CAPA
ENTREVISTA COM O NOVO PRESIDENTE DA CÂMARA, ARTHUR LIRA
NA manhã do dia 1º de fevereiro, às 10h25, o então candidato à presidência da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), foi ao Twitter registrar o Salmo 23: “O Senhor é meu pastor, nada me faltará”, que foi seguido por uma sequência de tuítes bíblicos, respondidos efusivamente com orações, emojis e votos de que sua eleição, àquela altura já dada como certa, pudesse destravar a pauta econômica do Brasil. Na noite do dia 2, menos de 24 horas após a vitória no plenário, um outro público, bem longe do Twitter, privava da mesa do agora presidente da Câmara dos Deputados. Eram pelo menos 10 grandes empresários, representando vários setores. Ao que se saiba, não houve salmos. Nem emojis. Os votos de que ele finalmente dê andamento às reformas estruturais tão sonhadas, porém, foram os mesmos. O estímulo, ao contrário dos seguidores na rede social, não eram as orações. Era a promessa de muita pressão.
A ênfase será na harmonia entre os poderes e nas necessidades do Brasil. Teremos a independência de discutir e aprovar qualquer tema de interesse do conjunto dos parlamentares, o que não significa ser contra o país.
Não foram divulgados nomes ou imagens daquele jantar realizado quando recém completavam-se as primeiras 24 horas da eleição à presidência, mas, sabendo-se que os comensais eram todos ligados ao setor empresarial, é justo supor que Lira está ciente da expectativa depositada nele. “Temos de avançar nas agendas de reformas do Brasil. Acredito que, escutando os parlamentares e definindo uma agenda em maioria com as lideranças, podemos avançar e aprovar temas importantes para o país em 2021”, garante o presidente da Câmara, nesta entrevista à Voto.
“Temos plena convicção de que os dois presidentes, o da Câmara e o do Senado, estão com as melhores intenções para acelerar a retomada do crescimento por meio das reformas, que estão amadurecidas. Esperamos que as brigas fiquem de lado, pois o Brasil não pode mais esperar. As entidades representativas vão pressionar o presidente Arthur Lira, no bom sentido, para que os interesses do país guiem o Legislativo”, afirma o empresário Nabil Sahyoun, presidente da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (ALSHOP). À frente do Movimento Brasil Competitivo, Jorge Gerdau Johannpeter salienta que o país vive um momento de grande tensão, tanto pelo quadro de endividamento quanto pelas necessidades sociais da população, fortemente afetada pela pandemia. “Essas urgências obrigam a nação a achar soluções. O presidente Lira tem um perfil diversificado e uma capacidade abrangente de trabalho, o que ajuda muito no avanço das reformas. A eleição dele para a Câmara é feliz. Esperamos agora é que ele tenha coragem e condições de conduzir essa enorme responsabilidade”, comenta.
O primeiro desafio à liderança de Lira, no entanto, ocorreu bem longe da esfera econômica. Diante da prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), decretada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o Congresso se reuniu para definir se confirmaria ou não a detenção determinada pela instância máxima do Judiciário. Em seu discurso de abertura da sessão, Arthur Lira expôs o conflito que os deputados tinham diante de si: a inviolabilidade da manifestação parlamentar ou a inviolabilidade da própria democracia. Garantiu, ao final, que trabalhará para que a lei determine limites mais claros e firmes entre os Poderes e para que o Conselho de Ética da Câmara atue de maneira mais contundente. “Vamos ultrapassar o tema de hoje e seguir nossa missão maior”, disparou, ao final de sua fala.
Missão maior, está claro, é a pauta econômica, que grita por aceleração. “A reforma tributária é a mais importante, seguida pela ad
Essas urgências obrigam a nação a achar soluções. O presidente Lira tem um perfil diversificado e uma capacidade abrangente de trabalho, o que ajuda muito no avanço das reformas. A eleição dele para a Câmara é feliz.
JORGE GERDAU JOHANNPETER
Presidente do Movimento Brasil Competitivo
ministrativa. A indústria brasileira precisa de competitividade, pois tem o maior potencial de geração de empregos qualificados e desenvolvimento de tecnologia de ponta. Além das reformas, também precisamos que Projetos de Lei menores avancem, para que o ambiente seja mais favorável à atividade industrial no Brasil”, aponta o diretor de Relações Governamentais para a América do Sul da General Motors, Adriano Barros. O executivo diz, ainda, que o setor percebe a preocupação do Legislativo com a pauta econômica, compreendendo a urgência da aprovação das mudanças estruturais decisivas para o país. “Estamos acompanhando com otimismo e expectativa”, destaca Barros, que também participa do debate público sobre o tema como vice-presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).
