O Estado de S. Paulo

Indecência

- elena.landau@eusoulivre­s.org ADVOGADA E ECONOMISTA

Oministro Alexandre Silveira anunciou, com toda pompa, que finalmente saiu o acordo entre Brasil e Paraguai para Itaipu. Foi decidido um aumento nas tarifas para US$ 19,28/kW, e o Brasil vai assumir US$ 900 milhões do plano de investimen­to da usina para “compensar” um reajuste menor que o pedido pelos paraguaios. A parte boa ficou para 2027: as tarifas passam a refletir custos operaciona­is, devendo cair para US$ 10, e o excedente de energia será comerciali­zado no mercado livre, mais um ganho para o ACL. Só que não tem nada firmado ainda. O passado de negociaçõe­s com o Paraguai não dá razão para otimismo.

O MME diz que a elevação de 15,4% não terá impacto sobre as contas de luz. Claro que tem. Deixa de repassar o ganho com o fim do pagamento da dívida, principal componente do custo, o que levaria a tarifa para menos de US$ 12. O governo brasileiro ignorou os consumidor­es cativos brasileiro­s. Seu verdadeiro objetivo é usar a folga nas tarifas para gastar. Há anos que Itaipu investe onde não deve, usando como desculpa a licença para apoiar projetos de impacto socioeconô­micos, que deveriam estar localizado­s em sua área de influência. Ano passado, quase atingiram US$ 1 bilhão, em empreendim­entos questionáv­eis.

Não por acaso, o acordo sai após Lula anunciar que Itaipu vai repassar R$ 1,3 bilhão para a COP-30 em Belém!

O acordo sobre Itaipu veio em tom de vitória, mas é uma derrota para os consumidor­es

Para um país que coloca o Amapá na região da Codevasf (Companhia de Desenvolvi­mento do Vale do São Francisco), incluir o Pará na área de influência de Itaipu não chega a surpreende­r.

No Rio Grande de Sul, uma tragédia afeta a vida de milhares de pessoas. Faria muito mais sentido investir na recuperaçã­o das cidades atingidas, além dos gastos necessário­s para a reconstruç­ão de sua infraestru­tura.

Mas tanto COP-30 quanto verbas para o RS não são despesas a serem financiada­s por tarifas, e, sim, pela União.

O anúncio veio com tom de vitória. Na verdade, é uma derrota para os consumidor­es de energia que, mais uma vez, vão pagar a conta. E quem não deveria ganhar, ganhou: o Paraguai, umas centenas de milhões por ano; e o governo brasileiro, para gastar recursos fora do Orçamento. Mais uma vez, acha um atalho para fugir de restrições das já combalidas regras fiscais.

Pretendia mudar de assunto nesta semana e fugir do tema energia elétrica. Mas o MME não dá trégua. Pensei em comentar o show da Madonna, que deixou os conservado­res tão revoltados. Não sei por onde andaram nos últimos 40 anos. Indignados com sua ousadia, postavam os tais vídeos “indecentes”. Indecência mesmo é esse acordo para Itaipu. •

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