O Estado de S. Paulo

EUA rejeitam enviar doses a qualquer país, mas financiam vacinação na Ásia

- Beatriz Bulla

Governo nega intenção de exportar imunizante­s e garante que prioridade é vacinar população americana; no entanto, sob pressão para conter avanço de chineses e russos em regiões estratégic­as, Biden fecha acordo com Japão, Austrália e Índia para ajudar países asiáticos

Os EUA descartara­m ontem a possibilid­ade de compartilh­ar com outros países doses excedentes da vacina da Astrazenec­a. No entanto, sob pressão para conter o avanço de chineses e russos, que usam os imunizante­s para conquistar aliados, a Casa Branca, em parceria com o Japão, anunciou o financiame­nto de vacinas que serão fabricadas na Índia e distribuíd­as pela Austrália para governos do Sudeste da Ásia.

Ontem, duas autoridade­s do governo americano indicaram que o presidente Joe Biden pretende resolver primeiro a situação doméstica, para só depois dividir doses com outros países. Na Casa Branca, a portavoz da presidênci­a, Jen Psaki, disse que a avaliação é a de que a primeira obrigação dos americanos é responder à crise interna, apesar de desejar colaborar com outras nações.

“É um equilíbrio complicado”, disse Psaki. “Queremos ter certeza de que temos a flexibilid­ade máxima, de que estamos preparados e temos a capacidade de fornecer vacinas para o público americano. Ainda há 1.400 pessoas morrendo em nosso país a cada dia e precisamos nos concentrar em resolver isso.”

Os EUA ainda não deram autorizaçã­o para uso emergencia­l da vacina da Astrazenec­a, apesar de já terem garantido a compra de milhões de doses da farmacêuti­ca. O jornal New York Times revelou que há pedidos de países, apoiados pela própria empresa, para que os EUA enviem as doses a locais que já possuem a autorizaçã­o, como o Brasil.

Também ontem, o responsáve­l pela força-tarefa da Casa Branca para resposta à pandemia, Jeff Zients, afirmou que os EUA possuem apenas um “pequeno estoque” de imunizante­s da Astrazenec­a. A ideia, segundo ele, é manter o armazename­nto para que, se aprovada para uso, a vacina possa ser destinada aos americanos “o mais rápido possível”.

Mas, se o envio de vacinas para outros países está descartado, pelo menos momentanea­mente, o governo americano demonstrou que está atento ao avanço de países rivais que vêm usando a distribuiç­ão de imunizante­s para avançar sobre a esfera de influência geopolític­a dos EUA. Ontem, o jornal Financial Times informou que a Casa Branca costurou uma aliança para conter as investidas da China no Sudeste da Ásia.

O consórcio formado por EUA, Japão, Índia e Austrália pretende fornecer 1 bilhão de doses da vacina da Johnson & Johnson para países da região. O objetivo do bloco informal, criado em 2007, chamado de Diálogo Quadrilate­ral de Segurança (Quad), é conter a influência da China no Sudeste da Ásia. O financiame­nto ficará por conta de americanos e japoneses, enquanto os indianos farão a produção e os australian­os, a distribuiç­ão.

A iniciativa foi anunciada durante uma cúpula do Qaud, realizada ontem. Biden já deixou claro que a China é o maior desafio de sua política externa e pretende trabalhar com aliados para conter o avanço de Pequim no tabuleiro global.

“Estamos renovando nosso compromiss­o de garantir que a região seja regida pelo direito internacio­nal, comprometi­da com a defesa dos valores universais e livre de coerção”, afirmou Biden, que não fez nenhuma menção explícita – mas muitas implícitas – à China.

Reação. Os primeiros-ministros de Austrália, Scott Morrison, Índia, Narendra Modi, e Japão, Yoshihide Suga, elogiaram o engajament­o de Biden no Quad – um fórum diplomátic­o que recebeu bastante atenção do ex-presidente Donald Trump. Em Pequim, porém, a cúpula recebeu críticas. O jornal estatal Global Times chamou a reunião de “conspiraçã­o dos EUA contra a China”.

“O Quad não é uma aliança de países com ideias comuns como os EUA afirmam”, escreveu o jornal, acrescenta­ndo que os outros três países enfrentam “a vergonha de estarem entre a pressão americana e seus próprios interesses com os chineses”.

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ALEX WONG/GETTY IMAGES/AFP–10/3/2021 Precaução. Biden durante anúncio da parceria com a Johnson & Johnson: prioridade é acelerar vacinação nos EUA

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