O Estado de S. Paulo

MÚSICA E ARTE INSPIRAM IDOSOS

Lares para 3.ª idade apostam em atividades online.

- Gilberto Amendola

Quando era criança, Ana Maria Benavente, 84 anos, estudou balé. Apesar do talento natural e o amor pela dança, ela não seguiu o caminho da profission­alização. Na época, a família se opôs à possibilid­ade de uma carreira na área. “Minha mãe não deixou continuar. Naquele tempo, ser bailarina era uma coisa estranha”, contou.

Ainda assim, Ana nunca abandonou sua sensibilid­ade artística. Estudou piano, tomando gosto pela música clássica e tornouse uma frequentad­ora de musicais da Broadway. Em suas viagens para Nova York, pôde assistir a O Quebra Nozes, Cats, O Fantasma da Ópera e a outras peças.

Recentemen­te, Ana assistiu ao espetáculo Cantos de Xícaras no lar de idosos em que mora, uma unidade da Cora Residencia­l Sênior, no bairro do Ipiranga, em São Paulo. A peça, seguindo as normas e protocolos de combate à covid-19, foi transmitid­a ao vivo pelo Youtube. Trata-se da história de uma xícara centenária que foi esquecida em uma estante empoeirada, mas decide compartilh­ar suas vivências com o público.

A receptivid­ade dos residentes ao espetáculo é um indicativo de como as atividades culturais, mesmo no contexto da covid, são importante­s para o bem-estar e saúde dos idosos. Pensando nisso, lares voltados para a permanênci­a deste público têm criado programaçõ­es direcionad­as ao universo do teatro, cinema, música e da arte.

Ao assistir à peça de teatro, Ana Maria Benavente, por exemplo, lembrou das xícaras que a própria mãe trouxe da Europa. Já a Anna Guidi Pessoa, 79 anos, recordou do tempo em que ia ao teatro com o marido. E Hermínia Oliveira, 103 anos, diz que cultura é parte fundamenta­l da vida – e que gosta tanto de teatro quanto de bingo.

Coordenado­ra do projeto teatral que resultou no espetáculo Cantos de Xícaras, Helena Miguel contou que a resposta dos idosos tem sido emocionant­e: “Eles se envolvem com a história, relembram do próprio passado e cantam com a gente. Tudo acontece como em um chá da tarde”, disse. Para Helena, o público idoso tem caracterís­ticas que o tornam especial. “É uma audiência que sabe contemplar, que ouve as histórias. Eles têm esse templo da contemplaç­ão que é algo muito bonito”, disse.

Veridiana Chaves, diretora de marketing da Cora Residencia­l, afirmou que um dos desafios durante o período pandêmico é manter uma rotina de atividades culturais com segurança. Entre as atividades da casa, Veridiana destacou as rodas de leitura virtual. “Nossos residentes recebem um Ipad e podem, por exemplo, se aprofundar em autores. Com o Ipad, eles fazem pesquisas sobre os personagen­s e livros de Clarice Lispector – bem como temas relacionad­os com as obras de Clarice, como empatia, distância familiar e outros”, disse.

O Lar Sant’ana, administra­do pela Liga Solidária, no bairro Alto de Pinheiros, em São Paulo, também oferece uma série de atividades culturais para os seus residentes. O gerente executivo de longevidad­e da Liga Solidária, Gilberto Camilo, destaca uma delas. “A gincana musical é algo que faz muito sucesso entre os idosos. Ela estimula a memória e faz com que eles revivam momentos passados”, disse. A brincadeir­a funciona como uma espécie de Qual É a Música?, com os idosos brincando de adivinhar o nome da música, intérprete­s ou continuar a letra da canção. Atividade manuais e, principalm­ente, de pintura também fazem parte do cardápio da instituiçã­o.

“No lar, estamos todos vacinados. Temos protocolos para atividades presenciai­s, mas ainda não realizamos atividades externas, como cinema, teatro ou passeios ao shopping”, falou Camilo. Ana Guimarães de Carvalho, 95 anos, é residente do lar Sant’ana e fã de música brasileira. Assim como outras colegas de residência, não perde uma atividade cultural. “Gosto de tudo o que a vida tem para nos oferecer. Gosto de passear, gosto de teatro, de cinema e até mesmo de circo. Estou vacinada, mas esperando meus filhos se vacinarem também. Quero poder fazer tudo isso com eles e abraçálos muito”, disse.

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TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO
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FOTOS: TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO Lar Sant’anna. Família de Oriette Moraes Vieira da Silva, de 89 anos, curte experiênci­as lúdicas
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‘Cantos de Xícaras’. No espaço do lar Cora Residencia­l senhoras assistem a uma peça de teatro de forma não presencial

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