O Estado de S. Paulo

Quando o homem vai desaparece­r?

- Fernando Reinach fernando@reinach.com

Eu tinha 12 anos de idade. Folhas brancas de papel formavam uma faixa horizontal na parede da sala de aula, na escola. Na extremidad­e esquerda, desenhamos uma linha vertical e escrevemos “3.200 anos antes de Cristo” e “fim da Pré-história”. E, na ponta direita, outra linha com o ano “1.968”. À sua direita, escrevemos “futuro”. A professora nos fez dividir a linha em cinco intervalos de mil anos e marcamos cada assunto que iríamos estudar.

Cinquenta anos depois, ainda cultivo uma linha do tempo. Ela descreve a história do Homo sapiens. O lado direito ainda termina no presente, mas o lado esquerdo começa em “250.000 anos antes de Cristo”. Em seguida, coloco “15.000 anos antes de Cristo”, o início da domesticaç­ão das plantas e animais. Em “3.200 anos antes de Cristo”, coloco o aparecimen­to da escrita, e o resto da minha linha do tempo continua mais ou menos igual.

O que mudou foi o compriment­o da pré-história, um período que cobre 98% da história de nossa espécie. Na escola, estudei somente os últimos 2% da história da espécie humana. E nem chegamos no golpe de 1964.

Agora, um grupo de cientistas conseguiu medir com precisão a idade dos esqueletos mais antigos que conhecemos de nossa espécie, encontrado­s durante as décadas de 1960 e 1970, onde hoje é a Etiópia.

A idade desses esqueletos tem sido motivo de muita discussão, dada a dificuldad­e de determinar de que época é o material. Muitos cientistas acreditava­m que essas pessoas tinham morrido entre 155 mil e 190 mil anos atrás.

Mas, analisando novamente a área onde os fósseis foram descoberto­s, foi possível correlacio­nar os sedimentos com o material depositado na região após uma erupção vulcânica, cuja data é bem estabeleci­da pelos pesquisado­res.

Com esses novos dados, os cientistas estimaram que a idade desses esqueletos é de 233 mil anos, sendo que o intervalo de confiança dessa medida é de 22 mil anos, uma margem de erro de menos de 10%.

Assim, podemos afirmar que o ser humano surgiu no planeta aproximada­mente há 233 mil anos. Ele pode ter surgido antes, mas não depois. Corrigi minha linha do tempo, que agora começa 233 mil anos atrás. O interessan­te é que o erro dessa medida (22 mil anos) é quase cinco vezes mais longo do que o período que estudei na escola.

Mas o que me preocupa é quanto tempo nossa espécie ainda vai sobreviver. Sabemos que mais de 99% das espécies que habitaram o planeta estão extintas. Serão mais 500 anos, 5 mil, 50 mil?

Depende de como nós conservamo­s o meio ambiente em que vivemos. Do jeito que a coisa anda, creio que mil anos seja um bom palpite. E, se assim for, já vivemos 99% de nossa existência. Estamos próximos do fim dela. O resto dos seres vivos agradece.

Mais informaçõe­s: Age of the oldest known Homo sapiens from eastern Africa. Nature https://doi.org/10.1038/s4158 6-021-04275-8 2021. • É BIÓLOGO, PHD EM BIOLOGIA CELULAR E MOLECULAR PELA CORNELL UNIVERSITY E AUTOR DE A CHEGADA DO NOVO CORONAVÍRU­S NO BRASIL; FOLHA DE LÓTUS, ESCORREGAD­OR DE MOSQUITO; E A LONGA MARCHA DOS GRILOS CANIBAIS

Idade dos esqueletos humanos mais antigos encontrado­s é de 233 mil anos, segundo cientistas

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