Pandemia apressa adoção de planos de mobilidade ativa • Vai mudar
No Summit Mobilidade, promovido pelo ‘Estadão’, especialistas avaliam que mudanças urbanas ‘pedem’ novas formas de transporte
A pandemia do coronavírus representa uma oportunidade para desengavetar projetos de incentivo ao transporte ativo nas cidades brasileiras, com deslocamentos a pé ou de bicicleta. E o exemplo pode vir principalmente de países vizinhos. A análise é de especialistas que participaram do segundo dia do Summit Mobilidade Urbana, realizado ontem, de forma digital.
A programação completa do evento, que vai até sexta-feira, está no site summitmobilidade.estadao.com.br. Os impactos da crise sanitária na mobilidade urbana foram alvo de debate no primeiro painel do dia. Diretora executiva do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP) Brasil, Clarisse
Cunha Linke avalia que, em diversos lugares do mundo, a covid-19 “deixou claro” o uso de bicicleta como solução de transporte mais sustentável, barato e seguro – já que o deslocamento é feito em área aberta e sem aglomeração.
Essa discussão, no entanto, não avançou no mesmo ritmo por aqui, ressaltou a especialista. “Desde a última década, com maior ênfase, a bicicleta já vinha sendo percebida como fundamental às grandes agendas globais, no que diz respeito ao desenvolvimento sustentável”, afirma. “Cidades europeias e da América Latina apresentaram planos para suas malhas cicloviárias e construíram novos corredores.” Em Nova York, as viagens de bike aumentaram durante o período. Em Berlim, lojas de bicicleta foram consideradas serviços essenciais. Já no Brasil o crescimento do modal até foi observado nas vendas e nos serviços de entrega, mas sem investimento paralelo em infraestrutura. “Aqui, a adoção está muito devagar.”
Os melhores exemplos, diz ela, podem vir de países vizinhos. “Cidade do México, Bogotá, Lima, Quito e Buenos Aires tiraram da prateleira seus planejamentos para daqui a 5 ou 10 anos. Não tiraram só faixa para carro, mas também espaços de estacionamentos. É importante olhar para os nossos ‘hermanos’, aconselha.
Especialistas lembram que os modais ativos e compartilhados devem estar integrados com ônibus e metrô. Diretorpresidente da Viaquatro e Viamobilidade, Francisco Pierrini lembra que, no primeiro pico da pandemia, em 2020, o número de passageiros caiu 80% no Metrô de São Paulo – o que, segundo ele, “contribuiu para o aumento da mobilidade ativa”. “A gente acredita muito na mobilidade humana, é um modelo que veio para ficar”. Ele diz ser preciso “caminhar no sentido da smart city, com a mobilidade ativa, para que as pessoas cheguem aos metrôs de alta capacidade. E acredita que a mobilidade vai mudar no pós-pandemia. “Em função do alto índice de home office, das empresas que não têm mais os espaços físicos de antes.”
Pagamento de tarifas. No segundo painel, “O desafio do transporte coletivo: como integrar a bilhetagem e a carteira digital no transporte”, especialistas advertiram que as novas alternativas de pagamento de tarifa, com meios eletrônicos e cartões bancários em crescimento, precisam pensar na inclusão social, uma vez que parte dos usuários não tem conta bancária ou acesso a meios digitais. Especialista em Transporte do Banco Mundial, Ana Waksberg Guerrini avalia que as inovações devem ter dois objetivos: facilitar o acesso dos usuários, principalmente os de baixa renda, e incentivar o transporte limpo. “E não há outra forma, a não ser penalizando os que usam o transporte individual.
Com a explosão de delivery e a busca por alternativas de lazer em meio ao isolamento social, especialistas apontam o crescimento do interesse por motocicletas no Brasil. O assunto foi objeto do terceiro painel do Summit. Segundo o gerente da Honda Motos, Marcos Paulo Monteiro, a queda nas vendas de veículos novos, em 2020, resultou da menor capacidade de produção na pandemia e não de queda na procura. “Chegamos a 2020 com o estoque muito baixo”, afirma. “Na primeira onda da pandemia tivemos a presença muito forte do delivery, para entrega de alimentos ou remédios, uma demanda que a indústria não esperava.”
“A mobilidade vai mudar no pós-pandemia. Mudar em função do alto índice de home office, das empresas que não têm mais os espaços físicos de antes.
E as empresas devem se adequar.” Francisco Pierrini
PRESIDENTE DA VIA QUATRO