O Estado de S. Paulo

A Europa caiu numa armadilha

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Diretor do Centro Brasileiro de Infraestru­tura (CBIE)

Acrise pela qual passa o setor de energia, em particular na Europa, está levando os governos a assumirem políticas intervenci­onistas e estatizant­es. Os erros cometidos pelas políticas energética­s europeias nos últimos anos vieram à tona com a pandemia e se acentuaram com a guerra entre Rússia e Ucrânia. Os governos, influencia­dos e pressionad­os por movimentos ambientali­stas, acabaram ficando reféns das energias renováveis intermiten­tes e do gás natural russo. Agora a conta chegou.

Os preços dos combustíve­is aumentaram e trouxeram inflação, elevação da taxa de juros e, o pior, a possibilid­ade de racionamen­to no próximo inverno. Diante deste quadro, uma solução que a Europa vem adotando são políticas de subsídios e o aumento da participaç­ão do Estado em empresas de energia.

Na Alemanha, o governo anunciou a compra de 30% da empresa Uniper, que é a maior importador­a de gás russo no país e foi fortemente afetada pela alta nos preços dos combustíve­is e a redução do fornecimen­to do gás vindo da Rússia. A ideia é que o governo alemão injete liquidez na empresa.

A compra de 30% da empresa vai custar US$ 15,28 bilhões.

Estado investidor trará de volta perda de eficiência, desperdíci­o do dinheiro público e a velha prática populista

A justificat­iva do primeiro-ministro alemão é que a Uniper é de grande importânci­a para o desenvolvi­mento econômico da Alemanha e sua segurança energética. O curioso e que chama a atenção é que o acionista majoritári­o da Uniper é o governo finlandês. Ou seja, a Uniper passa a ser uma grande estatal.

Na França, esse movimento também está acontecend­o, e o governo já anunciou a reestatiza­ção da EDF. Isso vai custar US$ 9,8 bilhões por cerca de 15% da empresa. A justificat­iva da primeira-ministra da França: “Confirmo a vocês que o Estado pretende controlar 100% da EDF. Isso permitirá reforçar sua capacidade de levar a cabo projetos ambiciosos e imprescind­íveis o mais rapidament­e possível para o nosso futuro energético”.

O que estamos vendo é um alinhament­o dos dois principais países da comunidade europeia na tentativa de assegurar o abastecime­nto de energia com gás natural e energia nuclear, que, na nova taxonomia da comunidade, passaram a ser considerad­as energias verdes.

Depois de apostarem todas as fichas nas energias renováveis em nome da transição energética, a Alemanha e a França trazem de volta para a mesa a questão da segurança energética e a necessidad­e de preços de energia mais competitiv­os.

Para atender a esses dois requisitos, e assustados com a perda de popularida­de e com a real possibilid­ade de um racionamen­to no próximo inverno, apelam para uma política que traz de volta o Estado como investidor, passando a conta para o contribuin­te, e não para o consumidor de energia. Mas o pior é que essa decisão trará de volta perda de eficiência, desperdíci­o do dinheiro público e a velha prática populista. O fato é que a Europa caiu numa armadilha e, para sair, está entrando numa maior ainda. •

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