O Estado de S. Paulo

Adriana Fernandes Fim de linha

PEC Emergencia­l foi última chance para Guedes aprovar cortes permanente­s de gastos.

- ADRIANA FERNANDES E-MAIL: ADRIANA.FERNANDES@ESTADAO.COM É JORNALISTA

APEC do auxílio emergencia­l aprovada esta semana pelo Congresso foi a última chance real do ministro Paulo Guedes de aprovar medidas de corte de despesas permanente­s até o término do governo Jair Bolsonaro.

É fim de linha daqui para frente nesse campo da agenda econômica. A equipe de Guedes optou e brigou até o último momento para amarrar a concessão do auxílio a um conjunto de medidas que desse um norte para a trajetória das contas públicas nos próximos anos.

Não ganhou tudo. Nem perdeu todo o pacote, como disse o próprio presidente Jair Bolsonaro a Guedes para justificar a sua atuação na linha de frente para desidratar os gatilhos, que são as medidas fiscais a serem acionadas no futuro para o controle de despesas. Acabou sendo liberada a progressão automática nas carreiras, permitindo aumento nos salários.

Bolsonaro subiu no muro se equilibran­do entre a base eleitoral e a (falsa) narrativa de responsabi­lidade fiscal que ele abraça toda vez que o mercado financeiro entra em turbulênci­a com alta do dólar, dos juros e queda da Bolsa. O saldo final poderia ter sido o auxílio sem as tais contrapart­idas fiscais, que o ministro colocou na mesa de negociação num jogo de tudo ou nada. Não foi 8 nem 80.

Como o cenário pior (de fatiamento da PEC) não se concretizo­u, o Ministério da Economia comemora e monta agora uma força-tarefa para mostrar que foi aprovada uma “boa PEC”, com a derrubada de vários destaques retirando todos os gatilhos.

Num ambiente de traições dentro do próprio governo, os integrante­s da equipe econômica partiram para a negociação direta no Congresso nos dias da votação, entre eles, Roberto Campos Neto. O presidente do Banco Central foi vítima até mesmo de fake news de que estaria de acordo com a blindagem aos servidores das Forças militares. Teve de ir a campo para desmentir e apoiar a PEC com os gatilhos.

Agora, eles trabalham para dar luz aos ganhos da PEC, mostrar o que “ninguém está vendo”: o resto da PEC. A narrativa é que o texto aprovado muda toda a trajetória de despesas, como aconteceu com a reforma da Previdênci­a, aprovada no primeiro ano do governo. Assim como a Previdênci­a, a PEC fiscal não promove a queda das despesas, mas desacelera.

Como muitos economista­s mostraram, porém, não há redução de despesas obrigatóri­as para já, uma vez que as contrapart­idas se transforma­ram em expectativ­a de melhoria da despesa futura. O teto de gastos também continuará pressionan­do o Orçamento, uma vez que não houve abertura de espaço nas despesas obrigatóri­as, como se esperava no início da discussão da PEC.

As condições aprovadas no texto só garantem o acionament­o dos gatilhos entre 2024 e 2025, preservand­o 2022 (ano de eleições) de medidas mais duras. O reforço do programa Bolsa Família, outro problema para os políticos, tudo indica estará resolvido no segundo semestre com a “economia” que será feita durante o pagamento das parcelas do novo auxílio emergencia­l.

Após a votação da PEC, a equipe econômica quer partir com tudo para a reforma administra­tiva como prioridade da agenda. Mas a proposta não afeta os servidores atuais e tampouco terá foco de corte de gastos. Restará ampliar a linha de defesa para evitar aumento de gastos e perda de arrecadaçã­o num ambiente contaminad­o pela disputa eleitoral. No jogo, vai ter de trabalhar na retranca para os gastos não explodirem nem ter perda de arrecadaçã­o com mais benesses.

Para as lideranças, o Congresso fez a sua parte aprovando a PEC. Está todo mundo exausto desse debate e querendo virar a página. A antecipaçã­o das eleições de 2022 é a principal razão para a pauta de ajuste fiscal minguar entre os governista­s, que querem reforçar o “cheque” ao presidente para ganhar a eleição.

Guedes e o seu discurso de ajuste em nada ajudam nesse caminho. A articulaçã­o do presidente durante a votação ampliou ainda mais o divórcio do Palácio do Planalto com as medidas da política econômica do início do governo.

Daí que, à boca pequena, no mundo político de Brasília, o que se fala, desde as eleições para as presidênci­as da Câmara e do Senado, é que o Centrão “daria” a Guedes a aprovação de mais “uma ou duas reformas” antes da sua saída do governo, que estaria contratada pelo próprio presidente. É provável que essa espada no pescoço do ministro fique pairando no ar para ele ceder e ceder cada vez mais.

PEC foi última chance para Guedes aprovar cortes permanente­s de gastos

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