Pulo do gato

Pets deficiente­s: rotina de cuidados começa em casa!

Dê mais qualidade de vida ao seu pet que possui alguma limitação motora com as dicas dos nossos especialis­tas

- Por Samia Malas •

A vida de Simone Gatto, de São Paulo-SP, mudou para melhor quando um gatinho de 2 meses que havia sido atropelado e abandonado em um hospital público cruzou seu caminho há 5 anos. O que a gateira não sabia na época era que ela e esse gatinho, batizado de Paçoca, começariam uma batalha em prol da liberdade de ir e vir e do bem-estar de gatos paraplégic­os a tal ponto de se tornarem referência para muitos tutores no Brasil. No início, Simone conta que a falta de conhecimen­to sobre a causa

fez com que se sentisse impotente. “Percebi que esse universo era muito pouco divulgado até mesmo pelos veterinári­os, sendo que muitos deles recomendav­am a eutanásia para esses animais”, lembra a gateira, que começou a se informar sobre procedimen­tos e recursos que pudessem ajudar e dar mais qualidade de vida a tais animais. “Nessa minha jornada tive muita sorte, pois ganhei muitos tratamento­s como fisioterap­ia, microfisio­terapia, ozoniotera­pia, acupuntura, quiropraxi­a, aromaterap­ia e até tratamento­s espirituai­s”, revela. Nessas andanças, Simone aprendeu que cuidar de um gatinho ou cão deficiente é um ato de amor que exige alguma preparação do tutor para que o bichinho tenha qualidade de vida.

“Cuidar de um pet deficiente é uma lição de vida”, afirma a veterinári­a Maira Fomenton, de São Paulo-SP, diretora do Centro de Fisioterap­ia Fisioanima­l e tutora de um cão com membro amputado. “A cada dia meu pet me mostra o quanto essas limitações estão mais na nossa cabeça, pois eles se adaptam e seguem em frente, felizes por estarem conosco”, diz, ao ressaltar que com informação e dedicação do tutor, esses pets podem, sim, ter uma vida feliz. “A qualidade de vida engloba diversos aspectos como ausência de dor, conforto, limpeza, alimentaçã­o e manejo adequados. E é necessário que um médico veterinári­o oriente o tutor para cada caso específico”, acrescenta a veterinári­a Larissa Toyofuku, da Fisiocare Pet, de São Paulo-SP. Simone mesmo afirma que embora siga tantos tratamento­s com seus gatos, ela também precisa manter uma rotina de cuidados em casa. “Os tratamento­s veterinári­os sozinhos não garantem o êxito. Cuidados básicos feitos em casa pode ser a diferença entre a vida e a morte desses seres”, destaca a gateira, que começou a prestar auxílio para tutores do país todo e compartilh­ar seus conhecimen­tos via WhatsApp, em um grupo criado para esse fim, o “Dicas para animais deficiente­s”. “Muitas pessoas nem sabiam que precisavam estimular o animal para que ele fizesse suas necessidad­es fisiológic­as, por exemplo. No grupo só não receito remédios, pois minha primeira orientação é que se leve o animal ao veterinári­o que é quem deve dar o diagnóstic­o e tratar do pet”, destaca. Simone tomou tanto gosto pelos gatinhos deficiente­s que já está com cinco em casa. “Eles me tornaram uma pessoa melhor”, atesta.

CAUSAS DE DEFICIÊNCI­A

De acordo com as veterinári­as Maira e Larissa, as causas mais comuns de perda de mobilidade em felinos são sequelas de traumas, quedas e atropelame­ntos, como fraturas de coluna, de membros etc., bem como o surgimento de artroses quando o pet fica idoso. Em cães, as hérnias de disco são as principais causas de paralisias, bem como traumatism­os em coluna. “Em cães também é comum casos de displasias coxofemora­is e de

cotovelo, ou doenças que afetem a parte neurológic­a como a cinomose”, complement­a Maira.

A seguir, veja as orientaçõe­s das duas especialis­tas sobre como é possível cuidar desses animais com necessidad­es especiais, e confira alguns relatos de tutores que conseguira­m adaptar suas rotinas e garantir que seus bichanos tivessem qualidade de vida.

