Ciência tenta entender as preferências musicais
Segundo estudos, traços de personalidade e de como pensamos podem ajudar a prever o gosto musical das pessoas
Você já se perguntou por que ama uma determinada música ou um gênero musical? A resposta pode estar em sua personalidade, embora outros fatores também desempenhem um papel importante, de acordo com cientistas.
Muitas pessoas tendem a formar sua identidade musical na adolescência, na mesma época em que exploram sua identidade social. As preferências podem mudar com o tempo, mas pesquisas mostram que as pessoas tendem a gostar especialmente de música desde a adolescência e se lembram de músicas de um período específico de idade – 10 a 30 anos com um pico aos 14 – com mais facilidade.
O gosto musical é frequentemente identificado por gêneros preferidos, mas uma maneira mais precisa de entender as preferências é por atributos musicais, segundo os pesquisadores. Um modelo descreve três dimensões de atributos musicais: excitação, química e profundidade.
“A excitação está ligada à quantidade de energia e intensidade na música”, diz David M. Greenberg, pesquisador da Universidade Bar-Ilan e da Universidade de Cambridge. Gêneros musicais punk e heavy metal, como White Knuckles, da banda Five Finger Death Punch, são altamente excitantes, segundo um estudo conduzido por Greenberg e outros pesquisadores.
“A química é um espectro de emoções negativas a positivas”, admite ele. Músicas animadas de rock e pop, como Razzle Dazzle, de Bill Haley & Seus Cometas, eram de alta química. A profundidade indica “um nível de complexidade emocional e intelectual”, conta Greenberg. “Descobrimos que a música do rapper Pitbull seria baixa em profundidade e música clássica e jazz podem ser considerados de alta profundidade.”
Além disso, os atributos musicais têm relações interessantes entre si. “Alta profundidade está frequentemente relacionada à baixa química, então a tristeza na música também está evocando uma profundidade nela”, analisa. Preferimos músicas de artistas com personalidades com as quais nos identificamos. “Quando as pessoas ouvem música, estão sendo motivadas pela semelhança do artista com elas mesmas”, explica o pesquisador.
BOWIE E GAYE. Em seu estudo de 2021, os participantes classificaram os traços de personalidade dos artistas usando o modelo Big 5: Abertura, Consciência, Extroversão, Amabilidade e Neuroticismo (Ocean), que é a tendência a experimentar facilmente emoções negativas ante eventos comuns. Para os entrevistados, David Bowie demonstrou alta abertura e neuroticismo, enquanto Marvin Gaye mostrou alta amabilidade. “A correspondência entre a personalidade do ouvinte e o artista foi preditiva das preferências musicais do artista além dos atributos da música”, lembra Greenberg.
Traços de personalidade podem prever o gosto musical das pessoas, de acordo com os cientistas. Em estudo de 2022, Greenberg e seus colegas descobriram que, apesar das diferenças socioculturais, os participantes de todo o mundo apresentavam traços de personalidade que estavam correlacionados com sua preferência por certos gêneros de músicas ocidentais. A extroversão, por exemplo, estava ligada à predileção pela música contemporânea animada e a abertura à preferência por estilos sofisticados ou cerebrais.
Nossos estilos cognitivos e como pensamos também podem ajudar a prever que tipos de música podemos gostar. Um estudo de 2015 de Greenberg e colegas distingue entre os sistematizadores e os empáticos – pessoas que entendem o mundo por meio de pensamentos e emoções versus os interessados em regras e sistemas. “Os empáticos tendem a preferir a tristeza na música, enquanto os sistematizadores querem mais intensidade”, garantiu Greenberg. “Muitos profissionais de TI e de ciência de dados têm alto nível de sistematização e também preferem música intensa.”
Além disso, tanto os empáticos quanto os sistematizadores ouvem música com alta profundidade, mas os empáticos preferem atributos que representam profundidade emocional, e os sistematizadores preferem atributos que representam profundidade intelectual e complexidade técnica.
Enquanto a personalidade pode ser um determinante de nossas preferências musicais, outro fator pode ser o contexto. Minsu Park e seus colegas identificaram padrões temporais na escuta – as pessoas tendem a ouvir música relaxante à noite e com mais energia durante o dia. “Essa flutuação é quase idêntica, independentemente de sua localidade cultural e outras informações demográficas”, esclarece Park, professor-assistente de pesquisa social e políticas públicas da Universidade Nova York em Abu Dabi.
Há, no entanto, uma distinção básica entre pessoas de diferentes culturas. Na América Latina, a tendência é ouvir “músicas mais excitantes em comparação com outras regiões” e, na Ásia, a opção é por “músicas mais relaxantes do que em outras regiões do mundo”, completa Park.
Idade e gênero também estão ligados a certos tipos de música. Os mais jovens tendem a gostar de música intensa ao contrário dos mais velhos, aponta a pesquisa de Greenberg. Ouvintes de música suave são mais propensos a serem mulheres e os de música intensa, homens ocidentais.
IDADE E TENDÊNCIA. Há também tendências etárias em como as pessoas se envolvem com a música. Estudo de 2013 que examinou dados de duas pesquisas com mais de um quarto de milhão de indivíduos mostrou que “os jovens ouvem música com mais frequência do que adultos de meia-idade e em uma ampla variedade de contextos, enquanto adultos escutam música principalmente em contextos privados”.
A personalidade pode influenciar nosso gosto musical, mas é importante notar que alterações nesse gosto não indicam mudança na personalidade. Mesmo que mudemos o que ouvimos, implicitamente permanecemos as mesmas pessoas. “Um introvertido pode mudar com o tempo, mas, em última análise, seu núcleo e sua base serão a introversão”, conclui Greenberg.
Identidade
‘Preferimos músicas de artistas com personalidades com as quais nos identificamos’