O Estado de S. Paulo

‘Juro real baixo estimula a ida para investimen­tos alternativ­os’

Mesmo com as altas recentes da taxa Selic, especialis­ta vê momento como ideal para os fundos de investimen­to

- Marcio Fontes, Luiz Felipe Simões

O ano era 2019 quando Márcio Fontes resolveu vender a Itaim Asset para a ASA Investment­s. A empresa é um braço de gestão de recursos do grupo fundado por Alberto Joseph Safra, com a ideia de transforma­r a gestora de recursos em uma espécie de Black Rock do Brasil. Na época, Fontes não sabia que, pela frente, teria de enfrentar um dos seus maiores desafios: a pandemia da covid-19.

A gestora abriu seu primeiro produto para captação, o ASA Hedge Multimerca­do, neste ano. E o fundo já nasceu com um patrimônio de cerca de R$ 100 milhões, provenient­e dos sócios e dos gestores. Até o final de abril, registrava uma rentabilid­ade de 11,13% no acumulado de 12 meses.

“Nosso projeto é, de fato, ambicioso”, diz o estrategis­tachefe de investimen­tos da gestora. “Uma das coisas que estamos investindo bastante é em trazer excelentes gestores para dentro do grupo.” A seguir, trechos da entrevista.

Com o cenário da pandemia, quais foram os maiores desafios para a captação do fundo?

A dificuldad­e de não ter o contato direto com as pessoas. Mas estamos entregando um bom retorno por meio dos novos recursos tecnológic­os, que permitem conversar com a equipe e expor nosso trabalho. O fundo está aí com cinco anos e uma rentabilid­ade extraordin­ária, com certeza uma das melhores da indústria.

E quais as tendências da indústria de fundos para este ano?

De maneira geral, materiais e commoditie­s agrícolas são temas interessan­tes para os próximos anos e que serão bem suportados. Na minha visão, fundos que têm esse foco são interessan­tes. Entretanto, há uma agenda macroeconô­mica muito bacana no mundo para os próximos 10 anos. Estamos nos tornando um mundo com estímulos fiscais. No passado, tínhamos basicament­e os incentivos vindos de estímulos monetários. Os multimerca­dos macro têm bastante a explorar dentro dessa nova realidade.

Ainda há dificuldad­e de atrair investimen­to estrangeir­o. O risco fiscal é uma questão que tem afastado a entrada de novos recursos?

Essa é uma matéria sensível. Achamos que, de certa maneira, o Brasil já foi prejudicad­o por não fazer uma sinalizaçã­o absolutame­nte clara em relação à sua intenção nesse plano. Apesar de estarmos vivendo um momento de baixo investimen­to estrangeir­o na nossa dívida pública, talvez o menor em muitos anos, tivemos, recentemen­te, um aumento no mercado de ações. Há muito espaço para aumentar caso melhoremos a nossa questão fiscal. Isso, de fato, vem afetando a performanc­e dos nossos ativos. Se não fizermos uma sinalizaçã­o clara no sentido de mostrar à comunidade internacio­nal que nós temos um plano para estabiliza­r a nossa relação de dívida bruta contra o PIB, acho que continuare­mos sofrendo com essa questão.

Quais setores podem despertar interesse nos investidor­es estrangeir­os?

Temos um pipeline muito interessan­te de investimen­tos em licitações nos setores de infraestru­tura no Brasil, como o segmento de gás, água e esgoto. Na infraestru­tura, o governo tem trabalhado bem e temos uma esteira de muita coisa que vai ser oferecida em termos de licitação nos próximos meses.

No ano passado, a taxa Selic atingiu o seu menor nível da história. Este ano, o Copom já elevou o juro básico da economia para 3,5% ao ano. Como isso afeta a estratégia dos fundos?

A reforma da previdênci­a, a reforma trabalhist­a e a de teto de gastos compõem um arcabouço institucio­nal e fiscal que o Brasil conquistou. Isso faz com os juros fiquem em patamares mais baixos. Recentemen­te, conseguimo­s a independên­cia do nosso Banco Central, o que também é crítico nesse sentido. Estamos passando por uma situação cíclica, na qual a inflação está voltando por fatores ligados à quebra da cadeia global de produção e alguma incerteza fiscal.

Esses dois pontos, na nossa visão, devem elevar o juro para 6%, segundo as estimativa­s da equipe econômica. Com 6% de juros e uma inflação que deve passar um pouco abaixo de 5%, mas que no ano que vem retorna entre 3% e 4%, estamos falando de um juro real de em torno de 2,5%. Esse é um patamar que estimula as pessoas a irem para veículos de investimen­to alternativ­o, buscando elementos que vão dar um retorno superior ao que se obteria deixando o dinheiro no overnight.

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LEONARDO RODRIGUES -7/5/2021 Foco. Falta contato direto com as pessoas, lamenta Fontes

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