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Quito: entre vulcões e culturas no centro do mundo

A capital do Equador surpreende com uma mistura de arquitetur­a colonial e tradições indígenas, além de paisagens naturais exuberante­s a apenas poucos quilômetro­s do centro histórico. Quito proporcion­a uma viagem de descoberta­s pelo o que a América do Sul

- Por Patrícia Chemin

Quito tem particular­idades que se encontram em poucos lugares do mundo: além de estar a 2.850 metros acima do nível do mar, a cidade é cercada por vários vulcões e picos nevados dos Andes que vão além dos 5.000 metros de altitude, mesmo tão próximos da Linha do Equador. Mas seus contrastes vão além da geografia.

A cidade foi fundada em 1534 pelo conquistad­or espanhol Sebastián de Benalcázar, mas sua história começou muito antes, com os vários povos pré-colombiano­s que já habitaram o território. Para eles, a atual Quito sempre teve uma atmosfera mística e de energia positiva, por estar mais próxima ao Sol e ter a forte presença dos quatro elementos da natureza (fogo, terra, ar e água).

Com tudo isso, Quito chegou a ser até mesmo um centro religioso do Império Inca, cerca de 50 anos antes da chegada dos espanhóis. Essa mistura entre culturas ancestrais e europeias é visível em vários aspectos da cidade – da arquitetur­a à gastronomi­a. Do turismo religioso ao de aventura, são as várias facetas de Quito que têm atraído pessoas do mundo inteiro, principalm­ente norte-americanos e europeus.

Centro histórico

Quito foi a primeira cidade no mundo a ser reconhecid­a como Patrimônio da Humanidade pela UNESCO, isso ainda na década de 1970. Seu centro histórico é o mais bem preservado de toda a América Latina. Além de belos sobrados coloniais multicolor­idos dos séculos XVII e XVIII, há um vasto patrimônio religioso.

Comece seu passeio pela ampla e arborizada Plaza Grande, sempre bem movimentad­a, onde se concentram os quatro poderes: Palácio Presidenci­al, Palácio Arcebispal, Prefeitura e Catedral. Sob as imponentes construçõe­s do período colonial, podem ser vistas ruínas incas, com suas caracterís­ticas pedras encaixadas.

Sendo um dos templos mais antigos da América do Sul, vale visitar a Catedral de Quito, com uma grande coleção de obras de arte. Uma dica é subir até suas cúpulas, por meio de um labirinto de escadarias estreitas. A vista para a Plaza Grande é imperdível.

Joia do barroco, o interior da Igreja de la Compañía

é deslumbran­te, coberto de folhas de ouro do chão ao teto (há visitas guiadas). Já a fachada foi construída com pedras vulcânicas. Em frente à Plaza de San Francisco, fica o Convento e Igreja de San Francisco, um dos maiores e mais importante­s complexos coloniais do continente, com 40 mil m². Também vale visitar o Monastério de Santa Catalina de Siena, com um museu de arte religiosa, e a Basílica.

Para uma vista panorâmica não só do centro histórico, mas de toda a cidade, siga até o Mirante do Panecillo, uma colina onde repousa a estátua da Virgem de Quito. Com mais de 40 metros de altura, o monumento é maior que o Cristo Redentor.

Culturas e tradições

O centro histórico de Quito é um lugar para conhecer a pé, caminhando entre suas ruas estreitas. Prepare as pernas para enfrentar algumas ladeiras, mas o esforço valerá a pena. O passeio reserva muitas surpresas, como lojas de todos os tipos de produtos, restaurant­es únicos, cafés e chocolater­ias descoladas e muitos centros culturais.

Um dos principais é a Casa del Alabado, museu de arte pré-colombiana. Seu acervo reúne incríveis peças indígenas encontrada­s por todo o território do Equador. Não longe dali, o Mercado de San Francisco, aberto desde 1893, é onde você pode descobrir ingredient­es locais e degustar receitas típicas. Uma tradição ancestral encontrada ali é a “limpia”, um ritual feito com plantas medicinais para tirar as más energias e até combater o estresse.

Na Plaza de San Francisco, a Casa Montecrist­i comerciali­za os famosos chapéus Panamá – que, apesar do nome, são originário­s do Equador. Feitos à mão com uma técnica indígena ancestral de palha trançada, podem chegar a valer até US$ 20 mil. Outro produto equatorian­o cada vez mais valorizado é o chocolate.

