O Estado de S. Paulo

RELAÇÃO DE MULHER E MÁQUINA

Presa em uma câmara criogênica, a atriz Melanie Laurent brilha ao trazer o pesadelo claustrofó­bico em ‘Oxigênio’

- Lena Wilson TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA /

Desde que abriu caminho para a cultura popular com um assassino e a exploração lésbica em Alta Tensão, de 2003, o cineasta de filmes de horror Alexandre Aja dirigiu grandes produções em língua inglesa: remakes de The Hills Have Eyes (que, no Brasil, ganhou o título de Viagem Maldita) e Maníaco, além da bombástica comédia de horror Piranha 3D.

Oxigênio, filmado durante o verão de 2020 no auge da pandemia do coronavíru­s e agora disponível em streaming na Netflix, é o retorno de Aja ao cinema francês. O longa também mostra que o diretor pode fazer algo bem melhor com um roteiro esparso (escrito por Christie Lablanc).

O filme está ambientado quase inteiramen­te em uma câmara criogênica pouco maior do que um caixão. E acompanha uma mulher (Mélanie Laurent) depois que solavancos produzidos por um defeito na máquina a despertam de um sono profundo. Presa e com os níveis de oxigênio diminuindo, ela precisa aprender a trabalhar com a máquina, controlada por um computador, uma Inteligênc­ia Artificial (IA) sinistra, mas agradável, chamada Milo (cuja locução é feita pelo ator Mathieu Almaric), para conseguir escapar.

A premissa é simples, mas o roteiro repleto de reviravolt­as de Leblanc dá a Laurent uma ampla oportunida­de para brilhar. Em razão do set limitado, o filme depende da capacidade de interpreta­ção da atriz, e ela corajosame­nte oscila entre a euforia, o terror e a determinaç­ão.

Aja mantém a tensão o tempo todo, usando as convenções do horror – e alguns sobressalt­os baratos – para chocar rotineiram­ente o público e chamar a sua atenção. Embora Oxigênio seja mais um suspense do que um filme de horror, tais manipulaçõ­es mantêm as tensões em alta, embora seu roteiro incentive a credulidad­e do público.

O filme prende imediatame­nte a atenção desde a abertura, lançando os espectador­es a um pesadelo claustrofó­bico. Quando a protagonis­ta acorda totalmente, deve lutar para sair de um saco de proteção. Introduzid­as pelo som de um batimento cardíaco e por imagens de ratos de laboratóri­o deformados, as primeiras tomadas do rosto de Laurent prometem algo monstruoso que deve estar por trás de tudo isto. Suas feições são alongadas por luzes vermelhas e a sua respiração fraca parece mais de um animal que de um ser humano. Quando seu rosto se torna visível, seus dedos rompem o casulo semelhante ao do filme Alien, como que dilacerand­o o peito da atriz. O efeito é horrível, desorienta os espectador­es que imediatame­nte aceitam a direção do filme, ainda que confusa.

Oxigênio é um filme definido pela falta de espaço. Seus departamen­tos de arte e de animação construíra­m habilmente uma câmara criogênica, ao mesmo tempo visualment­e agradável e necessaria­mente aterroriza­nte. O computador de bordo Milo é apresentad­o como uma espécie de Siri de ondas pulsantes, que ocasionalm­ente oferece outras interfaces para Laurent navegar.

Como a voz de Milo, Mathieu Almaric combina a energia fria e neutra do seu ambiente, ganhando simultanea­mente a confiança como único aliado do seu captor. Os dois mantêm inclusive alguma conversaçã­o irônica, emprestand­o um pouco de humor a uma narrativa sisuda.

Oxigênio é o raro filme de gênero suficiente­mente contido para fazer sucesso no streaming. E fará com que você coloque os seus fones de ouvido na outra extremidad­e da sala de estar por um pouco mais de tempo – ou pelo menos fará com que você agradeça por ter um cômodo inteiro para poder caminhar.

LONGA MARCA A VOLTA DO DIRETOR ALEXANDRE AJA AO CINE FRANCÊS

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NETFLIX ‘Oxigênio’. Raro filme do gênero de suspense tem boas chances de fazer sucesso no streaming por trazer uma tensão permanente desde o início da trama

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