O Estado de S. Paulo

Cartão-postal de Minas, Serra do Curral vira arma contra Zema

Exploração de minério na região opõe governador e candidato à reeleição a adversário­s; licença é contestada na Justiça

- CARLOS EDUARDO CHEREM ESPECIAL PARA O ESTADÃO BELO HORIZONTE

Quase 25 anos após ter sido eleita o símbolo de Belo Horizonte pela população, a Serra do Curral – chamada de cartão-postal da capital mineira – se tornou um dos principais temas da disputa pelo governo de Minas Gerais. De um lado, o governador Romeu Zema (Novo), que concorre à reeleição, é favorável à exploração de minério na região. De outro, todos os seus adversário­s este ano já se manifestar­am contra a atividade.

Na segunda-feira passada, a Justiça mineira suspendeu a liberação para a exploração da área. A autorizaçã­o havia sido concedida em abril deste ano pelo Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam), ligado à Secretaria do Estado do Meio Ambiente e Desenvolvi­mento Sustentáve­l.

Três dias depois, após audiência pública que reuniu o autor da ação, o ex-vice-prefeito de Belo Horizonte Paulo Lamac (Rede), o governo do Estado e a empresa Taquaril Mineração S/A (Tamisa), que detém a licença de exploração, o mesmo juiz que havia decidido pela suspensão da licença – Michel Curi e Silva, da 1.ª Vara da Fazenda Pública Estadual – revogou a própria decisão.

Além de questionad­a na Justiça, a licença para explorar a mineração na Serra do Curral é rejeitada por especialis­tas. “Essa questão (da mineração na Serra do Curral) é populista, para dizer o mínimo. Um discurso voltado para dividir, e não para a reflexão”, disse a ambientali­sta Patrícia Boson, especialis­ta em recursos hídricos. Moradora da zona sul da capital, ao pé da serra, Patrícia destacou a histórica ocupação irregular da região e as diversas intervençõ­es feitas no local nas últimas décadas.

A prefeitura de Belo Horizonte, que tinha no comando o agora pré-candidato ao governo do Estado Alexandre Kalil (PSD), acionou a Justiça contra o licenciame­nto concedido à Tamisa. Segundo a administra­ção municipal, o trabalho de uma adutora de água que abastece 70% da capital mineira será comprometi­do com a mineração na área. A licença concedida à empresa compreende parte de Nova Lima, na região metropolit­ana de Belo Horizonte – a serra tem face para os dois municípios.

DEBATE.

Logo após a licença ser concedida à Tamisa, neste ano, e os questionam­entos à outorga na Justiça, Zema saiu em defesa da empresa. Ele comparou a Tamisa a uma pessoa que compra um terreno para construir uma casa, mas não consegue erguer o imóvel porque o governo não autorizou. “Acho que você ficaria muito indignado, porque, se você fez tudo certo, de boa-fé, e está cumprindo a lei, por que eu não vou dar autorizaçã­o para você construir a sua casa?”, afirmou o governador na ocasião. Procurado na semana passada, ele não quis comentar.

Principal adversário de Zema na disputa de outubro, Kalil disse ao Estadão que “quem toma conta de mineradora é governo”. “Estamos em um Estado em que quem toma conta é a própria mineradora. Enquanto não tivermos um governo em Minas Gerais para tomar conta da mineração, que é muito importante para o Estado, vai continuar essa bagunça”, disse o ex-prefeito de Belo Horizonte. “A mineração vai continuar matando e degradando Minas Gerais.”

Pré-candidato do PSDB ao governo de Minas Gerais, Marcus Pestana também criticou a exploração na região. “A iniciativa é equivalent­e a autorizar mineração no Morro da Urca ou no Pão de Açúcar, no Rio”, disse Pestana, que foi deputado e secretário-geral do Ministério do Meio Ambiente.

Outros pré-candidatos também entraram no debate sobre a mineração na Serra do Curral – Carlos Viana (PL), Lorene Figueiredo (PSOL) e Renata Regina (PCB) se manifestar­am contra a medida.

Primeiro pré-candidato ao Palácio do Planalto a se posicionar contrário à mineração na área, Ciro Gomes (PDT) afirmou ontem que “a Serra do Curral é pulmão, história e paisagem” de Belo Horizonte. “Junto-me aos que defendem este patrimônio ecológico e cultural e em breve estarei em BH para um ato em defesa deste santuário”, disse Ciro em uma rede social após visitar a comunidade Terra Nossa, na zona leste da capital mineira.

PARALISAÇíO.

Em nota, a Tamisa informou que “cumpriu todas as exigências da legislação vigente para a obtenção das licenças nos órgãos competente­s”. De acordo com a Secretaria Estadual do Meio Ambiente, 41 hectares de Mata Atlântica serão devastados na primeira fase do projeto. Seis hectares estão em área de preservaçã­o. Outros 58 hectares ainda devem ser devastados em uma segunda etapa do empreendim­ento, cuja licença final ainda não foi aprovada.

“Essa questão (da mineração na Serra do Curral) é populista. Um discurso voltado para dividir, e não para a reflexão.”

Patrícia Boson

Ambientali­sta

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WASHINGTON ALVES / ESTADÃO - 3/5/2022 Serra do Curral, na região metropolit­ana de BH; mineração na área se tornou tema de campanhas

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