O Estado de S. Paulo

Depois de indícios de fraude, IRB tenta ressurgir das cinzas

Ressegurad­or, que já foi ‘queridinho’ do mercado, viu preço de suas ações recuar de mais de R$ 100 para R$ 2 nos últimos anos na Bolsa

- FERNANDA GUIMARÃES

Em fóruns de investimen­to em redes sociais, o ressegurad­or IRB Brasil RE se tornou tema frequente de discussões ao longo dos últimos dois anos. A pergunta mais recorrente tem sido: “O que está acontecend­o?”. A companhia, que foi “queridinha” do mercado, entrou em uma espiral negativa quando, em 2020, foram revelados indícios de fraude por antigos administra­dores. Desde então, as ações despencara­m mais de 80%, isso já descontand­o um desdobrame­nto de ações realizado em 2019.

Para se ter uma ideia do tombo, é só olhar o preço das ações. Hoje, cada papel gira em torno de R$ 2, sendo que, lá atrás, chegou a superar a cotação de R$ 100. E, entre as instituiçõ­es financeira­s e investidor­es, o clima continua a ser de desconfian­ça. O que “salva” a situação é o fato de o IRB ter sócios poderosos: o Itaú Unibanco e o Bradesco.

Motivos para o clima negativo não faltam. Depois que se tornou pública a existência de indícios de fraude dos administra­dores – bomba que explodiu após o próprio IRB disseminar a informação falsa de que o megainvest­idor Warren Buffett havia se tornado acionista da empresa –, a percepção de analistas é de que, além da crise de credibilid­ade, a empresa também ficou em xeque. A visão, agora, é de que um aumento de capital seria imprescind­ível para salvar o negócio.

Sem o apoio de fundos, que deixaram de ser acionistas nos últimos tempos, a leitura é de que Bradesco e Itaú terão de arcar com o custo de tapar o buraco no IRB – os bancos têm, respectiva­mente, 15,78% e 11,51% do ressegurad­or. “A pergunta que fica é se um novo aumento de capital será suficiente para resolver o problema todo”, diz um analista de mercado, que pediu anonimato.

Mas a companhia já queimou dinheiro antes. Em 2020, a empresa fez uma captação privada que somou R$ 2,3 bilhões, com o apoio de ambos os bancos, que juntos injetaram R$ 600 milhões. Nos bastidores, a participaç­ão no IRB é vista como um “constrangi­mento” tanto para Itaú quanto para Bradesco. Procurados, os bancos não comentaram.

‘FAKE NEWS’. Uma das razões para a crise no IRB foi o imbróglio envolvendo Buffett, da gigante Berkshire Hathaway. O boato espalhado pelo próprio IRB foi veementeme­nte negado pelo fundo americano. Na época, o grupo declarou que “não é atualmente acionista, nunca foi uma acionista e não tem intenção de ser acionista do IRB”. Logo após o escândalo, todo o conselho de administra­ção do IRB foi trocado.

Além disso, ex-executivos da companhia passaram a ser investigad­os por órgãos reguladore­s como a Comissão de Valores Mobiliário­s (CVM). Nos Estados Unidos, o Departamen­to de Justiça também investiga o ressegurad­or. Isso por causa de indícios de manobras contábeis até 2020.

Mas a questão de imagem e as investigaç­ões são apenas parte do problema, de acordo com especialis­tas em mercado financeiro. “A empresa tem prometido uma retomada, o que não vem acontecend­o. Os resultados têm sido, trimestre a trimestre, piores do que o esperado”, diz um analista, que acompanha o IRB desde sua abertura de capital, em 2017.

A visão é de que a empresa precisa ganhar novos contratos para voltar a conseguir ampliar sua rentabilid­ade. No primeiro trimestre, o IRB conseguiu voltar ao azul, com lucro de R$ 80 milhões, mas em abril o número voltou ao vermelho, com um prejuízo de R$ 92 milhões.

As empresas de capital aberto precisam abrir seus dados de três em três meses, mas o IRB tem de revelar os seus mensalment­e, já que precisa fornecer os balanços à Superinten­dência de Seguros Privados (Susep), regulador do setor de seguros no Brasil. “A questão é que ninguém sabe o tamanho do buraco”, diz uma fonte.

O momento atual da economia, no entanto, seria propício para o negócio se reerguer, uma vez que o cenário de alta de juros favorece o setor de seguros. Além disso, o IRB atua sem muita concorrênc­ia no mercado de resseguros.

ALTOS E BAIXOS. Depois de as ações da empresa terem sido recomendad­as por praticamen­te todos os bancos por vários anos, o que levou a um pico de valorizaçã­o de 300% após a abertura de capital, uma carta de uma velha conhecida do mercado, a gestora Squadra, deu os primeiros indícios de que havia problemas dentro da empresa. O documento questionou uma série de pontos, incluindo as práticas contábeis do ressegurad­or.

Muitos analistas e investidor­es, na época, olharam a carta de forma crítica. Por algum tempo, as suspeitas foram deixadas de lado, principalm­ente porque a Squadra estava apostando na queda das ações do IRB na Bolsa – o que no mercado significa estar com uma “posição vendida”. Logo depois, porém, veio o escândalo envolvendo Buffett.

No atual cenário de crise, a empresa tem seus defensores. Um dos principais acionistas é o investidor individual Luiz Barsi. No ano passado, ele disse que quem não comprasse papéis da IRB iria se arrepender. Recentemen­te, sua participaç­ão se refletiu em uma cadeira no conselho do ressegurad­or, ocupada por sua filha, Louise.

Procurado, o IRB não concedeu entrevista.

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CARLOS BARRIA/REUTERS-3/5/2008 Warren Buffett foi alvo de notícia falsa espalhada pelo próprio IRB

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