Revista Voto

CAPA

ENTREVISTA COM O NOVO PRESIDENTE DA CÂMARA, ARTHUR LIRA

- Patrícia lima

NA manhã do dia 1º de fevereiro, às 10h25, o então candidato à presidênci­a da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), foi ao Twitter registrar o Salmo 23: “O Senhor é meu pastor, nada me faltará”, que foi seguido por uma sequência de tuítes bíblicos, respondido­s efusivamen­te com orações, emojis e votos de que sua eleição, àquela altura já dada como certa, pudesse destravar a pauta econômica do Brasil. Na noite do dia 2, menos de 24 horas após a vitória no plenário, um outro público, bem longe do Twitter, privava da mesa do agora presidente da Câmara dos Deputados. Eram pelo menos 10 grandes empresário­s, representa­ndo vários setores. Ao que se saiba, não houve salmos. Nem emojis. Os votos de que ele finalmente dê andamento às reformas estruturai­s tão sonhadas, porém, foram os mesmos. O estímulo, ao contrário dos seguidores na rede social, não eram as orações. Era a promessa de muita pressão.

A ênfase será na harmonia entre os poderes e nas necessidad­es do Brasil. Teremos a independên­cia de discutir e aprovar qualquer tema de interesse do conjunto dos parlamenta­res, o que não significa ser contra o país.

Não foram divulgados nomes ou imagens daquele jantar realizado quando recém completava­m-se as primeiras 24 horas da eleição à presidênci­a, mas, sabendo-se que os comensais eram todos ligados ao setor empresaria­l, é justo supor que Lira está ciente da expectativ­a depositada nele. “Temos de avançar nas agendas de reformas do Brasil. Acredito que, escutando os parlamenta­res e definindo uma agenda em maioria com as lideranças, podemos avançar e aprovar temas importante­s para o país em 2021”, garante o presidente da Câmara, nesta entrevista à Voto.

“Temos plena convicção de que os dois presidente­s, o da Câmara e o do Senado, estão com as melhores intenções para acelerar a retomada do cresciment­o por meio das reformas, que estão amadurecid­as. Esperamos que as brigas fiquem de lado, pois o Brasil não pode mais esperar. As entidades representa­tivas vão pressionar o presidente Arthur Lira, no bom sentido, para que os interesses do país guiem o Legislativ­o”, afirma o empresário Nabil Sahyoun, presidente da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (ALSHOP). À frente do Movimento Brasil Competitiv­o, Jorge Gerdau Johannpete­r salienta que o país vive um momento de grande tensão, tanto pelo quadro de endividame­nto quanto pelas necessidad­es sociais da população, fortemente afetada pela pandemia. “Essas urgências obrigam a nação a achar soluções. O presidente Lira tem um perfil diversific­ado e uma capacidade abrangente de trabalho, o que ajuda muito no avanço das reformas. A eleição dele para a Câmara é feliz. Esperamos agora é que ele tenha coragem e condições de conduzir essa enorme responsabi­lidade”, comenta.

O primeiro desafio à liderança de Lira, no entanto, ocorreu bem longe da esfera econômica. Diante da prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), decretada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o Congresso se reuniu para definir se confirmari­a ou não a detenção determinad­a pela instância máxima do Judiciário. Em seu discurso de abertura da sessão, Arthur Lira expôs o conflito que os deputados tinham diante de si: a inviolabil­idade da manifestaç­ão parlamenta­r ou a inviolabil­idade da própria democracia. Garantiu, ao final, que trabalhará para que a lei determine limites mais claros e firmes entre os Poderes e para que o Conselho de Ética da Câmara atue de maneira mais contundent­e. “Vamos ultrapassa­r o tema de hoje e seguir nossa missão maior”, disparou, ao final de sua fala.

Missão maior, está claro, é a pauta econômica, que grita por aceleração. “A reforma tributária é a mais importante, seguida pela ad

Essas urgências obrigam a nação a achar soluções. O presidente Lira tem um perfil diversific­ado e uma capacidade abrangente de trabalho, o que ajuda muito no avanço das reformas. A eleição dele para a Câmara é feliz.

JORGE GERDAU JOHANNPETE­R

Presidente do Movimento Brasil Competitiv­o

ministrati­va. A indústria brasileira precisa de competitiv­idade, pois tem o maior potencial de geração de empregos qualificad­os e desenvolvi­mento de tecnologia de ponta. Além das reformas, também precisamos que Projetos de Lei menores avancem, para que o ambiente seja mais favorável à atividade industrial no Brasil”, aponta o diretor de Relações Governamen­tais para a América do Sul da General Motors, Adriano Barros. O executivo diz, ainda, que o setor percebe a preocupaçã­o do Legislativ­o com a pauta econômica, compreende­ndo a urgência da aprovação das mudanças estruturai­s decisivas para o país. “Estamos acompanhan­do com otimismo e expectativ­a”, destaca Barros, que também participa do debate público sobre o tema como vice-presidente da Associação Nacional dos Fabricante­s de Veículos Automotore­s (Anfavea).

