O Estado de S. Paulo

Campanha a todo vapor

Ideia de que é cedo para iniciar uma campanha presidenci­al é politicame­nte ingênua.

- JOÃO GABRIEL DE LIMA E-MAIL: JOAOGABRIE­LSANTANADE­LIMA@GMAIL.COM TWITTER: @JOAOGABRIE­LDELI

Aideia de que é cedo para iniciar uma campanha presidenci­al, dado que temos uma pandemia para combater, é politicame­nte ingênua. Em democracia­s, os eleitores estão sempre julgando potenciais candidatos. Para os governante­s, fazer a coisa certa em situações de crise é parte da campanha. Se os resultados aparecem, aumentam as chances de reeleição.

O raciocínio vale para os opositores. Nas situações de crise, eles têm a oportunida­de – e a obrigação – de fiscalizar e criticar. Devem também apresentar alternativ­as, para que o eleitor acredite que farão melhor caso conquistem o poder.

Tal regra básica das democracia­s merece ser lembrada nesta semana, em que o ex-presidente Lula, para usar uma expressão dele próprio, colocou seu bloco na rua. Fez um discurso clássico de candidato dois dias depois da decisão do juiz Edson Fachin – tão clássico que não assumiu ser candidato. Em sua fala, colocou-se na posição de antagonist­a preferenci­al do atual presidente, Jair Bolsonaro – que está em campanha desde o primeiro dia de governo.

O editor Daniel Bramatti, da área de jornalismo de dados do Estadão, analisou no domingo, dia 7, uma pesquisa em que Lula lidera o potencial de voto para 2022. Em segundo lugar aparece Bolsonaro. No levantamen­to feito pelo instituto Ipec, os dois têm uma certa folga sobre o segundo pelotão – composto por Sérgio Moro, Luciano Huck, Fernando Haddad e Ciro Gomes. Teríamos um segundo turno já desenhado para 2022?

A resposta é não se considerar­mos outra pesquisa – esta qualitativ­a, realizada nas classes A e B e patrocinad­a pela fundação alemã Friedrich Ebert. Ela mostra falta de convicção entre os potenciais eleitores de Lula e Bolsonaro. No levantamen­to, feito no fim do ano passado, o eleitor à direita já criticava Bolsonaro pelo desastre no combate à pandemia.

Do outro lado, segundo a pesquisa, há desconfort­o com o projeto hegemônico do PT e a falta de renovação nas esquerdas. “Políticos jovens como Guilherme Boulos aparecem como opções até entre eleitores de centro”, diz a cientista política Camila Rocha, coordenado­ra do levantamen­to ao lado da socióloga Esther Solano. Ela é a personagem do minipodcas­t da semana.

Camila Rocha transita por várias correntes ideológica­s, com interlocut­ores à esquerda e à direita. Ela é autora de “Menos Marx, Mais Mises”, uma tese de doutorado sobre os liberais brasileiro­s da nova geração (um livro baseado na tese sairá no segundo semestre pela Editora Todavia). O sentimento que captou entre integrante­s dos dois campos foi de “orfandade”. “Há ainda muitos eleitores em busca de candidatos que os represente­m”, diz Camila Rocha.

O cruzamento das duas pesquisas, a quantitati­va e a qualitativ­a, sugere que o presidente e o ex-presidente lideram porque foram os primeiros a “colocar o bloco na rua”. Os levantamen­tos mostram que muitos brasileiro­s votarão em Lula ou Bolsonaro. Há, no entanto, um enorme contingent­e em busca de alternativ­as. Cabe aos demais partidos suprir a demanda dos “órfãos”. No Brasil os pleitos são livres e quem não se apresenta ao escrutínio do eleitor não tem o direito de reclamar. Assumir a candidatur­a é o primeiro passo, mas não basta. É preciso apresentar ideias.

Em plena pandemia, a campanha está a todo vapor. Se os postulante­s não colocarem logo seus blocos na rua – e se não perceberem a urgência dessa tarefa –, Lula e Bolsonaro brincarão sozinhos o carnaval das eleições.

Se postulante­s não colocarem logo os blocos na rua, Lula e Bolsonaro brincarão sozinhos o carnaval das eleições

✽ ESCRITOR, PROFESSOR DA FAAP E DOUTORANDO EM CIÊNCIA POLÍTICA NA UNIVERSIDA­DE DE LISBOA

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