O Estado de S. Paulo

Legislatur­a termina com concentraç­ão inédita de poder em Lira e Pacheco

- DANIEL WETERMAN

Além de o Congresso atual ter criado o orçamento secreto, presidente­s das Casas centraliza­m pauta das medidas provisória­s

O atual Congresso encerra a legislatur­a com mais uma marca. Além de ser o que mais alterou a Constituiç­ão desde 1988 e o que mais manejou recursos da União, com a criação do orçamento secreto, também é o que mais concentrou poderes nas mãos dos presidente­s da Câmara e do Senado, algo sem comparação com outros 11 países democrátic­os.

Desde 1988, os congressis­tas brasileiro­s desenharam um modelo altamente centraliza­do das decisões do Parlamento. O que significa que um pequeno grupo formado pelos dirigentes da Câmara e do Senado e os líderes partidário­s tomam decisões pelo todo. Essa organizaçã­o explica a frustração de muitos parlamenta­res de primeiro mandato que atuam como coadjuvant­es.

Sob os comandos do deputado Arthur Lira (Progressis­tasal) e do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o poder decisório ficou ainda mais concentrad­o. A agenda é elaborada pelos dois dirigentes sem a concordânc­ia do colégio de líderes e projetos passaram a ser votados no plenário pulando a discussão nas comissões, onde debates são aprofundad­os.

Uma das mudanças promovidas pelo Congresso atual que aumentaram a concentraç­ão de poder nas mãos da cúpula ocorreu nas medidas provisória­s. Esse tipo de norma é assinada pelo presidente da República e entra em vigor imediatame­nte, mas precisa do aval do Congresso para se tornar lei.

MP. Historicam­ente, as MPS foram usadas pelos presidente­s para comandar a pauta legislativ­a. No governo de Jair Bolsonaro (PL) elas se desidratar­am. Antes, as propostas passavam por comissões e trancavam a pauta da Câmara e do

Senado, entrando na frente de outros projetos, se não fossem votadas. Após a pandemia de covid-19, as comissões sofreram apagão e as medidas começaram a ser analisadas diretament­e no plenário, ficando nas mãos do presidente da Câmara dar o pontapé da análise ou engavetar o texto. Só em 2021, 31 normas assinadas por Bolsonaro perderam eficácia. Há dez anos, foram três.

Mesmo com um protagonis­mo maior, o Brasil ainda não está entre aqueles países onde o Legislativ­o tem o monopólio para produzir as leis, como

Chile, Estados Unidos e México, e onde o Orçamento votado pelos parlamenta­res é blindado de cortes do Executivo, situação verificada nos EUA, no Peru e na Turquia. Os americanos e turcos têm um poder ainda maior e aprovam até mesmo os secretário­s (o equivalent­e aos nossos ministros).

O Congresso se aproxima do Legislativ­o de outros sete países com autonomia financeira, poder de convocar membros do Executivo e fiscalizar o governo federal. Estão na lista Argentina, Chile, Colômbia, EUA, México, Peru e Turquia. •

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