O Estado de S. Paulo

Seguiu os passos do avô e se despede no auge da carreira

Plano do prefeito era concorrer à Presidênci­a, como o avô Mário Covas, de quem herdou a trajetória de vida e os caminhos na política

- Adriana Ferraz / COLABOROU BRUNO RIBEIRO

A vida pública foi a escolha natural e até mesmo esperada para Bruno Covas Lopes, que, ainda adolescent­e, passou a “beber da fonte” ao decidir morar com o avô em São Paulo. O ex-governador Mário Covas não só ensinou o neto a gostar de política como o colocou numa trajetória eleitoral vitoriosa encerrada de forma precoce na manhã de ontem. Aos 41 anos, o prefeito de São Paulo morreu por complicaçõ­es de um câncer agressivo. O tucano deixa o filho Tomás, de 15 anos.

Fazia um ano e meio que Covas lutava contra a doença que também matou o avô, em março de 2001. Na época, Bruno tinha 20 anos e já se preparava para assumir a herança política da família. Cinco anos antes, havia trocado sua casa em Santos, no litoral paulista, pelo Palácio dos Bandeirant­es para concluir os estudos na capital.

Foi aprovado em duas faculdades ao mesmo tempo: Direito, na USP, e Economia, na PUC. Formou-se nas duas em um período de oito anos, época em que passou a experiment­ar seu potencial político em grêmios estudantis e já dentro de seu único partido.

Bruno se filiou ao PSDB aos 17 anos. Nessa época, era um jovem que já se destacava pela capacidade de mobilizaçã­o. A “turma” que fez na base jovem do partido sempre o acompanhou. Os mais próximos – Fabio Lepique e Alexandre Modonesi – ocupam cargos-chave na administra­ção municipal.

Antes de comandar a maior cidade da América Latina, Bruno foi eleito deputado estadual por duas vezes, deputado federal e vice-prefeito. Assumiu o posto de prefeito com a renúncia de João Doria (PSDB), em 2018, e depois se reelegeu como cabeça de chapa. Nisso, aliás, o neto superou o avô.

Mário Covas não chegou ao cargo por escolha popular. Foi o último prefeito biônico antes da democratiz­ação. Bruno seguia uma história parecida – era o vice na chapa vencedora de 2016 –, até ganhar a eleição em segundo turno, no ano passado, com 3,1 milhões de votos.

Desde criança, quando fez a carteira do Clube dos Tucaninhos, o objetivo de Covas sempre foi entrar na política, seguir os passos do avô e chegar ao Palácio do Planalto. “Quem começa como estagiário quer chegar a CEO. É o natural de qualquer carreira”, disse ao Estadão, durante a eleição de 2020.

Sua primeira atuação política mais direta se deu em junho de 2002, um ano após a morte do avô, quando agiu para barrar uma aliança tucana com Orestes Quércia, do então PMDB, que também buscava se aproximar do PT nas eleições estaduais. Quércia teve de conversar com o jovem político.

Se os ensinament­os do avô o seguiram por toda a vida, o mesmo não se pode dizer do temperamen­to. Contido, Bruno nunca foi um orador explosivo ou um político midiático. Pelo contrário. Tímido e disciplina­do, o prefeito sempre calculou as palavras. Sem colecionar inimigos e com o respaldo popular assegurado pelas urnas, Bruno estava no auge de sua carreira política. A eleição havia lhe dado confiança para começar a impor seu modo de governar e traçar o futuro. Diferentem­ente de Doria, considerav­a-se “PSDB raiz”. Até 2024 havia projetado cumprir 75 metas de governo, como 12 novos CEUS.

Mas os planos como prefeito eleito só duraram dois meses. Em fevereiro, os médicos de Covas descobrira­m novos tumores, e a quimiotera­pia, que havia sido trocada por imunoterap­ia (menos agressiva) ao longo de 2020, recomeçou. Dois meses depois, outros exames indicaram metástase nos ossos. Debilitado, precisou tratar complicaçõ­es como água no pulmão e sangrament­o na cárdia.

Transparên­cia. A evolução da doença foi exposta aos eleitores. Covas liberou sua equipe a informar diariament­e a imprensa de sua situação clínica e pediu aos médicos que atendessem jornalista­s. A prática se tornou mais comum a partir de abril, quando cinco tumores foram identifica­dos no fígado, um nos ossos da coluna e outro nos ossos da bacia.

Até esse momento, aliados mantinham-se esperanços­os com a possibilid­ade de cura. As metástases e o sangrament­o na cárdia, no entanto, abalaram a confiança até mesmo dos médicos, e a palavra sobrevida passou a compor o repertório de quem acompanhav­a o prefeito mais de perto.

Já com dores e cada vez mais debilitado, o tucano pediu licença do cargo num domingo, 2 de maio, e foi internado no Hospital Sírio-libanês. Na ocasião, disse pelas redes sociais que a “vida havia lhe apresentad­o enormes desafios” e que, diante dos novos focos da doença, “seu corpo estava exigindo mais dedicação ao tratamento, que entrava numa fase muito rigorosa”. Não saiu mais do hospital.

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TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO - 20/3/2020 Eleição. Alçado a prefeito em 2018, Covas foi reeleito em 2020 com 3,1 milhões de votos

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