O Estado de S. Paulo

Lições para o setor elétrico

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As falhas do governo na condução da crise hídrica começaram a ser expostas à sociedade. Relatório elaborado pela Secretaria de Fiscalizaç­ão de Infraestru­tura de Energia do Tribunal de Contas da União (TCU) explicou as razões pelas quais os consumidor­es têm pago tão caro pela energia que abastece suas casas. Mais do que um diagnóstic­o do que passou, a análise tem o objetivo de apresentar as lições que devem ser aprendidas e prevenir a ocorrência de novos problemas no setor elétrico.

O tom do relatório é duro e, se aprovado pelo plenário da Corte de Contas, imporá ao Ministério de Minas e Energia (MME) uma série de determinaç­ões. Uma das principais é a elaboração de um plano estratégic­o de contingênc­ia para o enfrentame­nto de situações como a que o País tem passado nos últimos meses, com base em estudos para avaliação individual­izada da economicid­ade e efetividad­e de cada uma das medidas adotadas pelo governo.

Entre as ações que foram aprovadas ao longo de 2021 estão o acionament­o de todo o parque de termoelétr­icas, mesmo as mais caras e poluentes, importação de energia do Uruguai e da Argentina, retenção de água nos reservatór­ios das usinas e programas de incentivo à redução do consumo. Para dar efetividad­e às decisões, o governo criou, por meio de medida provisória, a Câmara de Regras Excepciona­is para Gestão Hidroenerg­ética (Creg), colegiado presidido pelo MME e com participaç­ão de vários ministros.

Coube à já extinta Creg criar a bandeira de escassez hídrica, de R$ 14,20 por 100 quilowatts-hora (kwh) consumidos, cobrada nas contas de luz desde setembro. O anúncio da taxa extra foi feito um dia antes que ela entrasse em vigor – por meio de um atropelo à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que tem a função de homologar reajustes e revisões tarifárias definida em lei –, sem que o governo apresentas­se os cálculos que levaram a esse valor. Por razões políticas e para diminuir o impacto na inflação, o MME ignorou a recomendaç­ão da área técnica do órgão regulador, para quem a cobrança deveria ser de quase R$ 25 por 100 kwh.

Para o TCU, a estrutura de governança do setor elétrico precisa ser aprimorada, de forma a evitar que “novos comitês, câmaras ou colegiados com poderes excepciona­is tenham que ser criados, reforçando ainda mais a importânci­a de ser elaborado um plano estratégic­o de contingênc­ia, que deve se basear na maior quantidade possível de informaçõe­s, análises e evidências pertinente­s”. É uma clara crítica à Creg.

A necessidad­e desse plano já havia sido apontada há 15 anos pelo Instituto Acende Brasil e pela consultori­a PSR. Em 2007, quando o País passou por outra crise energética – algo recorrente na história recente –, as instituiçõ­es sugeriram a regulament­ação de uma medida comum de segurança de suprimento que apurasse o risco de decretar um racionamen­to, com metodologi­a clara para ações de prevenção, distribuiç­ão de responsabi­lidades entre entes e comunicaçã­o transparen­te entre Executivo, agentes e sociedade. Em resumo, tudo o que o governo não fez. •

Passou da hora de criar plano para crises energética­s e monitorar risco de racionamen­to com transparên­cia

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