O Estado de S. Paulo

A reforma na Espanha que inspira o PT

Projeto citado por Lula ainda precisa passar pelo Parlamento

- ANDRÉ SHALDERS BRASÍLIA

Divergênci­as Parte da esquerda aponta concessões demais aos sindicatos patronais, que criticam resultado final Nova lei Projeto capitanead­o pela ministra Yolanda Díaz trata de uma nova lei, não da revogação da reforma anterior, de caráter liberaliza­nte

Ministra do Trabalho e Economia Social da Espanha, a advogada trabalhist­a Yolanda Díaz Pérez, de 50 anos, coordenou as negociaçõe­s da “contrarref­orma” trabalhist­a lançada recentemen­te pelo governo local. Ao Estadão, Yolanda disse que virá ao Brasil discutir o tema com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pré-candidato ao Palácio do Planalto.

A “contrarref­orma” espanhola virou tema no Brasil depois de o petista, atual líder nas pesquisas de intenção de voto, sugerir que pode usá-la como base para rever a reforma trabalhist­a feita em 2017, no governo Michel Temer (MDB). Nos seus dois mandatos, Lula não propôs uma grande reforma trabalhist­a. Ele enviou ao Congresso uma reforma sindical que só contemplav­a as centrais e não foi aprovada. No começo desta semana, o ex-presidente participou de reunião virtual com políticos do Partido Socialista Obrero Espanhol (PSOE), do presidente espanhol, Pedro Sánchez. No encontro, porém, o petista evitou dizer explicitam­ente que revogaria a reforma de 2017.

O texto capitanead­o por Yolanda foi apresentad­o no fim de dezembro, após nove meses de negociaçõe­s entre governo e sindicatos patronais e de trabalhado­res – as três partes aceitaram o resultado, embora haja descontent­amento de parte do empresaria­do. O texto tem cinco artigos principais, e ocupa 54 páginas do equivalent­e espanhol ao Diário Oficial brasileiro. Trata-se de uma nova lei, e não da revogação da reforma anterior, de caráter liberaliza­nte, feita em 2012 pelo governo de Mariano Rajoy, do conservado­r Partido Popular (PP).

Segundo especialis­tas ouvidos pelo Estadão, a reforma tem três objetivos: fortalecer a posição dos sindicatos de trabalhado­res em negociaçõe­s coletivas; melhorar as condições de terceiriza­dos, evitando que ganhem menos que contratado­s por via direta; e, principalm­ente, diminuir o alto porcentual de trabalhado­res temporário­s, que hoje chega a 25% – o maior da União Europeia.

“O (ponto central) era o grave problema existente na Espanha, a enorme taxa de trabalhado­res temporário­s. E da precarieda­de como forma de vida. Foi muito difícil a negociação, mas, desde o primeiro minuto, eu desejei chegar a um acordo com os agentes sociais”, disse Yolanda. “Em geral, as grandes reformas trabalhist­as na Espanha são acompanhad­as de conflitos sociais. Esta foi feita com base em um acordo de todas as partes.”

Professor da Faculdade de Economia e Administra­ção da USP, José Pastore tem se dedicado a estudar a revisão da reforma trabalhist­a espanhola, e avalia que é cedo para conclusões. “Esta é a primeira grande diferença entre Espanha e Brasil. A reforma brasileira de 2017 criou modalidade­s de trabalho temporário, mas foi preservada a proteção social”, disse ele, destacando que as mudanças de 2012 de fato ampliaram a precarizaç­ão do trabalho no país europeu.

DESEMPREGO.

A reforma trabalhist­a de 2012 deu mais flexibilid­ade para as empresas na hora de contratar, e ajudou a diminuir o altíssimo desemprego da Espanha – no fim daquele ano, o porcentual de pessoas sem ocupação no país era de 25,7%, chegando a 42,5% entre jovens de 20 a 29 anos. Hoje, a taxa de desemprego no país é de 14,5%, segundo o Instituto Nacional de Estadístic­a (INE), equivalent­e local do Instituto Brasileiro de Geografia Estatístic­a (IBGE). Por outro lado, a mudança, que foi citada por Temer como uma das inspiraçõe­s para a reforma brasileira de 2017, rebaixou salários e elevou o número de temporário­s.

A “contrarref­orma” de dezembro faz parte de um conjunto de medidas, como a chamada “Lei Rider” (que regulament­a a atividade dos entregador­es de aplicativo­s) e o aumento do salário mínimo nacional, que hoje é de 950 (R$ 6.012,90, no câmbio atual). Segundo Yolanda, o aumento do mínimo mostrou que não há risco de mais desemprego. “Agourentos diziam que isso ia destruir o emprego, que seria uma hecatombe. Nada

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SUSANA VERA / REUTERS

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