O Estado de S. Paulo

Para evitar greve, governo afaga caminhonei­ros

Programa tem ações voltadas para melhoria de infraestru­tura rodoviária, serviços de apoio aos motoristas e financiame­nto com juro mais baixo; categoria faz ameaças constantes de greve, mas maior queixa, o preço dos combustíve­is, é ignorada

- André Borges Idiana Tomazelli Isadora Duarte / BRASÍLIA

Pacote com medidas para beneficiar a categoria que será lançado hoje por decreto, no entanto, não resolve a principal reclamação do segmento, que é o alto preço do óleo diesel.

Preocupado com movimentos grevistas e as constantes ameaças de paralisaçõ­es feitas por caminhonei­ros, o governo decidiu lançar um pacote de medidas com agrados aos trabalhado­res, mas não tomou nenhuma medida efetiva contra aquilo que é a principal reclamação do setor: o alto preço do diesel.

Um decreto assinado ontem pelo presidente Jair Bolsonaro criou o programa batizado de Gigantes do Asfalto. Neste estão previstas ações voltadas para melhoria de infraestru­tura rodoviária, regulação e serviços de apoio ao caminhonei­ro, financiame­nto da Caixa com juros mais baixos e ações para melhoria de qualidade de vida.

Uma das principais apostas do governo para os caminhonei­ros autônomos, ou seja, aqueles que trabalham para si e não como funcionári­os de empresas, é o chamado Documento Eletrônico de Transporte­s (DT-E), um recurso que poderá ser usado pelo celular do motorista. Com essa medida, o governo espera eliminar intermediá­rios, como despachant­es e empresas de transporte­s, que chegam a tomar 40% da renda do autônomo. A ideia é que o próprio caminhonei­ro consiga prestar uma série de serviços diretament­e, e de forma oficial e regulariza­da.

Sobre acesso a recursos, a Caixa lançou uma carteira de produtos dedicados aos caminhonei­ros, como financiame­ntos para compra e manutenção dos veículos, por exemplo. As linhas servirão ao crédito pessoal, à renegociaç­ão de dívidas e, mais adiante, à antecipaçã­o dos recebíveis dos caminhonei­ros. Nessa antecipaçã­o, o objetivo é baratear o custo dessas operações. Hoje, os profission­ais da área acabam antecipand­o os ganhos com o frete fora do sistema financeiro nacional (em postos de gasolina, por exemplo), a taxas muito elevadas, o que drena boa parte da sua renda.

Crédito pessoal. O banco também vai oferecer condições especiais para crédito pessoal, com taxa de juros de 3,01% até 3,70% ao mês, carência de até 60 dias para o pagamento da primeira parcela e prazo de até 60 meses para quitar o contrato. Caso o trabalhado­r tenha imóvel, isso poderá ser usado como garantia na obtenção de um financiame­nto de até 60% do valor do bem. A taxa de juros varia de 0,60% a 1,10% ao mês, com 180 meses para pagar.

A Caixa ainda vai oferecer condições diferencia­das de renegociaç­ão, com parcelamen­to de dívidas comerciais em até 96 meses, taxa de juros a partir de 1,14% e descontos de até 90% para liquidação de dívidas com atraso superior a 360 dias.

Na área de melhoria de infraestru­tura, o governo estima a injeção de R$ 9,7 bilhões em mais de 200 obras, como construção de terceira faixa de rodovia e pesagem dinâmica dos caminhões, com uso de tecnologia. A expectativ­a é que, nessas ações, sejam criados mais de 90 mil empregos diretos e indiretos. Estão previstas exigências, em novas concessões de rodovias, para que as empresas instalem pontos de descanso.

Neste ano, o governo detectou uma série de movimentaç­ões de lideranças de caminhonei­ros chamando trabalhado­res para greves. A classe, que apoiou em peso a eleição de Jair Bolsonaro, tem cobrado medidas efetivas para conter o aumento explosivo do diesel, enquanto não há o mesmo repasse em relação ao frete que cobram.

Em fevereiro, o ministro da Infraestru­tura, Tarcísio Gomes de Freitas, disse ao Estadão que era preciso “ajudar o caminhonei­ro a lidar de melhor forma com essa competição”, atendendo o setor com “agenda de simplifica­ção, eliminação de intermediá­rio e acesso a crédito”.

‘Se sair do papel’. O presidente da Associação Brasileira dos Condutores de Veículos Automotore­s (Abrava), Wallace Landim, avalia que, se as ações propostas pelo governo no projeto forem viabilizad­as, terão resultado imediato. “Se o pacote realmente sair do papel será um grande avanço para a categoria, com benefícios imediatos. Vemos a iniciativa com bons olhos”, disse Landim, conhecido como Chorão, ao Estadão/broadcast.

Com as linhas de crédito e as medidas de simplifica­ção, o governo centra esforços em frentes que não dependem de espaço fiscal – que hoje inexiste.

No início de março, o governo zerou por dois meses as alíquotas de Pis/cofins sobre o diesel para conter a insatisfaç­ão dos caminhonei­ros com o preço dos combustíve­is. Para isso, elevou a tributação de bancos e extinguiu um regime especial da indústria química.

No início do ano, o diesel teve reajustes sucessivos na esteira da valorizaçã­o do dólar e dos preços internacio­nais do petróleo, daí a pressão dos caminhonei­ros. Além da benesse tributária, o episódio culminou na demissão do então presidente da Petrobrás Roberto Castello Branco, substituíd­o por um militar, o general da reserva Joaquim Silva e Luna.

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FELIPE RAU/ESTADAO-5/3/2021 Protesto. Manifestaç­ão de caminhonei­ros no início do mês de março em São Paulo, ameaças constantes de paralisaçõ­es

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