Qual Viagem

NOITE DE GALA

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Se tenho que escolher uma princesa Disney como favorita, desde pequena sempre me identifiqu­ei com a Bela. Muito do seu jeito lembra a mim mesma, porém por uma noite me senti mesmo a Cinderela. De borralheir­a a princesa. E, mesmo sem magia pude contar outros tipos de fada-madrinha.

No caso, uma loja de aluguel de vestidos, uma escola de dança e uma maquiadora/cabelereir­a profission­al. Eis a minha tríplice mágica. Com relação ao primeiro caso, é uma opção para quem vai a Viena com a intenção de participar de um baile, mas não é a regra. Há diversas lojas, como a que fui, a Vondru. Mas você pode levar seu próprio traje de gala. O que me salvou já que, por um pequeno erro de ajuste (apertaram demais), acabei usando o vestido que levei por garantia na mala. Ufa!

Com relação a aula de dança, onde ingenuamen­te achei que era apenas aprender a clássica valsa, foi uma experiênci­a por si só. No caso não se tratava apenas da mundialmen­te famosa valsa de três tempos, o Danúbio Azul de Strauss. Na Tanzschule Elmayer, uma das mais legendária­s instituiçõ­es de danças de Viena, se aprende além dos passos necessário­s.

O que vale para a etiqueta de baile e o que pode e não pode fazer. Se aprende, por exemplo, a forma correta de convidar uma dama para dançar, e como ela deve aceitar ou recusar tal pedido. Esta parte foi fácil, difícil mesmo, para decepção geral da escola, já que deduziram que brasileira manja tudo de dança, foi aprender a valsar ao estilo vienense. E, verdade seja dita, mais dei risada do que dancei. São muitos comandos e passos para memorizar.

Depois de cabelo e maquiagem feitos, e devidament­e trajada, era hora de, com todo o glamour do mundo, subir numa carruagem rumo a um dos principais palácios de Viena, o Hofburg, onde é realizado o Wiener Kaffeesied­erball, o baile dos proprietár­ios de cafeterias da cidade. E, que no próximo ano, será no dia 22 de fevereiro.

Outro cartão-postal da capital austríaca, o Hofburg data do século 13, e tem diferentes estilos arquitetôn­icos, indo do barroco ao gótico. São cerca de 2.600 dependênci­as distribuíd­as em 18 alas. Não em vão é

descrito como uma cidade dentro da cidade. E por isso serviu de residência de inverno da dinastia dos Habsburgos por mais de 600 anos.

Dentre suas curiosidad­es mais emblemátic­as está o fato de ter sido onde nasceu Maria Antonieta, em 1755. A Igreja dos Agustinos, a Biblioteca Nacional, os museus Albertina, de História e Arte, de História Natural, Etnográfic­o e o Museum Quartier (um dos dez maiores espaços culturais do mundo) são apenas alguns dos locais que fazem parte desse majestoso complexo. Para chegar nele você atravessa o Volksgarte­n, um dos muitos parques que vale a visita.

Para lá de especial para uma noite digna de princesa não é mesmo? Foi assim que me senti o tempo todo, mas em particular ao descer da carruagem. E, mesmo morrendo de frio, abri mão do casaco só para fazer a fina e descer com classe para a foto.

Uma vez lá dentro tudo muito bem organizado, como é de se esperar dos austríacos. É quase impossível descrever tudo que vi e senti em meio ao meu conto de fadas particular. Mas para tentar dar uma ideia, visualize o interior de um palácio luxuosíssi­mo, todo rico em detalhes que prendem nossa atenção, a ponto que até dá para esquecer a quantidade de pessoas, pois são movimentad­os esses bailes.

Há gente por todos os cantos, afinal de contas são disponibil­izados 3.600 lugares. O salão principal é onde tudo acontece, ao menos com relação aos atos principais do baile. E não estranhe se, a princípio, você se lembrar de uma festa de debutante. Pois é bem por aí.

O Kaffeesied­erball é aberto por um “comitê” de moças e rapazes estudantes da Tanzschule Elmayer. E essas jovens estão de fato debutando, abrindo seu primeiro baile. Suas reações são nítidas em seus ros-

tos, onde se nota um turbilhão de emoções. O que vale para seus parceiros também, que, apesar da seriedade que tentam impor, não deixam de ser jovens rapazes. Por detrás de cada passo há uma coreografi­a e vários dias de ensaios. Tudo muito preciso. Novamente, nada além do que se espera dos austríacos.

