O Estado de S. Paulo

‘Um manda, outro obedece’ leva Bolsonaro à CPI

- ✽ Andreza Matais

Se adotar a estratégia do silêncio ou das meias-palavras na CPI da Covid, o general Eduardo Pazuello passará a bola, inevitavel­mente, para o presidente Jair Bolsonaro. O gesto do ex-ministro da Saúde de não colaborar com a comissão e não falar pode ser interpreta­do, sob certo ângulo, também como postura de alguém que rejeita defender o presidente. Nesse caso, o oficial da ativa se comportará em benefício de sua própria sobrevivên­cia e não em prol de um governo.

É uma mensagem que o próprio general e toda a equipe de estrategis­tas do Planalto não conseguem controlar. Toda vez que deixar uma pergunta sem resposta e selecionar o que pretende rebater, Pazuello demonstrar­á que não tem nada a falar, pois, como deixou claro, algumas vezes apenas cumpriu ordens. Logo, quem tem de prestar contas aos senadores e ao País é seu ex-chefe no governo e atual chefe militar, o presidente da República.

O governo atuou oficialmen­te para garantir o silêncio de Pazuello. A pedido da Advocacia-geral da União, o Supremo concedeu habeas corpus para o general não responder a perguntas que possam levantar provas contra ele. Em suma, Pazuello não sairá preso do Senado.

Se optar mesmo por não falar, o general forçará a lembrança de uma frase decisiva que disse em outubro. Numa “live” ao lado de Bolsonaro, ele foi direto ao ponto: “É simples assim: um manda e o outro obedece”. Era uma reação à atitude do presidente de desautoriz­á-lo ao mandar cancelar a compra de doses da Coronavac. A frase, que entrou para o anedotário, é o que pode agora salvar o general. Ele tem um álibi: o presidente.

A estratégia do silêncio pode trazer consequênc­ias históricas também para a caserna. Por ser um general da ativa, Pazuello pregará nas Forças Armadas a imagem de uma instituiçã­o que não tinha resposta, no calor da hora, à denúncia grave de ter colaborado para uma política desastrosa de governo no combate à doença. Até a noite de ontem, o vírus tinha matado 439.379 brasileiro­s.

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