O Estado de S. Paulo

‘Não há espaço para cortar juro no 1º semestre de 2023’

Economista avalia que patamar de 13,75%, ‘talvez um pouco mais’, será mantido na primeira metade do ano Ex-presidente do BC, Gustavo Loyola é doutor em Economia pela FGV e sócio da Tendências Consultori­a

- MÁRCIA DE CHIARA

Desafio Loyola acha difícil que o próximo governo consiga interrompe­r o pacote de bondades

Ex-presidente do Banco Central (BC), Gustavo Loyola vê pouco espaço para que a autoridade monetária comece a cortar juros no primeiro semestre do ano que vem. Se a política fiscal “fosse mais responsáve­l”, o economista acredita que o BC poderia iniciar um relaxament­o da política monetária na primeira metade de 2023.

“Estou pessimista em relação à existência de algum tipo de espaço para o BC iniciar uma queda de juros antecipada”, afirmou Loyola ao Estadão. Independen­temente do candidato que ganhar as eleições presidenci­ais, o economista vê a política fiscal em xeque em 2023. Ele acha difícil que o próximo governo consiga interrompe­r o pacote de bondades previsto para terminar em 31 de dezembro e diz que uma série de pressões orçamentár­ias irá se agravar um pouco no ano que vem. Entre elas, os reajustes de salários do funcionali­smo público. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Como o sr. está vendo o cenário doméstico e internacio­nal em relação à última reunião do Copom?

As incertezas continuam. O ambiente doméstico muito tensionado, expectativ­as sobre o 7 de Setembro (com possíveis manifestaç­ões políticas), questões eleitorais. A aprovação desse pacote de bondades eleitorais, que já era esperado e se materializ­ou, também é negativo. No cenário externo, vemos a continuida­de da guerra (entre Rússia e Ucrânia), um quadro em que a inflação continua preocupand­o e aumentam os riscos de recessão nos Estados Unidos. A notícia boa é que houve queda no preço do petróleo e retomada das exportaçõe­s de alimentos pela Ucrânia. Fundamenta­lmente, o quadro não mudou muito e continua bastante desafiador. Não há melhora sensível e também não houve piora que possa levar o BC a acelerar alta de juros.

Qual é a herança para 2023 de juro básico próximo do pico, combinado com os estímulos fiscais que estão sendo dados?

Na questão monetária, acho que o cenário mais provável é que o BC não tenha espaço para reduzir juros durante o primeiro semestre de 2023. Acredito que esse patamar de 13,75%, talvez um pouquinho mais, será mantido.

Por quê?

O processo de queda da inflação ocorre de maneira mais lenta e o BC precisa se assegurar de que ela vá convergir para a meta, não tanto em 2023, mas em 2024. Se a política fiscal fosse mais responsáve­l, acho que poderia abrir espaço para o BC iniciar um relaxament­o monetário mais cedo. Mas acho muito difícil que isso ocorra.

Quais seriam as razões? Embora parte desse pacote de bondades tenha sido carimbado como temporário até o final do ano, acho que é muito difícil que seja revertido, tanto na continuida­de da gestão Bolsonaro quanto se o Lula for eleito. Por outro lado, as pressões do funcionári­os públicos por aumento vão crescer. Há uma série de pressões orçamentár­ias que parece que irá se agravar um pouco no ano que vem. Não vejo espaço para uma melhora fiscal em 2023. Acredito que possa piorar. Estou pessimista em relação à existência de algum tipo de espaço para o BC iniciar uma queda de juros antecipada.

Quais os impactos de uma política fiscal frouxa e de juros altos na economia real? Os impactos fundamenta­lmente são cresciment­o mais baixo e crédito mais apertado. A inflação continuará caindo, mas lentamente. Com os juros mais altos por mais tempo e o crédito racionado e difícil, a economia cresce pouco. A nossa projeção de cresciment­o para o ano que vem é bastante magra. Crescer 0,5% já seria acima do esperado.

Quais são os fatores de risco para os próximos meses? No cenário doméstico, são as eleições e seus desdobrame­ntos. Nesta parte não estou falando especifica­mente de quem será eleito. Estou falando dessa tensão institucio­nal, desse questionam­ento sobre a segurança das urnas e uma eventual não aceitação do resultado. Isso pode gerar um resultado bastante negativo para o País. O Brasil vai ser visto cada vez mais como uma república de bananas. O segundo risco tem a ver com o programa de governo de quem for eleito. Esses dois riscos maiores afetam a taxa de câmbio e dificultam a queda da inflação. Do lado externo, os desdobrame­ntos da guerra continuam e a questão da recessão americana e a política monetária dos Estados unidos que eventualme­nte podem repercutir negativame­nte no Brasil. •

 ?? TENDÊNCIAS CONSULTORI­A INTEGRADA-13/4/2022 ??
TENDÊNCIAS CONSULTORI­A INTEGRADA-13/4/2022

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil