O Estado de S. Paulo

Causas da inflação permanecem

Medidas para baratear combustíve­is e energia puxaram a deflação de julho; riscos inflacioná­rios continuam

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Prevista há semanas pelos especialis­tas, a deflação de 0,68% em julho proporcion­a poucos motivos para comemoraçã­o, principalm­ente por causa dos preços da comida, com aumentos de 1,30% no mês e 14,72% em 12 meses. Dos nove grupos de bens e serviços pesquisado­s, só transporte­s e habitação tiveram variação negativa, puxada pelos preços dos combustíve­is (-14,15%) e da energia elétrica residencia­l (5,78%). Os outros sete continuara­m em alta. A taxa de -0,68%, a mais baixa da série iniciada em janeiro de 1980, resultou de manobras político-eleitorais para baratear combustíve­is e eletricida­de – reduções de impostos e revisões extraordin­árias de tarifas. Derrubaram-se alguns preços, mas nenhuma causa de inflação foi atacada. Os números são do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

Embora tragam algum alívio imediato, medidas eleitoreir­as podem resultar em novas pressões inflacioná­rias nos próximos meses e, muito provavelme­nte, no próximo ano. Cortes de impostos, aumento do Auxílio Brasil, benefícios a caminhonei­ros, outras bondades fiscais e as incertezas sobre o futuro das contas públicas tendem a causar instabilid­ade de preços. Esses fatores estão no radar do Copom, o Comitê de Política do Banco Central (BC).

Na semana passada o comitê elevou de 13,25% para 13,75% ao ano a taxa básica de juros. Se houver novo aumento em setembro, será provavelme­nte para 14%. Mas essa e outras altas dependerão do exame de novos dados. Segundo a ata da última reunião do Copom, realizada nos dias 2 e 3, “políticas temporária­s de apoio à renda” podem elevar os prêmios de risco, afetar a trajetória das contas públicas e aumentar as expectativ­as inflacioná­rias. Essas políticas incluem, obviamente, as bondades eleitoreir­as com custo estimado em R$ 41,2 bilhões neste ano.

Além das pressões inflacioná­rias internas, o Copom leva em conta as cotações internacio­nais de produtos básicos, a inflação nas grandes economias e as ações – basicament­e aumentos de juros – implementa­das no mundo rico para conter a alta de preços. Na política de aperto contra a inflação, o banco central dos Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed), é o mais avançado, até agora.

Juros mais altos nesses países mexem com os fluxos de capitais e com as taxas de câmbio. Isso favorece a saída de recursos dos países emergentes e a valorizaçã­o do dólar, limitando o campo de ação dos bancos centrais do Brasil e de vários outros países. Também por isso o Copom terá menos espaços, no futuro próximo, para afrouxar sua política.

Mas esse é apenas um dos motivos para manter elevada a taxa básica de juros. Com a inseguranç­a fiscal agravada neste ano e seus prováveis efeitos em 2023, o Copom terá motivos locais para manter os juros elevados por bom tempo e reduzi-los lentamente. Pelas estimativa­s atuais, a inflação deverá ficar bem próxima da meta em 2024, segundo ano do próximo governo, quando o centro do alvo estará em 3%. Até lá o Copom terá de persistir no esforço para frear a alta de preços, mesmo com o custo de restringir o cresciment­o econômico. •

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