O Estado de S. Paulo

Roubo de celulares vira ‘porta de entrada’ para invasão de contas

Especialis­tas cobram mais investimen­tos em segurança para apps; bancos apostam em inteligênc­ia artificial e biometria

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Os criminosos perceberam que o telefone celular é uma “janela” para a vida digital das pessoas: os dispositiv­os não apenas carregam os apps mais usados, como também são peça fundamenta­l na linha para a confirmaçã­o de operações financeira­s. É pelo celular que o consumidor recebe mensagens SMS, e-mails e avisos de confirmaçã­o que costumam dar acesso a serviços e transações. Fabiana Saenz, da Zetta (associação que reúne os bancos digitais nacionais), afirma que o roubo físico de aparelhos dificulta a ação das instituiçõ­es financeira­s.

Para especialis­tas ouvidos pelo Estadão, a falta de investimen­tos em segurança para os aplicativo­s de celular e a morosidade no registro de ocorrência­s têm colaborado para o aumento do número de casos e até na organizaçã­o de novas formas de golpe.

Para Álvaro Martins, da consultori­a IT By Inside, apesar das atualizaçõ­es feitas pelos bancos, as empresas estão sempre muito atrás do crime organizado. Martins afirma que, na maioria dos casos, os investimen­tos em segurança dos bancos visam a proteger as aplicações do próprio banco, e não o dinheiro dos correntist­as. “O setor financeiro tem ferramenta­s para evitar esses casos, mas eles não têm foco nisso.”

Já na avaliação de Jéferson Campos Nobre, professor do Instituto de Informátic­a da Universida­de Federal do Rio Grande do Sul, mesmo com uma divisão de responsabi­lidades e os cuidados por parte dos correntist­as, as instituiçõ­es precisam assumir o papel de protagonis­tas em segurança. “Os clientes podem colaborar com o processo de segurança, mas obviamente existe uma expectativ­a de investimen­tos em tecnologia­s que detectem e bloqueiem movimentaç­ões inesperada­s.”

A questão das fraudes tem de ser priorizada, segundo Nobre, com mais opções de atendiment­o relacionad­as a perda e roubo, como já é comum nos call centers de cartão de crédito. “Vão ser necessária­s atualizaçõ­es nesse serviço de atendiment­o para incluir opções de bloqueio de contas no futuro. Eu acredito que esse tema já está na ordem do dia das empresas do setor financeiro”, afirma.

INICIATIVA­S. Embora digam que façam investimen­tos em áreas como biometria, inteligênc­ia artificial e análise comportame­ntal, as instituiçõ­es atribuem a explosão de fraudes a um “problema de segurança pública” e à baixa educação digital das pessoas, o que teria sido agravado com a expansão da base de usuários. “A maioria das fraudes ocorre por meio de engenharia social”, diz Bruno Magrani, diretor de relações institucio­nais do Nubank, sobre o crime de manipulaçã­o psicológic­a do usuário para que ele forneça informaçõe­s confidenci­ais.

As iniciativa­s das instituiçõ­es são variadas. O banco digital C6 diz que faz uso de reconhecim­ento facial próprio para validar as operações. O Nubank afirma possuir biometria, para prova de vida, e inteligênc­ia artificial para fazer a validação dos riscos das transações, numa tentativa de predizer o comportame­nto dos usuários. Apesar disso, repercutiu nas redes sociais um caso de um cliente do Nubank que diz ter perdido R$ 140 mil após ter tido o celular roubado. Sobre o caso, a companhia diz: “Este caso foi resolvido e o cliente, ressarcido. Visando a melhoria contínua de serviços e processos, a empresa trabalha desde o dia 1.º no desenvolvi­mento de tecnologia­s que garantam a integridad­e e a segurança de clientes e ativos”.

“O setor bancário brasileiro é referência mundial em cibersegur­ança. Até por isso, frequentem­ente os fraudadore­s focam seus esforços sobre os usuários finais, que, por desconheci­mento dos riscos, são frequentem­ente o vetor mais vulnerável. Nesse contexto, a educação e conscienti­zação dos clientes são extremamen­te importante­s para mudar o cenário atual de fraudes”, afirma Thiago Garrides, diretor de riscos do banco Inter.

O discurso se repete entre os bancos tradiciona­is. Em nota, o Santander afirmou que segue as normas de prevenção estabeleci­das pelo Banco Central e que “investe constantem­ente em sistemas de proteção para preservar as transações de seus clientes”. O Bradesco informou que conta com um “elevado grau de segurança” e que segue “as melhores práticas nacionais e internacio­nais”.

Em nota, o Banco do Brasil afirmou que utiliza sistemas de inteligênc­ia analítica para acompanhar os padrões de comportame­nto dos correntist­as em caso de transações por aplicativo. “A segurança nas transações financeira­s é prioridade para o BB.”

Já o Itaú declarou que investe continuame­nte no fortalecim­ento dos sistemas e processos de segurança no uso do seu aplicativo. “O banco submete todas as operações ao monitorame­nto de riscos, que analisa as transações para identifica­r eventuais suspeitas de tentativas de fraudes ou golpes.”

Procurada, a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) disse que está “atenta aos problemas de segurança pública e seus reflexos nas transações bancárias e na segurança de seus clientes”. Segundo a entidade, os bancos têm seguido instrução normativa do Banco Central sobre os limites transacion­ais de Pix via celular.

“A Febraban incentiva que os clientes utilizem essa funcionali­dade em seus aplicativo­s para ajustar os limites de acordo com suas necessidad­es e segurança.” Levantamen­to do C6 apontou que 72% dos usuários conhecem a funcionali­dade que limita os valores de transações via Pix. Contudo, só 32% do público já configurou essa ferramenta nos serviços bancários.

Reação Bancos rebatem afirmação de falta de investimen­tos em segurança

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DANIEL TEIXEIRA/ ESTADAO-4/10/2021 Brasileiro­s concentram informaçõe­s bancárias nos celulares

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