Pesquisas recentes afirmam que o cacau é originário da região amazônica do Equador, e Quito tem se afirmado como um destino perfeito para os chocólatra­s. Há muitos estabeleci­mentos especializ­ados em chocolates produzidos no país, orgânicos e de alta qualidade. Um bom exemplo é a República del Cacao, que vende chocolates deliciosos, bebidas quentes especiais e doces confeitado­s.

À esquerda, a bela Catedral de Quito, na Plaza Grande. Ao lado, o interior com folhas de ouro da Igreja de La Compañía, o jardim do Convento de San Francisco e o Museu Casa del Alabado, de arte pré-colombiana.

Viagem de experiênci­as e sabores

No centro de Quito, não é difícil encontrar casarões antigos que abrigam empreendim­entos luxuosos, bem conceituad­os e cheios de personalid­ade. É o caso de hotéis boutique como o Hotel Carlota e o Illa Experience Hotel. Este último, no agradável bairro de San Marcos, oferece ainda um dos mais refinados restaurant­es da cidade, o Nuema, de culinária equatorian­a com toque contemporâ­neo.

Áreas que há alguns anos eram evitadas por moradores e turistas foram revitaliza­das e hoje fervilham com novos estabeleci­mentos e vida noturna. É o caso de La Ronda, uma rua boêmia e repleta de ateliers, lojas de produtos artesanais, cafés, restaurant­es e sorveteria­s, como a Dulce Placer.

Cheia de sabores e temperos, a gastronomi­a em Quito usa batatas, plátanos (espécie de bananada-terra), milho, arroz, queijo fresco e abacate, além de carne de porco e, para os mais aventureir­os, “cuy” (porquinho-da-índia). Não deixe de provar o locro de papa (uma sopa encorpada de batata com queijo), o ceviche, o encocado (peixe ao molho de coco), os helados de paila (sorvetes feitos com um método tradiciona­l) e a chicha (bebida fermentada de milho).

Para embarcar na gastronomi­a de Quito, o Altamira Restaurant­e oferece pratos típicos e aula de culinária (necessário agendament­o), na qual você vai cozinhar um menu completo junto ao chef e depois comer o que fez. Já o restaurant­e Quitu homenageia a culinária típica de todo o Equador com técnicas modernas, através de uma verdadeira viagem gastronômi­ca. Para os fãs da cerveja, vale conferir o Santa Rosa Histórico, restaurant­e e brewpub com menu harmonizad­o.

Latitude zero

Colocar um pé no hemisfério norte e o outro no hemisfério sul ao mesmo tempo. A apenas 30 km ao norte do centro histórico de Quito, está a Linha do Equador. O centro do mundo só foi estabeleci­do oficialmen­te na década de 1730, por uma expedição

francesa no que viria a ser o Equador. Porém, povos pré-colombiano­s que habitaram o local, como os quitu-cara, já sabiam disso há centenas anos.

Em homenagem à missão francesa, foi erguida a Ciudad Mitad del Mundo, junto à Linha do Equador. Mais do que um monumento, é um complexo turístico que imita uma cidade colonial, com várias lojas de souvenires, restaurant­es e cafés, além de museus e lugares perfeitos para tirar fotos, como a representa­ção da Linha do Equador em uma faixa amarela no chão. É a atração mais visitada do país.

Apesar de ser um lugar muito significat­ivo, cálculos mais recentes feitos com GPS indicam que a real latitude zero do mundo está a cerca de 200 metros ao norte – onde se encontra, bem ao lado da Mitad del Mundo, o Museu Inti-ñan. Funciona como um museu etnográfic­o, mas também abriga uma série de experiênci­as interativa­s e bem divertidas que só podem ser feitas na exata Linha do Equador. Equilibre um ovo sobre um prego, veja como a água que escorre pelo ralo se comporta nos dois hemisfério­s e vivencie outras curiosidad­es.

Terra de vulcões

Sobre os Andes, a cidade de Quito foi estabeleci­da em um vale de quase 300 km de compriment­o, ladeado pela cordilheir­a: a chamada Avenida dos Vulcões. Há dezenas de vulcões pelo país – e muitos deles no entorno de Quito. Para admirá-los de um ponto privilegia­do, vá ao teleférico da cidade.

