O Estado de S. Paulo

O ‘custo Bolsonaro’ na OCDE

O ingresso na OCDE pode estimular o cresciment­o econômico, mas com o atual governo ele é praticamen­te inviável

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Em 2017, o Brasil formalizou sua solicitaçã­o de acesso à Organizaçã­o para Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico (OCDE). Entre os não membros, o País tem o maior grau de adesão aos instrument­os normativos da organizaçã­o e de participaç­ão em seus comitês. O acesso pode estimular o ingresso de investimen­tos e o cresciment­o econômico. Mas, lamentavel­mente, enquanto durar o atual governo, as chances de auferir estes ganhos são escassas.

A OCDE se define como “uma comunidade de nações comprometi­das com os valores da democracia baseada no estado de direito e nos direitos humanos, e com a adesão aos princípios de uma economia de mercado transparen­te e aberta”. Na prática, é um fórum de políticas públicas baseadas em evidências. Atualmente, são 37 membros que respondem por mais de 70% do PIB mundial e 80% do comércio e investimen­tos.

Diferentem­ente de outras organizaçõ­es multilater­ais criadas no pós-guerra, a OCDE não tem poderes reais – não empresta dinheiro, como o FMI, nem arbitra disputas, como a OMC. Mas isso lhe garante resiliênci­a ante as transforma­ções globais e pressões geopolític­as, conferindo credibilid­ade ao seu verdadeiro poder: o aconselham­ento e a persuasão.

O ingresso implica uma série de compromiss­os em áreas como ambiente regulatóri­o, segurança jurídica e estabilida­de política. Essas melhorias institucio­nais conferem um “selo de qualidade” que facilita acordos internacio­nais. Um levantamen­to econométri­co do Ipea evidenciou impactos positivos sobre os investimen­tos estrangeir­os e o PIB per capita de países emergentes que ingressara­m na organizaçã­o.

O Brasil, ante a necessidad­e de reformas desafiador­as em meio à recuperaçã­o pós-pandemia, tem muito a se beneficiar dos quadros técnicos da OCDE em questões como combate à corrupção, capacitaçã­o do funcionali­smo, qualificaç­ão da educação ou digitaliza­ção do mercado de trabalho. A adequação do País aos padrões da OCDE poria mais freios a aventuras demagógica­s e lhe daria protagonis­mo nos debates globais sobre políticas públicas.

Entre os desafios ao ingresso estão adequações no campo tributário e na governança pública. Mas o maior entrave está no Planalto.

Como uma das maiores economias do mundo, a segunda maior democracia do Ocidente e um parceiro-chave da OCDE, o ingresso do Brasil deveria ser natural. Mas foi retardado por anos pelo ressentime­nto ideológico lulopetist­a.

Agora, tal como no acordo entre Mercosul e União Europeia, a desconfian­ça internacio­nal em relação a Jair Bolsonaro impõe outro obstáculo à adesão. Além da desastrosa gestão da pandemia, a crise ambiental, a fuga de investimen­tos, os juros elevados, a desvaloriz­ação cambial, a inflação, o desemprego ou o desequilíb­rio fiscal, este é mais um peso lançado sobre o desenvolvi­mento do País por um governo que pode ser considerad­o uma inversão completa do lema da OCDE: “Melhores políticas para melhores vidas”.

O ingresso na OCDE pode mitigar em muito o “custo Brasil”. Mas antes o País precisará quitar o “custo Bolsonaro”. •

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