Pais & Filhos

Com Thiago Queiroz

Um papo honesto e aberto sobre como agimos ao longo de 2020, em busca de desconstru­ção

- Thiago Queiroz Pai de três, educador parental, autor do livro “Abrace Seu Filho”, criador do Paizinho, Vírgula e embaixador da Pais&Filhos

Não sei se você percebeu, mas junto com o isolamento social, fomos bombardead­os o ano inteiro com novos desafios e metas, justamente porque estávamos em casa. Cursos online gratuitos, lives de crossfit, tudo porque deveríamos aproveitar a quarentena para nos qualificar e “entrar em forma”, sem contar os livros que todo mundo estava lendo e a produtivid­ade elevadíssi­ma no trabalho. Ufa! Eu realmente não fui dos mais eficientes. Ganhei alguns quilos, não li centenas de livros, não ouvi mil podcasts, não fiz cursos online e definitiva­mente não fui o suprassumo da produtivid­ade no trabalho. Com três filhos em casa e sozinho com a minha companheir­a, eu já me dava por vitorioso se eu conseguiss­e terminar o dia com a cozinha minimament­e limpa e sem ter gritado com os meus filhos.

Por outro lado, esse ano foi bem interessan­te para mim, no que diz respeito à minha própria masculinid­ade. Talvez por estar isolado de tantas pessoas, pude aproveitar alguns momentos para olhar para dentro com mais atenção. Você sabe, né? Se existe algo que nós, homens, não fazemos, é olhar para dentro. Olhar para os sentimento­s, mais difícil ainda. Externá-los então? Jamais!

São anos, décadas, ouvindo que homem tem que ser forte, que sentimento­s são coisas de pessoas fracas, que vulnerabil­idade é coisa de “mulherzinh­a”. Foi então que, DURANTE ESSE PERÍODO DE QUARENTENA, PUDE OLHAR

PARA OS SENTIMENTO­S DE CARINHO E

AMIZADE QUE EXISTEM DENTRO DE MIM, e perceber que eu, apesar de amar algumas pessoas muito queridas, raramente dizia a elas sobre o que eu sentia. Especialme­nte se essas pessoas fossem homens.

Não vou dizer que foi extremamen­te fácil, porque ainda há muito machismo enraizado aqui dentro, mas senti uma enorme satisfação de conseguir enviar para alguns amigos, mesmo que em mensagens privadas no WhatsApp, mensagens como:

– Ei, cara, queria dizer que eu te amo, viu?

Era só isso que eu queria dizer mesmo.

Para minha total surpresa e alegria, ouvi alguns “eu te amo” de volta. PODE PARECER BOBO, MAS CONSIDERAN­DO QUE OS

HOMENS NÃO SÃO ENSINADOS A AMAR E

A SE DEIXAREM AMAR DESDE CRIANÇAS, eu acho que esse é um passo fundamenta­lmente transforma­dor. Mas, de longe, o que foi mais profundo para mim foi o dia em que eu me olhei no espelho do banheiro, ao final de um dia especialme­nte difícil com as crianças, me sentindo extremamen­te exausto e culpado por tudo o que eu fiz – ou não consegui fazer – e disse para mim mesmo:

– Ei, cara, eu te amo, viu?

Anote aí, a transforma­ção dos homens virá pelo afeto.

"Se existe algo que nós, homens, não fazemos, é olhar para dentro"

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