DE RURALISTA A LÍDER DA PAUTA ECONÔMICA
Arthur César Pereira de Lira tem 51 anos – quase 52, que completa em junho – e é natural de Maceió, capital de Alagoas. Começou carreira na política ainda jovem, quando se elegeu vereador em sua cidade natal aos 23 anos, em 1992, pelo então PFL. Reelegeu-se para a Câmara Municipal em 1996 e, em 1998, tornou-se deputado estadual, sendo reeleito para a Assembleia de Alagoas em 2002 e 2006. Ainda durante seu primeiro mandato como vereador, deixou o PFL e, na década seguinte, passou por PSDB, PTB, PP e PMN. Em 2009, voltou ao PP, partido ao qual é filiado até hoje. Casado e pai de cinco filhos, Lira é formado em Direito pela Universidade Federal de Alagoas, empresário e agropecuarista – é um dos membros, aliás, da bancada ruralista da Câmara, e um de seus primeiros compromissos como presidente foi se reunir com os parlamentares ligados ao agronegócio.
Desde que começaram as articulações para a presidência da Câmara, Lira demonstrou o desejo de, mais do que aliado do governo, ser um impulsionador da pauta econômica que precisa tramitar no Legislativo. Para o diretor da RAC Engenharia, Ricardo Cansian, os empresários têm disposição para investir e, por consequência, contratar, contudo, para isso, precisam de previsibilidade e segurança, o que virá somente por meio de reformas, como a tributária. “Precisamos de estabilidade, pois os altos e baixos não criam um ambiente favorável aos investimentos
Precisamos de estabilidade, pois os altos e baixos não criam um ambiente favorável aos investimentos e aos projetos de expansão. Esperamos que, finalmente, essa linearidade nas decisões nos traga a estabilidade que beneficiará não apenas o nosso setor, mas toda a economia.
RICARDO CANSIAN
Diretor da RAC Engenharia
e aos projetos de expansão. Esperamos que, finalmente, essa linearidade nas decisões nos traga a estabilidade que beneficiará não apenas o nosso setor, mas toda a economia.”
Em busca da tão desejada segurança para investimentos, Lira deu o primeiro aceno ao mercado poucos dias após sua eleição, com a aprovação do texto-base do projeto de lei que concede autonomia ao Banco Central, minimizando a possibilidade de interferência política no comando. Agora, acena com outro debate muito caro à equipe econômica do governo, que é a desvinculação do orçamento, desindexando e desobrigando as verbas hoje regidas pelas rubricas previstas no Orçamento da União. A promessa de mais flexibilidade nos gastos do governo federal empolga o setor produtivo, que vê a possibilidade de mais eficiência no gasto público.
Outra pauta cara ao setor produtivo e que gera grande expectativa quanto à gestão de Arthur Lira é a agenda de privatizações, prometida pelo Ministério da Economia, mas que ainda não deslanchou. “Esperamos que as privatizações andem para que o Estado se torne cada vez mais um agente regulador, abrindo espaço para a atuação privada em todos os setores que não forem saúde e segurança”, frisa o CEO da Solví Participações, Celso Pedroso.
Na seara das urgências, com as quais o Parlamento já se depara, especialmente em função da pandemia, as responsabilidades que Lira carrega sobre os ombros também são pesadas. Além da óbvia necessidade de obter mais vacinas em prazo mais curto de tempo, já indicada pelo próprio Lira em seu discurso de posse, os deputados também precisarão lidar com a inevitabilidade de uma nova rodada de auxílio emergencial enquanto a Covid-19 não arrefece. Na opinião do diretor de Relações Externas da BAT Brasil, Delcio Sandi, a PEC Emergencial é a pauta incontornável do momento não apenas para socorrer as pessoas, como para movimentar a economia. Mesmo com todos os desafios, segundo ele, as perspectivas são otimistas. “Sempre haverá percalços normais para um país democrático, mas vejo que temos a ganhar com essa configuração do Congresso e do governo. Esperamos chegar ao fim do ano com saldo positivo, tendo aproveitado essa janela de oportunidade que se abre em 2021”, completa Sandi.