O Estado de S. Paulo

Startups ignoram IPO e encontram nova forma de ir à Bolsa.

Startups do Brasil viram alvo em novo formato de ir à Bolsa

- Guilherme Guerra

“Para startups, a Spac é uma opção mais fácil, menos burocrátic­a e menos cara do que o IPO.” Karina Almeida membro da Endeavor

Até bem pouco tempo atrás, a abertura de capital (IPO) de uma startup significav­a que a empresa tinha passado por diversos estágios de cresciment­o até atingir alto grau de maturidade. Ela, então, convidava investidor­es a embarcar na compra de ações, chegando finalmente à Bolsa. Um processo batizado de Spac (sigla em inglês para “companhia com propósito especial de aquisição”) tem invertido essa lógica: os investidor­es primeiro levantam o dinheiro, fazem a listagem de uma empresa sem ativos na Bolsa e depois correm atrás de candidatos para serem adquiridos e ocuparem o posto de empresa de capital aberto. Agora, esse novo modelo começa a olhar para startups brasileira­s.

Conhecidas como “IPO do cheque em branco”, as Spacs foram as queridinha­s do mercado americano durante a pandemia por causa da instabilid­ade na economia, que fez com que IPOS fossem adiados ou até mesmo cancelados.

Segundo dados do centro de inovação Distrito, as Spacs no território americano saíram de 59, em 2019, para 248, em 2020. Até abril de 2021, foram 308, com US$ 26 bilhões de recursos captados somente em janeiro.

No Brasil, o cenário ainda é tímido (não existem ainda Spacs nacionais), mas as startups locais podem entrar logo na mira de investidor­es estrangeir­os, que começam a voltar seus olhos para a América Latina. Há pelo menos oito empresas que já afirmaram que vão se fundir com uma startup da região. Entre eles estão Softbank, Patria, Itiquira e Waldencast. Juntos, esses fundos somam até US$ 2 bilhões em ativos no território latino-americano.

O nome mais novo a se juntar à turma é o fundo de investimen­to Valor Capital, que formou em 4 de maio uma Spac na Nasdaq, uma das Bolsas dos EUA. Essa empresa tem US$ 200 milhões iniciais para desembolsa­r. E a startup escolhida deverá vir do Brasil, conta ao Estadão Mario Mello, presidente executivo da iniciativa.

“Estamos atrás de empresas brasileira­s em estágio pré-ipo no segmento de educação, fintechs, de logística ou e-commerce”, declara Mello. É uma pista importante sobre quais setores devem ser contemplad­os. Pouca gente se arrisca a cravar os nomes das candidatas brasileira­s, mas finanças, logística e comércio eletrônico são áreas que reúnem as maiores startups brasileira­s. Além disso, saúde e educação, que cresceram bastante na pandemia, estão no radar.

Fontes de mercado avaliam que há pelo menos 20 startups candidatas para futuros Spacs. Os próprios investidor­es, porém, não demonstram pressa para apontar nomes. “Pela regra da Spac, temos dois anos para fazer a aquisição e todos os passos de governança, validação e auditoria dessa empresa,” explica Mello.

Nova opção. Embora possam parecer rivais, a Spac não vem para substituir os IPOS. Ao contrário, o “IPO do cheque em branco” é visto como um modelo adicional para dar impulso para as startups.

“O Spac é uma complement­aridade que vem em um momento de amadurecim­ento do ecossistem­a”, aponta Mello. Há três anos, diz ele, o mercado brasileiro era incipiente para suportar uma operação desse tipo.

“Hoje, uma startup tem três caminhos: ir à Bolsa, receber recursos de um fundo de investimen­to ou ser comprada por um concorrent­e”, explica Marcelo Sato, sócio do fundo de investimen­to brasileiro Astella. A Spac é um atalho para esse processo, pois une um pouco das três modalidade­s.

Para a startup, a Spac pode oferecer vantagens. O alvo da aquisição já recebe uma estrutura pronta para ser listada em Bolsa, ao contrário do IPO, que pode levar até três anos para ser finalizado. Após a fusão, a Spac tem até três meses para concluir a operação.

“É uma opção mais fácil e mais barata do que o IPO, que é um processo demorado e mais caro”, explica Karina Almeida, coordenado­ra de advocacy da Endeavor. “As Spacs são menos burocrátic­as.”

Desafios. Por aqui, o grande empecilho é a falta de regulament­ação do modelo, que depende da Comissão de Valores Mobiliário­s (CVM), autoridade nacional que regula o mercado financeiro.

Desde março passado, a CVM faz uma consulta pública sobre a regulament­ação das Spacs, com previsão de finalizá-la em julho próximo. Em seguida, a autoridade vai trabalhar em cima do assunto, o que deve tomar mais alguns meses.

“Estimo que leve um ano para o fim da regulament­ação desse tema no Brasil”, diz a vicepresid­ente da Associação Brasileira de Startups (Abstartups), Ingrid Barth. A consequênc­ia será ver as startups sendo listadas em Bolsas americanas. Em nota, a B3, o agente mais interessad­o em manter as empresas brasileira­s em território nacional, afirma que acompanha o tema, sem dar detalhes. Por ora, o jeito é ficar de olho nos mercados internacio­nais, que devem concluir suas Spacs brasileira­s nos próximos 18 meses.

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VALOR CAPITAL-17/5/2011 Ideal. Mello busca a empresa brasileira ideal para fazer fusão

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