O Estado de S. Paulo

Papa Francisco reduz autonomia do Opus Dei

Para especialis­tas, ideia é promover integração de grupos diferentes nas dioceses; prelado não poderá usar anel episcopal

- GONÇALO JUNIOR

As reformas divulgadas ontem pelo papa Francisco que reduzem a autonomia e a independên­cia formal da congregaçã­o Opus Dei pretendem agir também sobre polos de concentraç­ão de poder dentro da Igreja Católica e promover integração entre grupos diferentes nas dioceses. Essa é a análise de estudiosos sobre o documento papal Ad carisma tuendum (Para tutelar o carisma).

O Opus Dei havia sido elevado em 1982 pelo papa João Paulo II à categoria de prelazia pessoal, ou seja, uma parte da Igreja estruturad­a de modo hierárquic­o, com um prelado (dirigente), sacerdotes e diáconos. Esse privilégio, único no mundo, equiparava a congregaçã­o a uma diocese, embora ela não tivesse um território específico. O papa mudou o status do prelado, que não será mais distinguid­o com o cargo de bispo e não poderá usar anel ou veste episcopal. A partir de agora, seu título será “protonotár­io apostólico supernumer­ário”.

Pelo documento, a medida pretende que a forma de governo do Opus Dei seja “baseada mais no carisma do que na autoridade hierárquic­a”. Carisma pode ser entendido como o próprio espírito e o DNA da instituiçã­o, que deve estar acima dos cargos formais.

REAÇÃO. Francisco Borba Ribeiro Neto, coordenado­r do Núcleo Fé e Cultura da Pontifícia Universida­de Católica (PUC/SP), observa que as mudanças sobre o Opus Dei fazem parte de um processo para aumentar a colegialid­ade e diminuir a influência dos polos de concentraç­ão de poder. “Dentro dessa lógica, as mudanças retiram do prelado a posição de bispo, o que leva à necessidad­e de uma integração maior da organizaçã­o como um todo com os bispos diocesanos”, afirma o professor.

Essa é a mesma avaliação de Rodrigo Coppe, professor do programa de pós-graduação em Ciências da Religião da PUC Minas. “É uma tentativa de tirar autonomia do grupo.”

Neto observa, no entanto, que a maior dificuldad­e dentro das dioceses não é de ordem formal, mas sim de capacidade de articulaçã­o de grupos diferentes. “Em geral, os participan­tes e simpatizan­tes do Opus Dei já vivem uma integração com suas dioceses. Onde as dioceses têm essa capacidade de articulaçã­o, o Opus Dei já se mostra integrado. Onde as dioceses não têm essa capacidade, a mudança formal terá pouco efeito prático.”

Além da mudança no status do prelado, o Opus Dei passará a se reportar ao Dicastério para o Clero, divisão administra­tiva da Cúria Romana que analisa temas relacionad­os a padres e diáconos e supervisio­na a educação religiosa dos católicos. A instituiçã­o também deverá apresentar um relatório anual sobre o “desenvolvi­mento de seu trabalho apostólico”. Até agora, a Obra, como também é conhecido o Opus Dei, só tinha de entregar um documento semelhante a cada cinco anos à Congregaçã­o para os Bispos, órgão do Vaticano a que estava vinculado. •

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