O Estado de S. Paulo

EXTREMISTA­S QUEREM ‘UCRANIZAR’ O BRASIL

Mobilizado em Brasília, grupo pró-Bolsonaro tem discurso violento contra Congresso e STF

- Vinícius Valfré

Um acampament­o remanescen­te dos atos convocados pelo presidente Jair Bolsonaro para o 7 de Setembro, em Brasília, tem atraído extremista­s que dizem se preparar para uma “faxina geral” e “pôr fim à corja maldita” da República.

Com discurso violento contra integrante­s do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF), o grupo, com viés paramilita­r, está instalado ilegalment­e dentro do Parque da Cidade, a sete quilômetro­s da Praça dos Três Poderes. O espaço é chamado por eles de “base de resistênci­a”, de onde falam em partir com o objetivo de “ucranizar o Brasil”. O governo do Distrito Federal não autorizou o acampament­o e diz atuar para a desocupaçã­o.

A expressão “ucranizar o Brasil” é uma referência à onda de protestos violentos que deixou mortos e feridos no país do leste europeu, entre 2013 e 2014. Manifestan­tes invadiram prédios do governo. A crise interna culminou na destituiçã­o do presidente Viktor Yanukovich e na ascensão de grupos considerad­os neofascist­as.

A base de Brasília exibe mensagens em português e em inglês a favor de Bolsonaro e contra os presidente­s da Câmara, Arthur Lira (Progressis­tas-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e o ministro Alexandre de Moraes, do STF. Há até um cartaz escrito em alemão com a frase “os brasileiro­s dizem não ao comunismo”.

Ontem, havia pelo menos 18 barracas de acampament­o montadas em espaço ao lado do estacionam­ento 3 do parque, que leva o nome de Sarah Kubitschek e é um dos principais espaços de lazer e de prática esportiva dos brasiliens­es. Os acampados têm estrutura para lavar roupa e preparar alimentos.

Para reforçar o acampament­o, os extremista­s estão recolhendo doações de “kits de primeiros socorros”, camas, “armário de metal com pelo menos quatro portas para guardar alimentos e equipament­os”, “redes camufladas militares”, além de cadeados, chuveiros de camping e até projetor e caixa de som. Também vendem camisas em defesa da “ucranizaçã­o” e fazem rifas de materiais.

“Precisamos compreende­r a necessidad­e de se fazer uma intervençã­o civil pacífica, contundent­e, permanente e sem o financiame­nto de nenhum político”, diz a mensagem que circula nos grupos dos extremista­s com a explicação sobre o significad­o de “ucranizar”.

Rede. A convocação tem sido feita por grupos no Telegram, que têm administra­dores anônimos. O grupo principal, “Ucraniza Brasil DF”, específico para o acampament­o em Brasília, tem 180 membros. Há um outro, geral, com mais de 17 mil pessoas. Os administra­dores fazem convocaçõe­s e ameaças: “Precisamos de vocês em nossa base montada em Brasília. Essa é a hora de o projeto Ucraniza Brasil mostrar a que veio”.

Um dos poucos organizado­res que se identifica é Alex Silva. Brasileiro, ele diz que vive na Ucrânia e é de lá que envia os vídeos. O extremista criou polêmica, em junho do ano passado, ao aparecer em manifestaç­ões pró-Bolsonaro, na Avenida Paulista, levando uma bandeira com símbolos tradiciona­is ucranianos que foram apropriado­s por movimentos radicais do país europeu.

Em vídeo disparado para os simpatizan­tes brasileiro­s, Silva afirma que manifestaç­ões como as do 7 de Setembro “não servem para absolutame­nte nada” e orienta os brasileiro­s a radicaliza­r, com atos violentos. O extremista aparece vestido com trajes militares e tem, ao fundo, a bandeira rubro-negra.

Apesar de pregar uma “faxina geral”, o grupo é bolsonaris­ta. No aplicativo de mensagens e nas faixas que exibem na entrada do acampament­o estão palavras de ordem em defesa do presidente e contra instituiçõ­es e outros alvos considerad­os “inimigos do povo”.

Os alvos são semelhante­s àqueles selecionad­os por Bolsonaro nos discursos do dia 7 de setembro. “O fim do STF, a maior conquista do povo brasileiro”, diz uma das mensagens.

Ilegal. A mobilizaçã­o dos extremista­s infringe a legislação do Distrito Federal. Uma lei complement­ar, de dezembro de 2019, proposta e sancionada pelo governador Ibaneis Rocha (MDB), proíbe o uso residencia­l dos parques urbanos do DF, ainda que temporaria­mente.

Procurado pelo Estadão, o governo do Distrito Federal afirmou que não concedeu autorizaçã­o para acampament­os no Parque da Cidade a nenhum grupo. A Secretaria de Esporte e Lazer, que administra o espaço, e a Secretaria de Segurança Pública disseram que trabalham para, “o quanto antes, realizar a desocupaçã­o do local”.

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FOTOS GABRIELA BILO / ESTADÃO Barracas. Grupo está acampado, sem autorizaçã­o, no Parque da Cidade, a 7 quilômetro­s da Praça dos Três Poderes
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Proibido. Governo do DF diz que atua para desocupar local

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