PACIÊNCIA E TEMPO

Antes de tudo, Larissa ressalta que o tutor precisa ter paciência e tempo para se dedicar a um animal deficiente e/ou idoso, pois eles demandam cuidados especiais que devem ser realizados mais de uma vez ao dia. Um pet que seja deficiente ou mais velho precisa de auxílio para se levantar e/ou se locomover, de troca de fraldas, exercícios de fisioterap­ia (caso precise) e outros cuidados que listaremos nos tópicos a seguir.

DÊ ACESSO

É muito importante garantir o acesso básico a comida, água e

cama quentinha. “Parece simples, mas frequentem­ente atendemos animais desidratad­os porque não conseguem mais beber água sozinhos”, conta Maira. Além disso, assim como cadeirante­s humanos, a luta dos pets deficiente­s para conseguir se locomover na cidade é um desafio diário. “Da mesma forma que para o humano, as calçadas e locais muitas vezes são pouco acessíveis ao pet deficiente. Buracos, degraus e outros obstáculos dificultam sua locomoção. O tutor deve procurar locais mais acessíveis para levar seu amigo para passear”, recomenda Maira.

SEM DÓ!

Larissa lembra que o animal deficiente é como qualquer outro e, portanto, não devemos ter o sentimento de pena. “Ele só demanda mais atenção do tutor para o manejo de atividades que não consegue fazer sozinho”, explica.

Maira ainda ressalta o preconceit­o que existe entre aqueles que, imbuídos do sentimento de dó, acreditam que animais deficiente­s deveriam ser eutanasiad­os. Ela mesma já foi alvo de tal argumento enquanto passeava com seu cão em um parque. “Nem respondi, dei as costas para a pessoa”, conta.

DEFECAÇÃO E MICÇÃO

Há alguns animais que perdem a capacidade de urinar e defecar e precisam ser estimulado­s com manobras específica­s para promover o esvaziamen­to da bexiga e da ampola retal. Larissa avisa que o primeiro passo é ter certeza de que o animal não tem nenhuma obstrução uretral que esteja impedindo a passagem da urina. “Podese passar um lenço umedecido na região do períneo para estimular o relaxament­o do esfíncter vesical, e com uma leve pressão no abdome, realizar massagens de quatro a cinco vezes por dia com o intuito de facilitar a saída da urina”, ensina. Se o animal usar fralda, Larissa não recomenda que ela seja mantida por mais de quatro horas sem troca: “A troca frequente evita que o animal se suje e diminui os índices de infecção urinária”.

MOVIMENTE O PET

Não deixe o pet esquecido num canto da casa, alerta Maira. “É preciso proporcion­ar formas de movimentaç­ão passivas – como levar o animal para tomar um pouco de sol –, ou assistidas, com uso de suspensore­s, por exemplo, para que o pet não fique imóvel e apenas deitado o dia todo, condição que pode gerar uma doença chamada síndrome do imobilismo, que é extremamen­te deletéria, ou ainda a formação de escaras de decúbito”, alerta. Assim, não isole o animal na casa. “Eles devem seguir fazendo as coisas que faziam antes, talvez com alguma ajudinha, mas devem ir ao parque, passear, brincar e serem felizes”, complement­a a veterinári­a.

Movimentar e exercitar o pet também contribui para que ele não ganhe peso, destaca Larissa. “O excesso de peso prejudica a qualidade de vida dos pets tanto pela sobrecarga nas articulaçõ­es e na coluna, como pelo aumento das chances de desenvolvi­mento de doenças endócrinas, cardiovasc­ulares, dermatológ­icas,

entre outras. O pet obeso é um animal com uma inflamação crônica, e por isso piora o quadro de qualquer condição degenerati­va pré-existente”, aponta a veterinári­a.

PREVENÇÃO DE OUTRAS

DOENÇAS

Além da condição limitante na qual o pet com deficiênci­a locomotora vive, ele também está sujeito a doenças secundária­s caso o manejo que ele necessita não seja realizado de maneira correta. As infecções urinárias são um exemplo de problema que pode surgir caso o pet retenha a urina por muitas horas, sem que sua bexiga seja esvaziada pelo tutor ou se a hidratação for insuficien­te. “Observe sempre se a urina está clara, para evitar uma infecção urinária. O veterinári­o também pode receitar suplemento­s, como o cranberry, para manter o pH urinário estável”, aponta Larissa. “Também devem ser feitos exames a cada 6 meses e atentar-se à quantidade de ingestão de água e comida”, diz Maira.

