O Estado de S. Paulo

Barbados vira república, elege presidente e se livra da rainha

Ex-colônia britânica deixa a Comunidade Britânica para tomar as próprias decisões sobre problemas como pandemia e mudanças climáticas

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O debate sobre racismo e colonialis­mo entrou no Palácio de Buckingham e fez uma vítima ilustre: a rainha Elizabeth II. Barbados, ilha do Caribe ocupada pelos ingleses desde 1625, decidiu se tornar uma república e retirar a foto de Elizabeth das repartiçõe­s públicas. A partir de 1.º de dezembro, ela deixa de ser chefe de Estado e o país, de 300 mil habitantes, terá um presidente – no caso, uma mulher, Sandra Mason, de 72 anos, eleita na quarta-feira pelo Parlamento local.

Barbados conquistou a independên­cia em 1966 e manteve a tradição colonial de considerar a rainha como chefe de Estado. A prática é um resquício do império britânico que sobrevive em pleno século 21. Países como Austrália, Canadá e Nova Zelândia também seguem a mesma linha – australian­os e neozelande­ses, inclusive, sequer conseguira­m se livrar da presença do Reino Unido, cuja bandeira ainda ocupa um pedaço de suas bandeiras nacionais.

Barbados anunciou a decisão de se separar da monarquia em setembro de 2020. “Após obter a independên­cia, há mais de meio século, nosso país não pode duvidar de sua capacidade de se autogovern­ar”, afirmou Mason, em um discurso na capital, Bridgetown. Na ocasião, ela argumentou que havia chegado o momento de Barbados “deixar totalmente para trás seu passado colonial”.

Em 29 de setembro, o Parlamento votou a emenda constituci­onal para por fim à associação do país com a Commonweal­th, que reúne ex-colônias que integram a chamada Comunidade Britânica.

SEPARAÇÕES. A ilha de 431 quilômetro­s quadrados é três vezes menor que o município de São Paulo. O turismo tem grande peso na economia. O destino é um dos mais procuprado­s das Pequenas Antilhas, especialme­nte popular entre a alta sociedade britânica, em razão da proximidad­e cultural. Antes da pandemia de covid-19, mais de 1 milhão de turistas visitavam o país por ano, famoso por suas praias paradisíac­as de águas cristalina­s.

Barbados não será a primeira ex-colônia britânica no Caribe a se tornar uma república, uma vez que a Guiana já deu esse passo em 1970, seguida por Trinidad e Tobago, em 1976, e Dominica, em 1978. No passado, a Jamaica sinalizou seu descontent­amento com a monarquia britânica, mas até hoje não seguiu adiante com o processo de separação.

As últimas colônias do Reino Unido na região são território­s membros da Comunidade do Caribe e optaram por permanecer­em como parte da Commonweal­th. Elizabeth II ainda é chefe de Estado de outros 15 países.

A primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley, disse que espera que a eleição de Mason como a primeira mulher presidente leve a uma maior unidade na luta contra várias ameaças externas que podem afetar a ilha. “Acabamos de eleger uma mulher que é única e apaixonada­mente barbadiana, não pretende ser outra coisa e reflete os valores de quem somos”, disse Mottley.

AUTONOMIA. Em defesa da decisão de seu governo de eleger Mason, a primeira-ministra disse que era importante para o povo de Barbados lutar para lidar com dificuldad­es como a pandemia e as mudanças climáticas. Os dois temas, de acordo com Mottley, representa­m uma “tempestade perfeita que prejudica a estabilida­de e a prosperida­de de Barbados.

A premiê, no entanto, tratou de desassocia­r a decisão de Barbados de se tornar uma república de qualquer condenação de seu passado britânico. “Esperamos continuar o relacionam­ento com a monarca britânica”, disse.

Wazim Mowla, do centro de estudos Atlantic Council, disse que a eleição poderia beneficiar Barbados tanto em casa quanto no exterior. “A medida torna o país um ator mais legítimo na política global”, disse Mowla, mas também pode servir como uma “ação unificador­a e nacionalis­ta” que pode beneficiar sua atual liderança.

“Outros líderes caribenhos e seus cidadãos, provavelme­nte, elogiarão a medida, mas não espero que outros países sigam o exemplo de Barbados”, afirmou Mowla. “Essa mudança será considerad­a por outros países apenas se for do melhor interesse de cada um.”

Império britânico

Apesar da decisão de Barbados, Elizabeth II ainda é chefe de Estado de outros 15 países

 ?? TIM ROOKE/REUTERS–19/3/2019 ?? Charles, herdeiro do trono britânico, ao lado de Sandra Mason, agora presidente de Barbados
TIM ROOKE/REUTERS–19/3/2019 Charles, herdeiro do trono britânico, ao lado de Sandra Mason, agora presidente de Barbados

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