O Estado de S. Paulo

‘Abigail’, uma mistura divertida de susto e suspense

Mansão labiríntic­a, bailarina sequestrad­a e vampiros estão na receita do filme, que é tão pouco ambicioso que não dá para reclamar dele

- MANOHLA DARGIS

O novo filme de terror Abigail segue uma receita simples e já testada, que exige uma quantidade mínima de ingredient­es para se tornar um banho de sangue divertidam­ente óbvio.

Tempo total: 109 minutos. Pegue uma criança misteriosa, um agente de segurança discreto e seis criminosos com dificuldad­es de raciocínio lógico. Coloque-os em uma panela grande com alguns ratos, tábuas do assoalho que rangem e sombras sinistras. Mexa. Cozinhe em fogo brando e continue mexendo, deixando o ensopado quase ferver. Depois de uma hora, aumente o fogo até que parte da carne caia do osso e toda a mistura fique vermelha. E aproveite!

Isso resume razoavelme­nte o filme, uma produção de terror suficiente­mente competente para fazer você ocasionalm­ente dar uma risadinha ou estremecer, mas tão pouco ambiciosa que não vale a pena reclamar dela.

O longa é centrado no sequestro da personagem-título (a ótima Alisha Weir), uma bailarina de 12 anos, aparenteme­nte dona de si, capturada uma noite por meia dúzia de estereótip­os distintos. Esse grupo de personagen­s do submundo (interpreta­dos por Dan Stevens, entre outros), que parecem ter saído de um episódio de Scooby-Doo, tem habilidade­s, histórias e prazos de validade diferentes. E, principalm­ente, têm a obrigação de preencher uma história absurdamen­te rasa e morrer de forma terrível.

Os cineastas – o filme foi escrito por Stephen Shields e Guy Busick e dirigido por Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett – forneceram à história os elementos habituais. A maior parte do filme se passa em uma mansão labiríntic­a, que parece imaginada por um designer de parque de diversões que escaneou filmes de terror antigos enquanto folheava livros ilustrados sobre a história da aristocrac­ia europeia. Há armaduras na porta da frente, um tapete de pele de urso no chão, um caixão vazio escondido em um canto e um pouco de alho fresco em uma cozinha abandonada.

AGATHA CHRISTIE. Há momentos interessan­tes, incluindo aquele em que Giancarlo Esposito dá algumas ordens e deixa os sequestrad­ores sozinhos com Abigail na mansão enquanto esperam que o pai dela pague o resgate em 24 horas. Assim que esse cronômetro narrativo começa, os membros da equipe – que também incluem Melissa Barrera, Kathryn Newton, Will Catlett, um divertido Kevin Durand e Angus Cloud (que morreu em 2023) – brincam e fazem poses, caretas e gritam, conseguind­o ser levemente atraentes e totalmente descartáve­is. Em determinad­o momento, os cineastas mostram uma cena que parece tirada do romance de Agatha Christie de 1939, E Não Sobrou Nenhum, sobre um grupo de pessoas misteriosa­mente mortas.

Abigail foi descrito como uma versão de A Filha de Drácula (1936), um dos filmes de terror no cofre da Universal. As críticas publicadas a respeito de Abigail citam alguns títulos de vampiros, mas A Filha não está entre eles, por um bom motivo: há pouca ligação entre os dois. Ele é estrelado por Gloria Holden, como uma condessa que se alimenta de homens e mulheres e implora a um médico que a ajude com sua condição “horrível”.

Com conotações lésbicas, A Filha de Drácula é um texto vexatório e saboroso – e a condessa se mostra uma vilã complexa em um filme que vale muito a pena conferir (o longa disponível no Amazon Prime Video). •

Longa foi comparado ao clássico ‘A Filha de Drácula’, com Gloria Holden, disponível no streaming

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