Esta estreia das meninas, agora moças, remonta aos dias da monarquia - a introdução formal na sociedade. Vestidas com um longo branco, com uma coroa na cabeça e longas luvas brancas com um ramalhete na mão direita, elas vão para a pista de dança de braços dados com seus acompanhan­tes de smoking, geralmente ao som de “Fächer-polonaise”, de Carl Michael Ziehrer, ex-regente da corte imperial.

Ao final deste solene ritual é a vez da valsa – com os pares girando no sentido anti-horário. O que não é tão fácil quanto parece. Esqueça aquela mera valsinha dos aniversári­os de 15 anos. Não é em vão que por lá as escolas de dança são tão bem frequentad­as. Só em Viena existem cerca de 30 instituiçõ­es. E são elas as responsáve­is por organizare­m as cerimônias de abertura dos bailes.

Executados com exímio primor, que mostra não só técnica como muita dedicação, os movimentos rítmicos criam um visual fascinante em preto e branco. Não tem como não se ver contemplan­do. Eu mesma, devo dizer que me vi por várias vezes boquiabert­a. E soltando suspiros.

Após todas as formalidad­es, e apresentaç­ões oficiais, se ouve com empolgação a frase “Alles Walzer”, onde todos são convidados para a pista de dança, desta vez para valsar no sentido horário. E com meus dois pés esquerdos me rendi, com certa dificuldad­e, devo dizer. Mas a decepção que senti comigo, por ser uma negação dançando, foi breve, pois não tem como não ficar encantado mesmo que só admirando.

É uma sucessão de estilos de danças, já que não se limita somente a valsa não. Mas o momento mais aguardado é a meia-noite, quando é a hora da qua

drille. Sim, uma quadrilha, que em alguns aspectos lembra as nossas juninas, devidos aos comandos dados. Mas para por aí a comparação, pois os passos são bem complicadi­nhos. Mesmo com a explicação do mestre de cerimônias. É tudo muito rápido, o que dá brecha para a confusão. É divertidís­simo, não tem como não entrar no clima. A melodia é cativante, e a alegria geral contagia.

Não raro, no entanto, a dança termina em um caos bem-humorado causado por alguns dançarinos de alto astral durante a corrida louca pelas passagens

entre as fileiras de dançarinos. Em todo caso, é uma maneira de dar aquela renovada, já que esses bailes costumam ir até o amanhecer, lá pelas 5h.

Vale ressaltar que, há vários outros espaços do palácio abertos para garantir que ninguém fique parado, pois há diferentes estilos musicais. Ou seja, dá para agradar todo mundo, dos mais conservado­res até os mais moderninho­s. Mas a graça é justamente transitar de um para outro.

E quanto o meu final feliz, foi bem estilo Cinderela após o baile, só que no meu caso não a meia-noite, mas sim as 3h30 da manhã, voltando bem borralheir­a andando até o meu hotel, o Park Hyatt, que fica bem próximo ao Hofburg (levei um sapato sem salto só para poder fazer isso), parando para comer uma legítima wurst (salsicha).

Difícil mesmo, além de abrir mão da bela maquiagem, foi conseguir dormir, pois, apesar de cansada a adrenalina me fazia ficar repassando tudo em mente, até finalmente mudar de princesa e virar a Bela Adormecida.

Então se permita, se deixe levar pela aura imperial da cidade, pelo glamour de um evento como este e vá livre de pré-conceitos e vergonha, pois a diversão é garantida, assim como uma lembrança inesquecív­el!

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 ??  ?? Pronta para o meu primeiro baile vienense, impossível não se sentir em um conto de fadas. Abaixo, o Kaffeesied­erball, que é anualmente aberto por um “comitê” de moças e rapazes estudantes da escola de danças Elmayer.
Pronta para o meu primeiro baile vienense, impossível não se sentir em um conto de fadas. Abaixo, o Kaffeesied­erball, que é anualmente aberto por um “comitê” de moças e rapazes estudantes da escola de danças Elmayer.
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 ??  ?? O salão principal é onde tudo acontece. Desde as apresentaç­ões oficiais do baile até a hora que todos os presentes são convidados a dançar. Sendo que o momento mais aguardado é a da quadrilha. Todos os anos, durante o Kaffeesied­erball, o Hofburg fica lotado. Tem gente por todos os cantos do palácio, afinal de contas são disponibil­izados 3.600 lugares.
O salão principal é onde tudo acontece. Desde as apresentaç­ões oficiais do baile até a hora que todos os presentes são convidados a dançar. Sendo que o momento mais aguardado é a da quadrilha. Todos os anos, durante o Kaffeesied­erball, o Hofburg fica lotado. Tem gente por todos os cantos do palácio, afinal de contas são disponibil­izados 3.600 lugares.

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