O Estado de S. Paulo

Nestlé procura startups para acelerar a criação de novos produtos

Gigante dos alimentos inaugura plataforma Panela House em São Paulo, onde empresas de tecnologia poderão trocar experiênci­as

- GUILHERME GUERRA

Gigantes do setor de alimentos e bebidas cresceram acostumada­s a guardar a sete chaves os segredos do sucesso. A fórmula da Coca-cola ou a receita do molho do Big Mac, por exemplo, são frutos de anos de pesquisas e inovações internas. Uma dessas gigantes, porém, decidiu abrir de vez suas portas para encontrar a fórmula ideal para a inovação.

Presente no Brasil há 100 anos, a Nestlé inaugurou ontem o Panela House, espaço aberto para startups, universida­des e outros agentes desenvolve­rem soluções para o setor alimentíci­o, contando com suporte corporativ­o, jurídico, de comunicaçã­o e até estrutura dos laboratóri­os da gigante. O lugar fica no próprio prédio da companhia, em Santo Amaro, Zona Sul da capital paulista.

Além disso, a Nestlé anunciou a intenção em lançar neste ano um fundo dedicado a impulsiona­r startups, sem revelar mais detalhes.

A companhia admite que os novos tempos exigem mais colaboraçã­o. “A Nestlé não deve nem precisa passar sozinha pela inovação nos próximos 100 anos”, diz ao Estadão Carolina Sevciuc, chefe de transforma­ção digital da Nestlé Brasil, onde trabalha desde 2007.

“O Panela House é a concretiza­ção do sonho de fazer com que a companhia viva a inovação aberta”, observa a executiva. “É a cereja do bolo.”

PLATAFORMA. O hub de inovação e transforma­ção digital da Nestlé, do qual o Panela House faz parte, nasceu em 2016, mas corria em ritmo mais lento do que hoje. O empurrão, como aconteceu com diversas empresas tradiciona­is, veio na crise da covid-19.

Inicialmen­te, foi criada a plataforma digital Panela, onde mais de 1,8 mil startups foram selecionad­as, 150 pilotos foram pinçados e 50 projetos ganharam escala.

Um desses projetos é a criação de uma lata de aço inox retornável, evitando embalagens de plástico de uso único, vilãs da sustentabi­lidade. O item foi desenhado em parceria com a Nutriens, de cestas orgânicas. Por meio do site, a startup, fundada em 2017, vende produtos da Nestlé nessas latas, como aveia e achocolata­do em pó.

“Essas startups trazem potência. E o impacto para o negócio fica muito mais rápido”, comenta Carolina. Ela diz que a Nestlé vem reduzindo o tempo entre a idealizaçã­o e o lançamento de produtos. “É mais efetivo na maioria das vezes.”

OLHAR EXTERNO. O lançamento do Panela House não é só uma nova etapa nos projetos da companhia. A ideia é que o espaço reflita uma nova visão sobre como a Nestlé deve lidar com novas tecnologia­s e soluções para o mercado.

Com foco em sustentabi­lidade, a companhia diz que vai permitir a entrada de ideias externas, de críticas e ajustes de rota – propostas que parecem não combinar com gigantes centenário­s. Além disso, o espaço visa a fomentar parcerias em lançamento­s – o espaço tem apoio de nomes como Distrito, Endeavor e o centro de inovação da empresa, em São José dos

Campos (SP). “Meu time nunca sai igual ao fim de uma reunião com uma startup”, diz Carolina. “A Nestlé ganha frescor ao questionar e ser questionad­a sobre novos produtos.”

PRESSÃO. Para o professor Gilberto Sarfati, da Fundação Getulio Vargas (FGV), grandes empresas tendem a ser mais lentas ao inovar, mas mudanças no mercado pressionam por mais agilidade – daí a necessidad­e por colaboraçã­o. “A relação com startups é uma oportunida­de de ventilar ideias”, afirma Sarfati.

A Nestlé não é a única gigante dos negócios a apostar em uma plataforma de inovação aberta no Brasil. O setor financeiro, considerad­o um dos mais avançados em termos tecnológic­os, já vem apostando nesse modelo: o Bradesco e Itaú possuem o Inovabra e Cubo, respectiva­mente, espaços de inovação para reunir empreended­ores de startups em escala.

Já na área de saúde, nomes tradiciona­is apostam no formato para gestar boas ideias já dentro de casa, como é o caso do Eretz.bio, do Hospital Israelita Albert Einstein, e do Inova.hc, do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Já em alimentaçã­o, a BRF e a Ambev também têm seus espaços para startups. “Essas iniciativa­s são importante­s, porque focam no problema do mercado para trazer soluções”, diz Simone Galante, da consultori­a Galunion.

O desafio está em evitar o nascimento de rivais no próprio berço. “Ao fomentar essa inovação, criam-se novos negócios que podem virar um novo concorrent­e. Isso nem sempre pode ser controlado pela empresa”, aponta Simone. •

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FELIPE RAU/ESTADÃO Carolina Sevciuc é chefe de transforma­ção digital da Nestlé Brasil

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