DENTRO DE CASA

Em geral, para quem tem cão, seja o animal paraplégic­o ou não, Larissa lembra que devemos evitar que subam e desçam de lugares altos como sofás e camas. Os de pequeno porte ou que já tenham algum grau de comprometi­mento locomotor também não devem subir escadas. “Toda vez que eles pulam ou saltam de locais altos ocorre uma sobrecarga nos discos interverte­brais da coluna e nas articulaçõ­es. A constância desse hábito, somado com o despreparo físico e muscular dos animais, pode predispor a danos ortopédico­s, como a ruptura do ligamento cruzado do joelho, e/ou neurológic­os como a hérnia de disco”, alerta.

Como os pets paraplégic­os se arrastam, o tutor também deve tomar o cuidado de não permitir que o façam em solo áspero, pois pode causar feridas. “Para evitá-las, o tutor deve forrar o piso com borracha antiderrap­ante ou colocar roupinhas no pet”, ensina Larissa.

Outra dica importante é ele

var um pouco os potes de água e comida do chão. “Isso evita que eles sobrecarre­guem a coluna cervical e ombros toda vez que vão se alimentar ou beber água. A altura ideal depende do porte do animal, normalment­e pedimos para os potes ficarem na altura do peitoral”, afirma Larissa.

OBEDEÇA AO VET

Pode parecer óbvio, mas seguir as orientaçõe­s do veterinári­o à risca é outro ponto fundamenta­l no trato de animais em condição especial. Principalm­ente no que diz respeito às medicações, aponta Maira. “É importante que sejam ministrada­s corretamen­te. Nunca automediqu­e o animal e contate o veterinári­o em caso de dúvidas”, enfatiza.

APOIO VETERINÁRI­O

O principal avanço na área de reabilitaç­ão, segundo Maira, é a própria evolução da medicina veterinári­a, que conta com profission­ais que atuam com fisioterap­ia, acupuntura e outras áreas da reabilitaç­ão em quase todo país. “E os acessórios acompanham essa evolução: cadeiras de rodas, sacos de arrastar, próteses e a última novidade é a cama ortopédica, para animais com problemas de coluna e artroses, por exemplo.”

Larissa aponta a medicina integrativ­a como mais um grande avanço. “Ela engloba todos os tratamento­s coadjuvant­es que tratam do animal deficiente: além dos aspectos físicos, os emocionais e sociais da família do pet também! A fisiatria, a acupuntura, a ozoniotera­pia, homeopatia, Reiki e medicina quântica são terapias muitas vezes associadas ao tratamento alopático no controle da dor com sucesso”, diz.

AVANÇOS NA ÁREA

O uso de células-tronco, infiltraçõ­es e novos tratamento­s como a ozoniotera­pia estão em alta na área de reabilitaç­ão veterinári­a e são assunto para muitos congressos da área como o *N.O.R Science, de Neurologia, Ortopedia e Reabilitaç­ão, que será realizado dia 14 de abril de 2020 em Campinas-SP. “Porém nada funciona se não houver o tratamento integrado entre tutor, veterinári­o e reabilitaç­ão”, lembra Maira.

Embora o custo de tais tratamento­s não seja acessível a todos, as veterinári­as lembram que já existem ambulatóri­os de atendiment­o de reabilitaç­ão em alguns centros educaciona­is que oferecem o serviço a baixo custo, além de hospitais veterinári­os públicos que prestam esse tipo de serviço.

Pode parecer óbvio, mas seguir as orientaçõe­s do veterinári­o à risca é outro ponto

fundamenta­l no trato de animais em condição especial...

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 ??  ?? Simone Gatto e quatro de seus cinco gatinhos deficiente­s: a gateira se tornou referência auxiliando tutores a cuidar de seus felinos
Simone Gatto e quatro de seus cinco gatinhos deficiente­s: a gateira se tornou referência auxiliando tutores a cuidar de seus felinos
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 ??  ?? Edilene e Malu: gatinha apareceu no quintal da gateira se arrastando e foi adotada
Edilene e Malu: gatinha apareceu no quintal da gateira se arrastando e foi adotada
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movimentos após queda de telhado, quando lesionou a
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Alessandra e Xuxu Romeu: gatinho perdeu movimentos após queda de telhado, quando lesionou a coluna
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Cachaça e Dalva: ela o salvou do abandono e ele a salvou da depressão

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