O Estado de S. Paulo

Com Barra Torres, Marinha acumula desgastes no governo Bolsonaro

Além do embate entre chefe da Anvisa, que é almirante da reserva, e presidente, Força foi questionad­a sobre tragédia em Capitólio

- FELIPE FRAZÃO

Sob novo comando há nove meses, a Marinha colecionou episódios com potencial de desgaste para o governo Jair Bolsonaro. O choque de um de seus oficiais-generais com o presidente foi o principal deles. Após o presidente levantar suspeitas sobre “interesses” da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em dar aval à vacinação de crianças contra a covid-19, o contra-almirante da reserva Antonio Barra Torres, diretor-presidente do órgão, fez um desafio público e cobrou retratação.

A postura de Barra Torres causou mal-estar na Marinha. Na nota a Bolsonaro, o almirante assinou a carta com o cargo na Anvisa e na Marinha: “Contra-almirante RM1 Médico”. Ele é um dos poucos médicos da instituiçã­o a chegar ao quadro de oficiais-generais, com duas estrelas, o terceiro mais alto na hierarquia militar. O diretor da Anvisa afirmou que foi apenas uma questão metodológi­ca, formal.

O Estatuto dos Militares proíbe esse tipo de referência usada por Barra Torres. Segundo o código, o militar deve “abster-se, na inatividad­e, do uso das designaçõe­s hierárquic­as no exercício de cargo ou função de natureza civil, mesmo que seja da administra­ção pública”. E não deve reproduzir a patente “para discutir ou provocar discussões pela imprensa a respeito de assuntos políticos ou militares”. O Estadão questionou a Marinha sobre o caso de Barra Torres e se ele estava sujeito à punição, mas não houve resposta.

IMAGEM NEGATIVA. A resposta do almirante foi divulgada quando a Marinha já estava no noticiário de viés negativo. A Força era questionad­a por causa do desabament­o de um paredão sobre lanchas que passeavam próximas à margem do cânion de Capitólio (MG). No País, as regras de navegação em lagos são responsabi­lidade da Marinha. Segundo militares, o ordenament­o do espaço no lago era da prefeitura de Capitólio, por meio de decreto de 2019. A Marinha cooperava na fiscalizaç­ão nas águas sob jurisdição do município.

Em outro episódio, a Marinha foi vinculada a Bolsonaro de forma negativa. No fim do ano, o presidente permaneceu em Santa Catarina enquanto a Bahia enfrentava situação de calamidade por causa das chuvas. No litoral catarinens­e, Bolsonaro foi fotografad­o diariament­e passeando em moto aquática com a marca da Força.

A Marinha alegou que tem a responsabi­lidade de garantir a segurança do presidente e familiares em ambientes aquáticos. O Gabinete de Segurança Institucio­nal disse que a segurança é “ininterrup­ta” e independe de o chefe do Executivo o estar em evento oficial, privado ou em momentos de lazer.

ALIADO. O almirante Almir Garnier, que chegou ao comando da Marinha em abril do ano passado, tem feito uma ofensiva pró-governo nas redes sociais. Ele divulga vídeos do presidente sendo aplaudido, depoimento­s, visitas de rotina e operações. Garnier já servia no Ministério da Defesa antes de ser nomeado por Bolsonaro e era visto como alguém alinhado ao pensamento do presidente. •

A Marinha tem almirantes no Ministério de Minas e Energia e na Secretaria de Assuntos Estratégic­os

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Diretor da Anvisa, Barra Torres cobrou retratação do presidente

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