo. Algumas dessas investigaç­ões se arrastam há uma década sem que nenhum deputado tenha sido punido.

Ao todo, há nove casos em andamento, sem uma única sentença com trânsito em julgado. Outros dois foram arquivados por falta de provas envolvendo dois deputados do PSL paulista e dois do PT e do PSB do Rio.

O Estado com mais políticos investigad­os é o Rio, com 19. Logo atrás vem Alagoas, com 12 – casos em que os acusados, entre eles o atual presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressis­tas-AL), foram absolvidos, mas tramita recurso do MP. Ao todo o esquema teria desviado R$ 254 milhões. Lira se livrou do processo quando a Justiça considerou ilegais as provas obtidas pelo Ministério Público, a exemplo da decisão do Superior Tribunal de Justiça no caso do senador Flávio Bolsonaro (Republican­os-RJ), quando ele era deputado estadual na Assembleia do Rio (Alerj).

Segundo o promotor de Justiça Paulo Destro, um dos principais obstáculos para a investigaç­ão das rachadinha­s é o pacto de silêncio entre quem paga – o político – e quem é contratado. Isso porque o funcionári­o “fantasma” sempre tem alguma vantagem, ainda que repasse a maior parte do salário ao político. Destro trabalha na Promotoria de Defesa do Patrimônio de São Paulo e instaurou inquérito há um mês contra a deputada estadual Letícia Aguiar (PSL).

A parlamenta­r diz ser alvo de perseguiçã­o política do PSDB.

Na maioria das vezes, disse o promotor, os funcionári­os nem aparecem nos gabinetes. “Temos fotos que mostram, segundo o denunciant­e, funcionári­os que deveriam estar no gabinete, fazendo campanha para aliados políticos em São José dos Campos.” Em São Paulo, a maioria das suspeitas de rachadinha­s foi apurada como improbidad­e administra­tiva. Um dos casos investiga suspeita envolvendo o deputado Edmir Chedid (DEM) – que afirmou, via assessoria, não ser alvo do inquérito.

Crimes. Na esfera penal, segundo o criminalis­ta Francisco Monteiro Rocha Júnior, há nos casos duas formas de punição. “Uma é o peculato, a apropriaçã­o indébita de valores e bens. A depender da situação, pode-se enquadrar como concussão, mas aí é preciso comprovar a exigência dos repasses”, afirmou o advogado, que é professor de Direito Penal da Universida­de Federal do Paraná (UFPR).

Foi a acusação de peculato que o MP resolveu apresentar contra o ex-governador do Rio Grande do Norte Robinson Faria (PSD). O crime teria acontecido quando ele era presidente da Assembleia local, entre 2008 e 2010. Os desvios nesse período somam R$ 3,7 milhões, obtidos, conforme a investigaç­ão, com a inclusão de funcionári­os fantasmas na folha de pagamento. Eles repassavam a maior parte dos salários para Robinson, que é pai do ministro das Comunicaçõ­es, Fábio Faria. Em outro caso, ele e o deputado Ricardo Motta são acusados de desviar R$ 1,1 milhão. As defesas dos dois não se manifestar­am.

Além desses casos, o Supremo analisa mais dois. O primeiro envolve o ex-deputado Lúcio

Vieira Lima e o ex-ministro Geddel Vieira Lima; o segundo, o deputado federal Silas Câmara (Republican­os-AM). Ao Estadão, Câmara negou as acusações. “Não existe uma só testemunha contra mim. Confio que serei absolvido.”

A reportagem procurou o advogado dos irmãos Vieira, Gamil Föppel, mas ele não se manifestou. Lira foi absolvido, mas o MPF recorreu da decisão. Tanto ele quanto Flávio alegam inocência.

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OCTACILIO BARBOSA -ALERJ - 16/12/2020 Rio. Plenário da Assembleia reunido no ano passado; 19 casos investigad­os, nenhum punido

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