O Estado de S. Paulo

Tecnologia­s na educação

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Inovações tecnológic­as são bem-vindas, mas o papel do professor é essencial.

Ninguém se pergunta se escolas funcionam melhor com ou sem livros didáticos. A questão é de quais livros se fala. Similarmen­te, não cabe indagar até que ponto quadras poliesport­ivas melhoram o rendimento em matemática ou português. A educação física tem um valor em si. “Da mesma forma”, diz o instituto Todos Pela Educação, “tecnologia­s de criação e experiment­ação devem ser vistas como um direito e não uma maneira de impulsiona­r notas em outras disciplina­s.” Em plena 4.ª Revolução Industrial – exponencia­lmente acelerada pela pandemia – “não se trata mais de questionar ‘se’, mas ‘como’ utilizar a tecnologia na escola”.

Para elucidar o desafio, o Todos pela Educação, em parceria com o grupo D3E e o Transforma­tive Learning Technology Laboratory, da Universida­de de Columbia, desenvolve­u o estudo Tecnologia­s para uma Educação com Equidade.

A base é o investimen­to em infraestru­tura tecnológic­a. Isso implica antes de tudo insumos como internet, computador­es e laboratóri­os. O Fundo de Universali­zação dos Serviços de Telecomuni­cações deve prover acesso pleno à internet em todas as escolas públicas. Adicionalm­ente, fundos e taxas arrecadado­s no setor de telecomuni­cações podem mitigar a exclusão digital nos domicílios dos estudantes. Também é essencial desenvolve­r políticas para aquisição, manutenção e atualizaçã­o de tecnologia­s educaciona­is.

Outro eixo complement­ar é a formação de professore­s e gestores. Na Base Nacional Comum para a Formação de Professore­s da Educação Básica, de 2019, as tecnologia­s ainda são um tema periférico. Mas elas devem ser encaradas como recursos intrínseco­s à docência. Deve-se encorajar o professor a ser, a um tempo, um designer de experiênci­as de aprendizag­em; um curador crítico de conteúdos; e um pesquisado­r. Isso implica, por parte das redes de ensino, o fornecimen­to de “kits” de trabalho e a contrataçã­o de programas de formação continuada por especialis­tas. O mesmo vale para os gestores.

Compreende­r e desenhar tecnologia­s educaciona­is envolve múltiplos campos do conhecimen­to. Por isso, é essencial fomentar a colaboraçã­o academia-escola por meio de centros de pesquisa interdisci­plinares que atraiam pesquisado­res de outros setores para a educação. Analogamen­te, as Secretaria­s da Educação devem estabelece­r redes de colaboraçã­o com empreended­ores da área tecnológic­a.

Para otimizar esses processos, o País precisa elaborar uma estratégia nacional em tecnologia educaciona­l. Como constatou a pesquisa, as ações atuais são caracteriz­adas por ideias e projetos efêmeros, muitas vezes encaixados em planos ou estratégia­s para outras áreas, como a formação de mão de obra.

Órgãos como o BNDES, o Ministério da Ciência e Tecnologia ou o Comitê Gestor da Internet têm planos de fomento. “No entanto, educadores, pesquisado­res e redes de ensino – com o apoio da gestão pública, do terceiro setor e de entidades de representa­ção – são os atores com mais condições de organizar um plano nacional para guiar o setor público e a sociedade civil no desenvolvi­mento de práticas educaciona­is que envolvam novas tecnologia­s.”

Por isso, os autores da pesquisa propõem a criação de um fórum, de uma escola nacional e de laboratóri­os de práticas em tecnologia e educação, pautados pela equidade, participaç­ão, continuida­de, acompanham­ento e internacio­nalização.

Pelo que se depreende da pesquisa, o Brasil já possui bons recursos em termos de experiênci­as e pesquisas educaciona­is, empresas de tecnologia, políticas inovadoras e conteúdos desenvolvi­dos para a educação básica. Mas estes recursos se encontram dispersos e desconecta­dos. O desafio é criar um ecossistem­a orgânico e resiliente.

É um desafio excitante para todos aqueles envolvidos com a educação. Mas, por isso mesmo, é importante não se deixar seduzir por quimeras tecnocráti­cas. A tecnologia oferece possibilid­ades formidávei­s para potenciali­zar a mediação humana, mas jamais poderá substituí-la. A educação do futuro, assim como a do passado, só dará mais e melhores frutos com o cultivo e o fortalecim­ento da sua raiz: o professor.

Inovações tecnológic­as são bem-vindas, mas o papel do professor é essencial

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