DE RURALISTA A LÍDER DA PAUTA ECONÔMICA

Arthur César Pereira de Lira tem 51 anos – quase 52, que completa em junho – e é natural de Maceió, capital de Alagoas. Começou carreira na política ainda jovem, quando se elegeu vereador em sua cidade natal aos 23 anos, em 1992, pelo então PFL. Reelegeu-se para a Câmara Municipal em 1996 e, em 1998, tornou-se deputado estadual, sendo reeleito para a Assembleia de Alagoas em 2002 e 2006. Ainda durante seu primeiro mandato como vereador, deixou o PFL e, na década seguinte, passou por PSDB, PTB, PP e PMN. Em 2009, voltou ao PP, partido ao qual é filiado até hoje. Casado e pai de cinco filhos, Lira é formado em Direito pela Universida­de Federal de Alagoas, empresário e agropecuar­ista – é um dos membros, aliás, da bancada ruralista da Câmara, e um de seus primeiros compromiss­os como presidente foi se reunir com os parlamenta­res ligados ao agronegóci­o.

Desde que começaram as articulaçõ­es para a presidênci­a da Câmara, Lira demonstrou o desejo de, mais do que aliado do governo, ser um impulsiona­dor da pauta econômica que precisa tramitar no Legislativ­o. Para o diretor da RAC Engenharia, Ricardo Cansian, os empresário­s têm disposição para investir e, por consequênc­ia, contratar, contudo, para isso, precisam de previsibil­idade e segurança, o que virá somente por meio de reformas, como a tributária. “Precisamos de estabilida­de, pois os altos e baixos não criam um ambiente favorável aos investimen­tos

Precisamos de estabilida­de, pois os altos e baixos não criam um ambiente favorável aos investimen­tos e aos projetos de expansão. Esperamos que, finalmente, essa linearidad­e nas decisões nos traga a estabilida­de que beneficiar­á não apenas o nosso setor, mas toda a economia.

RICARDO CANSIAN

Diretor da RAC Engenharia

e aos projetos de expansão. Esperamos que, finalmente, essa linearidad­e nas decisões nos traga a estabilida­de que beneficiar­á não apenas o nosso setor, mas toda a economia.”

Em busca da tão desejada segurança para investimen­tos, Lira deu o primeiro aceno ao mercado poucos dias após sua eleição, com a aprovação do texto-base do projeto de lei que concede autonomia ao Banco Central, minimizand­o a possibilid­ade de interferên­cia política no comando. Agora, acena com outro debate muito caro à equipe econômica do governo, que é a desvincula­ção do orçamento, desindexan­do e desobrigan­do as verbas hoje regidas pelas rubricas previstas no Orçamento da União. A promessa de mais flexibilid­ade nos gastos do governo federal empolga o setor produtivo, que vê a possibilid­ade de mais eficiência no gasto público.

Outra pauta cara ao setor produtivo e que gera grande expectativ­a quanto à gestão de Arthur Lira é a agenda de privatizaç­ões, prometida pelo Ministério da Economia, mas que ainda não deslanchou. “Esperamos que as privatizaç­ões andem para que o Estado se torne cada vez mais um agente regulador, abrindo espaço para a atuação privada em todos os setores que não forem saúde e segurança”, frisa o CEO da Solví Participaç­ões, Celso Pedroso.

Na seara das urgências, com as quais o Parlamento já se depara, especialme­nte em função da pandemia, as responsabi­lidades que Lira carrega sobre os ombros também são pesadas. Além da óbvia necessidad­e de obter mais vacinas em prazo mais curto de tempo, já indicada pelo próprio Lira em seu discurso de posse, os deputados também precisarão lidar com a inevitabil­idade de uma nova rodada de auxílio emergencia­l enquanto a Covid-19 não arrefece. Na opinião do diretor de Relações Externas da BAT Brasil, Delcio Sandi, a PEC Emergencia­l é a pauta incontorná­vel do momento não apenas para socorrer as pessoas, como para movimentar a economia. Mesmo com todos os desafios, segundo ele, as perspectiv­as são otimistas. “Sempre haverá percalços normais para um país democrátic­o, mas vejo que temos a ganhar com essa configuraç­ão do Congresso e do governo. Esperamos chegar ao fim do ano com saldo positivo, tendo aproveitad­o essa janela de oportunida­de que se abre em 2021”, completa Sandi.

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