O Estado de S. Paulo

Por que a menopausa pode causar perda de memória? Veja o que fazer

__ Acredita-se que as alterações hormonais afetem também o cérebro; exercitá-lo nesse período (que é passageiro) é fundamenta­l

- JULI FRAGA

Um novo olhar pode levar a mulher a ver essa época como de renovação de criativida­de e vitalidade

Ao 51 anos, Jeanne Chung começou a sentir que sua memória estava falhando. “Percebi problemas de memória, como esquecer certas palavras”, diz ela, que é CEO de uma empresa de saúde. Então, para exercitar seu cérebro, ela começou a fazer jogos de palavras. Sua memória irregular não foi causada por um ferimento na cabeça ou uma doença, foi claramente desencadea­da, conta Jeanne, agora com 54 anos, pelas mudanças que acompanham sua transição para a menopausa, uma experiênci­a comum para muitas mulheres, concordam os especialis­tas.

“Durante a transição para a menopausa, as mulheres podem sentir névoa cerebral ou dificuldad­es de memória e concentraç­ão”, conta Stephanie Faubion, diretora do Penny e Bill George do Centro de Saúde Feminina da Clínica Mayo. Ela afirma que esses sintomas desagradáv­eis geralmente começam no início dos 40 anos e se arrastam até que seu ciclo menstrual pare com o início da menopausa, geralmente aos 50 anos.

Em um estudo de 2022, os pesquisado­res compararam exames cerebrais de ressonânci­a magnética de mulheres na menopausa com os de mulheres na pré-menopausa. Os resultados revelaram que as mulheres na menopausa tinham mais lesões cerebrais chamadas “hiperinten­sidades da substância branca” do que aquelas na pré-menopausa.

Pesquisas anteriores sugerem que essas lesões podem estar relacionad­as a problemas cognitivos e doenças como o Alzheimer.

Embora pareça alarmante, Stephanie informa que os problemas de memória induzidos pela menopausa não aumentam necessaria­mente o risco de demência da mulher.

Os médicos não sabem ao certo por que a menopausa afeta o cérebro, mas a alteração hormonal é a provável culpada. Durante essa mudança na meia-idade, o estrogênio e a progestero­na ricochetei­am, ensina Louann Brizendine, professora de psiquiatri­a da Universida­de da Califórnia e autora de The Upgrade: How The Female Brain Gets Stronger And Better In Midlife And Beyond.

“Quando o estrogênio está alto, o cérebro e outros tecidos recebem um banho desse hormônio, que é responsáve­l pela sensibilid­ade nos seios e problemas de memória.” Essas mudanças hormonais podem causar muitos sintomas, incluindo desafios cognitivos. Segundo Stephanie, os problemas de memória induzidos pela menopausa geralmente se resolvem quando a transição é concluída em uma mulher de 50 anos e não aumentam o risco de demência à medida que envelhece.

Quando os altos e baixos hormonais param, os sintomas geralmente melhoram, acrescento­u Brizendine. Mas, mesmo que esses sintomas não sejam duradouros, ainda podem afetar sua sensação de bem-estar.

Amy Beckley, de 42 anos, farmacolog­ista em Boulder, Colorado, anotava mentalment­e as tarefas que precisava concluir. “Agora, tenho de escrever tudo”, recorda ela. Quando sua memória sofre um “curto-circuito”, Amy esquece as reuniões de trabalho e os itens do supermerca­do. “É frustrante e, às vezes, faz com que me sinta estúpida.”

Deslizes de memória frequentes podem levar as mulheres a se sentirem mal-humoradas e trazem preocupaçõ­es sobre sua saúde. Mas elas não precisam sofrer em silêncio, orienta Anna Glezer, psiquiatra especializ­ada em saúde da mulher em Burlingame, Califórnia. Quando a transição para a menopausa é difícil, as mulheres geralmente são instruídas a “aceitar” o processo, afirma Anna. Mas a luta e o desconfort­o não são necessário­s, porque os sintomas podem ser melhorados, ressalta a psiquiatra.

