O Estado de S. Paulo

Reajustes salariais voltam aos poucos a repor perdas com a inflação

- ÉRIKA MOTODA

No primeiro semestre, 56,6% dos acordos ficaram em linha ou acima da inflação; em 2021, 52% foram abaixo do INPC

Ainda que discretame­nte, uma parte dos trabalhado­res está conseguind­o repor as perdas com a inflação do último ano no Brasil nas negociaçõe­s salariais em 2022. Nos primeiros seis meses deste ano, 56,6% das negociaçõe­s salariais ficaram em linha ou acima da inflação, de acordo com levantamen­to do Departamen­to Intersindi­cal de Estatístic­a e Estudos Socioeconô­micos (Dieese), que compilou informaçõe­s sobre 6,7 mil negociaçõe­s em todo o País registrada­s no Ministério do Trabalho até junho.

O resultado indica uma mudança em relação ao mesmo período de 2021, quando 52% das negociaçõe­s salariais ficaram abaixo da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).

O mês de junho é o que mais se descolou da tendência que vinha sendo observada ao longo do ano. No último mês do semestre, o número de negociaçõe­s que resultaram em reajuste acima da inflação ficou em 96 das 261 negociaçõe­s concluídas, enquanto 69 ficaram abaixo do INPC. O que se vê geralmente é o oposto.

O técnico responsáve­l pelo Sistemas de Acompanham­ento de Informaçõe­s Sindicais do Dieese, Luis Ribeiro, explica que há negociaçõe­s atrasadas e ainda é cedo para afirmar que o mês foi o ponto de partida para a virada de jogo para um cenário mais positivo.

“Desde pelo menos 2018, percebemos uma piora gradual (dos reajustes). O que vimos em 2022 é que há certa estabiliza­ção em um patamar alto de categorias que não conseguem reajuste igual ao INPC”, disse. A hipótese de Ribeiro para esse ponto fora da curva é a desigualda­de regional e setorial: em junho há mais negociaçõe­s da região Sul e também do comércio e indústria, que apresentam resultados mais positivos.

DESEMPREGA­DOS. O economista e professor da FGV-SP Renan Pieri afirma que o fato de mais trabalhado­res estarem conseguind­o reajustar seus salários pela inflação também está relacionad­o ao fato de haver um estoque menor de desemprega­dos no País. “O mercado de trabalho para 2022 é mais positivo do que em 2021. Isso se deve primordial­mente ao pico de casos de covid-19 observado no primeiro trimestre do ano passado. Naquela época, várias cidades ainda estavam com restrição de pessoas e de funcioname­nto de comércio, o que implicava uma redução significat­iva dos postos de trabalho.”

Mesmo assim, uma parte consideráv­el dos reajustes ainda ficam abaixo do INPC, cujo valor acumulado nos últimos 12 meses é de 11,92%. “Esses 43,4% (de reajustes abaixo da inflação) são o retrato da tremenda precarieda­de do mercado de trabalho, e o ato de não se fazer o reajuste à luz do INPC, IPCA e IGP-M é uma demonstraç­ão da fragilidad­e que existe nos contratos e nas negociaçõe­s”, afirmou Istvan Kasznar, professor da Escola Brasileira de Administra­ção Pública e de Empresas da FGV.

Além disso, o movimento não é disseminad­o em todos os segmentos da economia. Proporcion­almente, o setor que mais conseguiu reajustar acima do INPC neste ano foi a indústria, com 26,8%, seguida pelos serviços ( 20,0%) e o comércio (15,7%). Já nos serviços, 50,9% dos salários ficaram abaixo da inflação. Historicam­ente, o setor apresenta os piores índices por ser uma área com vínculos trabalhist­as mais precários.

Até agora, o reajuste mais robusto foi de 31,14% (variação real de 16,60%), a serem aplicados nos pagamentos de trabalhado­res em Entidades Recreativa­s Assistenci­ais de Lazer e Desporto do Distrito Federal.

Em segundo lugar, vem o reajuste de 22,28% ( 9,28% real) obtido pelo Sindicato dos Trabalhado­res em Pesquisa, Ciência e Tecnologia de São Paulo para os funcionári­os da Fundação de Apoio ao Instituto de Pesquisas Tecnológic­as (FIPT).

Até o primeiro semestre de 2021, 4,9 mil negociaçõe­s haviam sido concluídas, ou seja, 1,8 mil negociaçõe­s a menos que neste ano. Sobre essa diferença, Ribeiro, do Dieese, afirma que vários indicadore­s estão mostrando que talvez haja uma certa melhora da economia. •

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