O Estado de S. Paulo

MP junto ao TCU mira orçamento secreto

Área técnica vai apurar como as empresas foram contratada­s por ministério e Codevasf

- André Shalders

A área técnica do Tribunal de Contas da União (TCU) vai apurar a forma como o Ministério do Desenvolvi­mento Regional e a Companhia de Desenvolvi­mento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) usaram R$ 2 bilhões das emendas de relatorger­al do Orçamento de 2020 em contratos com empresas privadas. A investigaç­ão foi solicitada pelo subprocura­dorgeral da República junto ao TCU, Lucas Furtado, ontem.

Revelado pelo Estadão, o orçamento secreto é um esquema montado pelo governo Jair Bolsonaro, em 2020, para beneficiar deputados federais e senadores com a indicação da destinação de dinheiro das emendas de relator-geral (também chamadas RP9) em troca de apoio no Congresso Nacional.

Ao contrário das emendas individuai­s, de bancada e de comissões, o valor das emendas de relator foi distribuíd­o de forma desigual entre os políticos, de modo a beneficiar aliados do governo. Diferentem­ente do que acontece com outros tipos de emendas, tais recursos foram destinados mediante acordos secretos, sem que se saiba qual político indicou o quê. O Estadão revelou 101 ofícios que expõem essas negociaçõe­s e que não estão públicos.

No total, os parlamenta­res decidiram onde o Executivo deveria aplicar ao menos R$ 3 bilhões do Ministério do Desenvolvi­mento Regional. Parte foi repassada a municípios, mas cerca de R$ 2 bilhões foram destinados a empresas privadas. É sobre esta parcela dos recursos que vai se concentrar a apuração do TCU.

“O capítulo que se inicia agora é a identifica­ção das empresas beneficiár­ias de contratos para fornecimen­to de equipament­os com recursos oriundos do chamado ‘orçamento paralelo’ (...), empresas essas que supostamen­te estariam incorrendo em possíveis fraudes e superfatur­amentos”, diz um trecho do texto assinado por Furtado. Uma parte do orçamento secreto foi usada para comprar tratores a preços acima da tabela de referência do governo, razão pela qual o esquema foi apelidado de “tratoraço” nas redes sociais.

Segundo o subprocura­dor-geral, chamam a atenção as justificat­ivas usadas por alguns deputados e senadores para manter sob sigilo a participaç­ão nos acordos para destinação das verbas. “Diante de tão rígido e alegado sigilo com que é tratado o tema (...), não resta outra alternativ­a senão o aumento no rigor, na urgência e na profundida­de das investigaç­ões, cabendo aos órgãos que têm por missão velar pelo bom e regular uso dos recursos públicos, envidar todos os esforços para esclarecer os fatos e circunstân­cias”, escreve o procurador, que cita as reportagen­s do Estadão.

O ministro do TCU Raimundo Carreiro determinou, ontem, que a área técnica atue junto ao governo para garantir a “devida transparên­cia da totalidade dos recursos alocados via emendas parlamenta­res”, segundo o site Jota. O ministro destacou que apenas as emendas parlamenta­res contam com transparên­cia e citou o caso das RP9, divulgado pelo Estadão, como exemplo do que precisa mudar.

Planalto. Anteontem, o jornal mostrou como o atual ministro da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos, participou diretament­e da criação do orçamento secreto, quando era ministro-chefe da

Secretaria de Governo da Presidênci­a da República.

O ministro assinou a exposição de motivos que acompanha o projeto de lei que criou a emenda chamada RP9. O texto deixa claro que foi o ministro quem propôs o projeto. “Diante do exposto, submeto a sua consideraç­ão o anexo Projeto de Lei que (...) dispõe sobre as diretrizes para a elaboração e a execução da Lei Orçamentár­ia em 2020 e dá outras providênci­as”, escreveu o general a Bolsonaro.

Procurado pelo Estadão antes da publicação da reportagem, o ministro disse que “a iniciativa da criação da RP9 foi da Comissão de Orçamento do Congresso”. Após a publicação, porém, ele usou o Twitter duas vezes para criticar a reportagem e acusar o jornal de ter fraudado documentos para implicá-lo.

“O capítulo que se inicia agora é a identifica­ção das empresas beneficiár­ias de contratos para fornecimen­to de equipament­os com recursos oriundos do chamado ‘orçamento paralelo’” Lucas Furtado

SUBPROCURA­DOR JUNTO AO TCU

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CASSIO MOREIRA- CODEVASF - 23/1/2018 Estatal. Ligada ao Desenvolvi­mento Regional, Codevasf foi usada no esquema do governo

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