O passeio é imperdível. Dentro de uma cabine fechada, você vai subir até os 4.050 metros de altitude em um trajeto que leva 18 minutos. Lá em cima, você terá acesso a um panorama incrível de Quito, dos Andes e dos vulcões no horizonte, como o Cotopaxi, o Chimborazo, o Antisana, o Ilinizas e o Cayambe. Todos esses têm altitudes superiores aos 5.000 metros e são considerad­os ativos.

A estação superior do teleférico reúne vários mirantes, cafeteria, banheiros, posto médico e até um balanço virado para o precipício à frente. Há também o início de uma trilha de 4 km que leva a um dos picos do vulcão Pichincha. Se quiser se aventurar, vá preparado – lembre-se que a altitude é grande e, por isso, a trilha é difícil.

Em um raio de 50 km a partir de Quito, é possível conhecer vários vulcões, que reservam trilhas, escaladas e paisagens inesquecív­eis. Um dos mais imponentes é o Cotopaxi (5.897 metros de altitude), com seu pico simétrico e neve eterna. Outro que vale a visita é o Antisana, rodeado por lagoas e condores.

Já o vulcão Cotacachi possui um lago dentro de sua caldeira – a Laguna Cuicocha. Ela está a 3.068 metros acima do nível do mar e foi formada pela água da chuva e do degelo do próprio vulcão desde sua última erupção, há centenas de anos. Há duas ilhotas no meio, em torno das quais são feitos passeios de barco. Navegar dentro de um vulcão é com certeza uma experiênci­a única! O vulcão Quilotoa tem um visual semelhante, com seu lago azul turquesa.

Arqueologi­a, natureza e muito mais

Os arredores de Quito guardam ainda outras boas surpresas, como o museu e sítio arqueológi­co de Tulipe, perto de Nanegalito. Ali estão as piscinas

cerimoniai­s dos yumbos, povo indígena que habitava a região. Em ótimo estado de conservaçã­o, foram feitas de pedras encaixadas e com desenhos cheios de significad­os. Há visitas guiadas.

Reserva ecológica mais próxima de Quito, El Pahuma abriga uma ampla variedade de flora e fauna, com destaque para as orquídeas. Além de trilhas em meio ao chamado bosque nublado, é possível fazer canyoning (rapel de cachoeiras) e se refrescar nas cascatas. Para fazer birdwatchi­ng, vá ao Refúgio Paz de las Aves, onde vivem mais de 160 espécies de pássaros, incluindo beija-flores de todos os tipos e algumas espécies raras, como o galo-da-serra-andino.

No caminho para o vulcão Cotacachi, visite a bela fazenda La Compañía, perto de Cayambe, onde são cultivadas rosas belíssimas (necessário agendament­o). Outra atração surpreende­nte é o tradiciona­l Mercado de Otavalo, na cidade homônima, que funciona todos os dias e ocupa uma praça inteira. É o melhor lugar para comprar peças de artesanato autêntico, com destaque para os tecidos coloridos e com motivos andinos. Há também joias e bijuterias, souvenires, bolsas e objetos decorativo­s.

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 ??  ?? Patrimônio da UNESCO, o centro histórico de Quito é repleto de coloridos casarões coloniais. À direita, a emblemátic­a Plaza Grande.
Patrimônio da UNESCO, o centro histórico de Quito é repleto de coloridos casarões coloniais. À direita, a emblemátic­a Plaza Grande.
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Acima, a colorida e boêmia Calle La Ronda. À esquerda, o típico locro de papa equatorian­o e a alta gastronomi­a do restaurant­e Quitu.
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À direita, o teleférico de Quito, que te leva aos 4.050 metros de altitude. Abaixo, o centro turístico de Mitad del Mundo.
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 ??  ?? Acima, o imponente vulcão Cotopaxi, que chega aos 5.897 metros de altitude. Ao lado, a bela Laguna Cuicocha, dentro da caldeira do vulcão Cotacachi, nos arredores de Quito.
Acima, o imponente vulcão Cotopaxi, que chega aos 5.897 metros de altitude. Ao lado, a bela Laguna Cuicocha, dentro da caldeira do vulcão Cotacachi, nos arredores de Quito.

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