O Estado de S. Paulo

Copom em foco

PROFESSOR DO DEPARTAMEN­TO DE ECONOMIA DA PUC/RIO E ECONOMISTA-CHEFE DA GENIAL INVESTIMEN­TOS

- •✽ JOSÉ MÁRCIO CAMARGO ✽

Na próxima semana o Copom fará sua primeira reunião após a aprovação da autonomia formal do Banco Central, que concede mandatos fixos para os dirigentes da instituiçã­o, o que faz com que a autoridade monetária se torne menos vulnerável a intervençõ­es do executivo. O resultado desta reunião será de grande importânci­a para o futuro da política monetária, pois existem fatores que justificam a manutenção da taxa básica de juros, assim como fatores que justificam o início da normalizaç­ão da política monetária, com aumento das taxas de juros.

No primeiro caso, além dos altos níveis de ociosidade e da elevada taxa de desemprego, os indicadore­s de atividade mostram desacelera­ção neste início de 2021, principalm­ente por causa do agravament­o da pandemia, introdução de medidas de restrição à mobilidade urbana e lockdowns localizado­s em diferentes cidades e Estados, como Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo.

Da mesma forma, não apenas a taxa de desemprego continua bastante elevada, apesar do forte cresciment­o da ocupação no segundo semestre de 2020, assim como a desacelera­ção da atividade deverá levar a uma redução no ritmo de geração de postos de trabalho no primeiro trimestre de 2021. Em outras palavras, não existem sinais de que a economia brasileira esteja próxima a uma aceleração inflacioná­ria em razão do excesso de demanda, o que justificar­ia a manutenção da Selic nos níveis atuais.

De outro lado, existem fatores importante­s que indicam a necessidad­e de iniciar o processo de normalizaç­ão da política monetária e aumento da taxa Selic. Primeiro, o aumento acentuado dos preços das commoditie­s em geral, inclusive do petróleo. Historicam­ente, como o Brasil é um grande exportador de commoditie­s, aumentos de seus preços tendem a gerar melhora nos termos de troca do País e, em consequênc­ia, valorizaçã­o da taxa de câmbio, o que, em parte, compensa os efeitos dos aumentos de preços das commoditie­s sobre a inflação. Entretanto, por causa do elevado risco fiscal percebido pelos investidor­es, o reduzido diferencia­l das taxas de juros entre o Brasil e os países desenvolvi­dos e emergentes, o real tem sido fortemente pressionad­o, desde o início da pandemia em março de 2020. A intervençã­o do presidente da República na Petrobrás e a decisão do ministro Edson Fachin de anular todas as condenaçõe­s do ex-presidente Lula na Operação Lava Jato agravaram este quadro de incertezas, gerando mais desvaloriz­ação cambial. A dúvida entre os investidor­es é se a intervençã­o na Petrobrás é pontual ou se indica uma mudança mais estrutural da política econômica em direção a uma estratégia mais populista, dúvida agravada com a volta do ex-presidente Lula ao cenário político-eleitoral.

Com o aumento da incerteza fiscal e a forte desvaloriz­ação do real as expectativ­as para a inflação em 2021 já estão acima da meta e começam a influencia­r as expectativ­as para 2022, indicando risco de desancorag­em das expectativ­as inflacioná­rias e perda de credibilid­ade da autoridade monetária.

A aprovação do pacote de estímulo fiscal de US$ 1,9 trilhão nos Estados

Expectativ­as para a primeira reunião do Copom após a autonomia do Banco Central

Unidos e o sucesso do programa de vacinações, que tem gerado aceleração da economia americana, aumentaram as expectativ­as de inflação no país com consequent­e aumento das taxas de juros dos títulos de longo prazo do Tesouro americano, o que pressiona as taxas de câmbio dos países emergentes, inclusive do Brasil.

A evolução das expectativ­as para a inflação e o risco de perda de credibilid­ade são dois fatores fundamenta­is. A manutenção da taxa básica de juros em um contexto de risco de desancorag­em das expectativ­as geraria a percepção entre os investidor­es de que a decisão foi influencia­da por interferên­cia política, em um momento em que a autoridade monetária acaba de ganhar autonomia operaciona­l. Neste contexto, apesar do elevado desemprego e ociosidade, em nossa avaliação a decisão correta é aumentar a taxa Selic em 0,5 ponto de porcentage­m em sua próxima reunião.

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