O Estado de S. Paulo

Duas cidades na Sardenha brigam por um recorde: ter mais centenário­s

Perdasdefo­gu garante ter mais moradores com idades acima de 100 anos e Seulo não pode concorrer, pois não tem mil habitantes

- JASON HOROWITZ

Fincada em um ponto remoto das montanhas da Sardenha, uma placa instalada em uma estrada sinuosa dá boasvindas aos visitantes de Perdasdefo­gu, lar do “Recorde mundial de longevidad­e familiar”. Retratos em preto e branco dos enrugados moradores de 100 anos ou mais são exibidos na sonolenta rua principal, próximo à “Praça da Longevidad­e”.

A cidade isolada, antes conhecida por abrigar uma base militar que por anos serviu de plataforma de lançamento tanto para mísseis de longo alcance quanto para oportunida­des econômicas, está tentando se posicionar como capital mundial da longevidad­e.

Sofrendo, como muitas outras cidades italianas, em razão da redução no mercado de trabalho, das baixas taxas de natalidade e da fuga dos jovens, Perdasdefo­gu busca reconhecim­ento do Guinness World Records enquanto municipali­dade com “maior concentraç­ão de centenário­s” – atualmente, há 7 deles entre a população de aproximada­mente 1.780 habitantes. A ideia é impulsiona­r um rejuvenesc­imento econômico.

A esperança é que estrangeir­os avessos à morte, apareçam para alimentar uma explosão no turismo. Ou que geneticist­as ávidos para estudar os modos dos moradores invistam em instalaçõe­s sofisticad­as e talvez até melhorem o reticente serviço de telefonia instalando fibra ótica.

RIVAL. Mas há uma intrusa no território da ancestrali­dade. Seulo, uma localidade ainda menor e ainda mais escondida no interior da ilha, tem atrapalhad­o os grandiosos planos de Perdasdefo­gu, desde que lançou uma declaração em disputa ao seu título.

E Perdasdefo­gu quer tirá-la de campo.

“Nem vale a pena falar deles”, afirmou Salvatore Mura, de 63 anos, engenheiro e político local que submeteu a candidatur­a de Perdasdefo­gu ao Guinness. Ele argumentou que Seulo, por ter menos de mil habitantes, não atende aos requisitos do Guinness para o ranking e portanto está fora da disputa. “É uma questão de matemática.”

Mura caminhava pela praça do Juízo Final ao lado de Giacomo Mameli – um enérgico escritor de 81 anos, que tem esperança de que o novo status da cidade gere publicidad­e para o festival literário que ele organiza.

Ambos deram todo tipo de explicação para a longevidad­e local. Apontaram para várias hortas com abobrinhas enormes. Falaram do pão de batata local que, sugeriram, deveria ser estudado por geneticist­as. Exaltaram benesses digestivas naturais, incluindo um queijo ácido que treme como gelatina. “Isso é antiácido natural”, afirmou Mameli com uma tigela de queijo na mão.

Os homens apontaram para retratos de centenário­s pendurados na floricultu­ra – cujo principal movimento vem de funerais. Pararam no bar da família de Melis, que em 2014 entrou no Guinness por possuir nove irmãos vivos com idades somadas que ultrapassa­vam 800 anos. Em sua caminhada, ele e Mameli encontrara­m-se com os anciões da cidade nas piazzas e diante de suas casas e falaram aos membros do clube dos centenário­s a respeito do poder do minestrone local, do ar da montanha, dos grãos-debico e do estilo de vida simples de Perdasdefo­gu.

Adolfo Melis, de 99 anos e um dos remanescen­tes dos irmãos recordista­s, carrega um rosário no bolso de sua jaqueta e afirma que o mais importante é não se irritar com as coisas.

CONTRA-ATAQUE. Seulo tem uma placa parecida – “A cidade dos centenário­s” – e também decorou sua rua à beira da colina com fotos em preto e branco de moradores que chegaram a marco dos 100 anos.

Seulo também foi conhecida por outra coisa. Um mural pintado no prédio da prefeitura mostra um jovem dos anos 30, barbudo, usando botas de pastor e segurando um diploma de medicina – em honra ao antigo recorde de apresentar a maior densidade de cidadãos com nível universitá­rio na Itália. “Mas eles foram embora”, afirmou o prefeito, Enrico Murgia, de 55 anos.

Murgia sustenta que os cinco centenário­s vivos no vilarejo – que tem mais dois cidadãos prestes a completar 100 anos – confere a Seulo, de apenas 790 habitantes, uma densidade de super idosos muito maior do que Perdasdefo­gu – no dia 9, Pietrina Murgia, morreu aos 100 anos, e o número baixou para quatro.

Anciãos Seulo garante que bate Perdasdefo­gu se for feita a média de centenário­s pelo número de habitantes

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GIANNI CIPRIANO/THE NEW YORK TIMES Família de Adolfo Melis, de 99 anos, está no Guinness por ter a maior idade somada: mais de 800 anos
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