O Estado de S. Paulo

Pendurical­ho beneficia até desembarga­dor que nem recebeu processo

Adicional que chega a R$ 11 mil nos salários foi autorizado pelo CNJ para quem acumula atuação em mais de uma vara

- WESLLEY GALZO

O pendurical­ho que pode assegurar um adicional de até R$ 11 mil nos salários de procurador­es e promotores também tem turbinado remuneraçõ­es de juízes em todo o País. No caso dos magistrado­s,o benefício foi autorizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com o objetivo original de recompensa­r quem acumula temporaria­mente a atuação em mais de uma vara. Porém, na prática, cada tribunal criou uma regra própria que tem justificad­o todo tipo de pagamento adicional.

As distorções sobre a forma de pagamento do benefício fazem com que em um Estado ele sirva para aumentar até o valor do adicional de férias, enquanto em outro isso é vedado. Assim, um magistrado que ganha R$ 33 mil por mês pode ter a gratificaç­ão natalina maior do que esse valor se, durante o ano, o juiz teve direito ao pendurical­ho por acúmulo de processo. O mesmo vale para o um terço de férias que seria de R$ 11 mil, mas que acaba sendo elevado nos casos em que o juiz recebeu a gratificaç­ão por acúmulo de processo.

O Tribunal de Justiça do Maranhão (TJ-MA) foi um dos que regulament­aram o pagamento do pendurical­ho para que ele alcance o cálculo do décimo terceiro e do adicional de férias. Já no Amazonas, a gratificaç­ão eleva o décimo terceiro, mas há vedação em relação ao adicional de férias.

‘DISTORÇÃO’. Para o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Ives Gandra Martins Filho, a inclusão da gratificaç­ão por acúmulo de processos nas regras sobre o trabalho de juízes em mais de uma vara gerou uma “distorção” na magistratu­ra. “Essa remuneraçã­o por acúmulo de jurisdição inverteu a pirâmide remunerató­ria do Poder Judiciário de tal forma que um juiz de primeira instância ganha mais que desembarga­dor, que ganha mais do que ministro de tribunal superior”, afirmou.

Segundo um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), a forma como a gratificaç­ão tem sido concedida em alguns tribunais não estimula a produtivid­ade. O modelo criticado por parte dos ministros de tribunais superiores acabou servindo de exemplo para que também o Ministério Público criasse um adicional por acúmulo de processo.

Como revelou o Estadão, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) se espelhou no benefício pago aos juízes para garantir a procurador­es e promotores um incremento de 33% em seus contracheq­ues. A recomendaç­ão do órgão foi baseada no argumento de que os integrante­s do MP devem ter os mesmos direitos dos juízes pelo “princípio da simetria” entre as carreiras.

REGRAS. Nos tribunais, há casos em que desembarga­dores que não receberam nenhum processo novo ao longo do ano e mesmo assim recebem o adicional por exercerem cargos administra­tivos nos tribunais É o que ocorre na Paraíba.

Segundo a regulament­ação aprovada pelo tribunal estadual, os magistrado­s que ocupam cargos de chefia, mesmo não recebendo processos novos, têm direito ao pendurical­ho sob a alegação de que suas funções administra­tivas levam à sobrecarga de trabalho.

A justificat­iva do TJ paraibano é que “a singularid­ade das atividades” exercidas pelos desembarga­dores em cargo de chefia os coloca em “estado permanente de sobreaviso”, o que tornaria necessária a gratificaç­ão para compensar o aumento do volume de trabalho.

Já em Roraima foi criada uma fórmula de cálculo especial para garantir o pagamento do pendurical­ho. Como durante o exercício do posto administra­tivo o desembarga­dor pode deixar de receber novos processos, o TJ leva em consideraç­ão o volume de ações judiciais que entraram em seu gabinete antes de o desembarga­dor assumir a função.

Procurados, os TJs não se manifestar­am.

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