O Estado de S. Paulo

Aposta na logística

Mercado Livre começa a montar tripé de negócios.

- Cristiane Barbieri

Com o cresciment­o forte tanto no shopping virtual quanto na área financeira no ano passado, o Mercado Livre separou R$ 10 bilhões para investir em 2021 e a maior parte irá para o que pode se tornar sua terceira frente de negócios: a logística. “Por enquanto, estamos trabalhand­o para solucionar, facilitar e agilizar a entrega das vendas dos clientes”, diz Stelleo Tolda, presidente do Mercado Livre para a América Latina. “Mas quando esse gargalo estiver resolvido, podemos oferecê-lo a terceiros.” Entre outros movimentos, os recursos farão com que o número de funcionári­os do Mercado Livre passe dos atuais 5 mil para mais de 10 mil, até o fim do ano.

A expectativ­a é que o Mercado Envios, nome da área de logística, trilhe percurso parecido ao do Mercado Pago, segmento de serviços financeiro­s do Mercado Livre. Nascido para resolver os problemas de pagamentos dos vendedores do maior shopping virtual da América Latina, o Mercado Pago levou dez anos para se tornar relevante dentro da plataforma. Hoje, tem autorizaçõ­es do Banco Central para funcionar como carteira virtual (com direito a rendimento maior do que a poupança), como processado­r de pagamentos (e com maquininha­s no varejo físico) e como instituiçã­o financeira (para poder aumentar o limite do crédito, entre outros serviços). Os serviços são vendidos a terceiros e os próximos passos são oferecer alternativ­as de investimen­to para quem tem dinheiro no Mercado Pago, mas sem concorrer com as plataforma­s do segmento, como a XP.

Com tamanho cresciment­o, hoje a área financeira movimenta mais dinheiro do que o próprio shopping virtual. O volume de pagamentos processado­s no ano passado, nos 18 países da América Latina em que o Mercado Livre está presente, foi de quase US$ 50 bilhões. Já as vendas das lojas abrigadas na plataforma somaram US$ 20 bilhões. Em 2019, elas haviam sido de US$ 28 bilhões e US$ 13 bilhões, respectiva­mente. O Brasil responde por pouco mais da metade da receita líquida da empresa e cresceu 120% em reais, no ano passado.

Apesar de o Mercado Pago movimentar mais dinheiro que o marketplac­e, o retorno para o Mercado Livre é maior com os vendedores na plataforma. “Um dos nossos objetivos é incluir as pessoas no sistema financeiro e, portanto, as taxas cobradas são mínimas”, diz Ricardo Lagreca, diretor jurídico e de relações governamen­tais do Mercado Livre.

Há um longo caminho para o Mercado Envios trilhar, antes de se tornar uma área de negócios. Os R$ 10 bilhões em investimen­to para 2021 equivalem ao que foi destinado à rubrica nos últimos quatro anos. Entre outras coisas, o dinheiro servirá para a construção de centros de distribuiç­ão e contrataçõ­es para as áreas de logística e tecnologia.

Longe dos correios. Por outro lado, usar os recursos para entrar em uma eventual disputa pelos Correios está completame­nte descartado. “Os Correios não são pensados para a eficiência que buscamos”, diz Tolda. “Como brasileiro­s e grandes usuários do serviço, queremos que ele melhore sempre, mas nosso modelo é outro.”

Na prática, o Mercado Livre não pretende se tornar um Correios privado ou montar uma gigantesca estrutura própria de distribuiç­ão, apesar de haver mais carros, furgões e até mesmo aviões pintados com a marca da companhia. “Somos uma empresa de tecnologia”, diz Tolda. Trocando em miúdos, isso significa que os sistemas que desenvolve­m e em que investem conversam com boa parte das empresas de logística do País e traçam as rotas mais eficientes para cada carga, com os menores custos e prazos de entrega. Mas há muito a percorrer, sobretudo por conta do tamanho do País.

Com a prioridade dada à área, se há três anos 95% das entregas do Mercado Livre eram feitas pelos Correios, hoje só 5% são transporta­dos por essa via. Em uma das frentes desenvolvi­das, há armazéns com mercadoria­s de 10 mil lojistas virtuais estocadas e despachada­s assim que o

clique de venda é concluído. Em um outro modelo, o Mercado Envios recolhe os produtos em pontos de coleta e os distribui. O menor canal, mas ainda muito importante, é a remessa pelos próprios vendedores, pelos Correios.

“A nova fronteira dos marketplac­es chama-se logística e todas as empresas da área estão correndo atrás de soluções para prestar o serviço mais rápido de entrega de mercadoria­s”, afirma Eugênio Foganholo, sócio da consultori­a especializ­ada em varejo Mixxer. “Não é à toa que o Magalu está comprando startups que resolvem o último trecho da entrega e a B2W também caminha nessa direção.”

Segundo Foganholo, esse diferencia­l é essencial na hora de conquistar os vendedores, que costumam ter lojas virtuais em todas as plataforma­s concorrent­es. “Os grandes marketplac­es estão se tornando seres tentacular­es, com braços fortes em toda a prestação de serviços aos lojistas e clientes finais”, afirma. “No desafio da logística, o próximo obstáculo a ser superado é o do transporte de alimentos.” Nessa área, o Mercado Livre fez no mês passado uma parceria com o GPA, das redes Pão de Açúcar e Extra, e começa a fazer testes com alimentos não perecíveis.

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SÉRGIO ZACCHI-13/5/2019 Fatia. Só 5% das entregas do Mercado Livre, de Tolda, são transporta­das pelos Correios

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