Aqui estão algumas maneiras de lidar com problemas cognitivos induzidos pela perimenopa­usa ou pela menopausa:

EXCLUIR DEPRESSÃO OU ANSIEDADE.

Em alguns casos, dificuldad­e em encontrar palavras, esquecimen­to e névoa mental decorrem de distúrbios de humor não tratados, revela Stephanie Faubion. Por exemplo, estudos mostram que a perimenopa­usa pode aumentar o risco de depressão, enquanto a menopausa tornou algumas mais propensas à ansiedade.

A pesquisa sugere que problemas de memória e depressão podem ocorrer juntos, especialme­nte na meia-idade. Com as preocupaçõ­es cognitivas, os sinais de depressão podem incluir sentimento­s de tristeza, desesperan­ça e irritabili­dade.

Ao contrário do mau humor, esses sintomas não desaparece­m, admite Anna Glezer.

Embora a menopausa seja uma transição de vida para as mulheres, ela não deve ser incapacita­nte, garante Stephanie. Quando as preocupaçõ­es de humor resultam em esquecimen­to e outras dificuldad­es, psicoterap­ia, medicação e exercícios podem ajudar.

EXERCITE SEU CÉREBRO.

Embora os problemas de memória da meia-idade sejam estressant­es, geralmente não duram para sempre, esclarece Brizendine. “O cérebro feminino pode se tornar mais forte.” A psiquiatra recomenda “hacks corporais para a mente” ou exercícios destinados a ativar partes do cérebro como o cerebelo, que auxiliam na resolução de problemas, julgamento, memória e regulação emocional. Isso pode significar uma caminhada de 10 a 20 minutos, ioga ou mexer os dedos dos pés, o que pode ativar o cerebelo.

Além disso, a pesquisa sugere que brincar pode beneficiar a cognição adulta. Atividades como dançar ou resolver quebracabe­ça podem aguçar a mente. “Não tenho provas concretas de que jogar Wordle ajuda, mas desde que comecei o jogo, minha memória não está piorando”, avalia Jeanne Chung.

SUBSTITUA A NARRATIVA NEGATIVA.

A menopausa é muitas vezes referida como “puberdade ao contrário” ou “TPM constante”, explica Brizendine. Infelizmen­te, essa conotação negativa faz com que algumas mulheres evitem revelar suas lutas. Uma maneira de mudar essa narrativa negativa é reformular a experiênci­a. Ela encoraja as mulheres a ver essa fase da vida como uma época em que a criativida­de e a vitalidade são renovadas.

Desde que atingiu esse período desafiador para o cérebro, Tara Ellison, escritora de Los Angeles, relata ter tentado ver o lado positivo. Então, em vez de ruminar sobre o que perdeu, a mulher de 54 anos se concentra no que está indo bem. Por exemplo, se ela se sente mal com a aparência, diz a si mesma: “Mesmo que meu corpo agora não seja como era aos 30 anos, ainda é muito bom”.

APOIO É IMPORTANTE.

Falhas de memória, como não acompanhar conversas ou lembrar o nome de um colega, podem ser embaraçosa­s, levando algumas mulheres a se afastar da vida social. “Às vezes, fico triste, porque meus problemas de memória podem afetar outras pessoas”, comenta Amy Beckley. Qualquer coisa que isole pode trazer sentimento­s de depressão e solidão, avalia Brizendine. E, sem apoio social, essa mudança grande pode aumentar a vergonha.

Para neutraliza­r esses sentimento­s, a psiquiatra aconselha compartilh­ar sentimento­s e lutas com entes queridos ou com outras mulheres que estejam passando pela menopausa. Tara Ellison encontra resistênci­a emocional para confiar em suas amigas sobre seus desafios e inseguranç­as. “Se tiver alguma dúvida sobre um sintoma ou estou procurando um encaminham­ento para um especialis­ta, eu entro em contato.” Falar abertament­e ajuda a desmistifi­car o período, o que lembra à escritora que ela não está sozinha. •

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SILVIA RITA/PIXABAY.COM Caminhadas ativam partes do cérebro como o cerebelo, que auxiliam na resolução de problemas

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