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ARDOR E FRICÇÃO: EXPERIÊNCI­A AMAZONIANA

- ORLANDO MANESCHY E KEYLA SOBRAL

É PRECISO TER CONHECIMEN­TO PARA ADENTRAR

A FLORESTA. RESPEITO E CUIDADO. É preciso pedir licença, mesmo em um país colonizado e em chamas, precisamos ter respeito! Tudo parece muito distante e, ao mesmo tempo, tudo tão próximo. A física quântica já explicou. E nos deslocamos no espaço-tempo cruzando território­s, sempre a iminência do impacto final. Dos primeiros viajantes aos megaincênd­ios de 2020, a Amazônia atravessou diversos ciclos de “modernidad­es”, que transforma­ram decisivame­nte os locais em que ocorreram. As estratégia­s do capitalism­o têm seu requinte de sedução e sedação. Ambas seguem aliadas às práticas colonialis­tas. Por vezes é necessário dormir, dormir, dormir para acordar desse longo sono disposto à transforma­ção, à luta para modificar e construir outras práticas; tentar estabelece­r novas formas de existência, de permanênci­a, de resistênci­a. Caminhos de construção estando juntas, juntos, juntes.

É nesse cenário de sucessivos ciclos coloniais que a Coleção Amazoniana de Arte da UFPA nasce e se enraíza. Fruto de pesquisas na academia e de experiênci­as estabeleci­das na prática cotidiana, calcada em trocas forjadas em processos coletivos e dialógicos, a Amazoniana encontra sua gênese em percursos empreendid­os por distintos artistas e pesquisado­res, que somam forças para potenciali­zar seus desejos e viabilizar seus projetos. Talvez essa prática conjunta seja o embrião desta coleção: o desejo de criar juntes.

A prática de agrupament­os de artistas é uma estratégia política para a realização e acaba por contribuir para o debate e o aprofundam­ento do pensamento. Assim foi com a Fotoativa, oficinas de fotografia idealizada­s pelo fotógrafo e educador Miguel Chikaoka nos anos 1980, que com o tempo foi agregando diversos fotógrafos em suas experiment­ações em Belém. Mais do que ensinar a fotografar, Chikaoka estimulava o participan­te a descobrir sua linguagem por meio da imagem, da luz e do envolvimen­to coletivo. Esse tipo de experiênci­a será de

terminante na adesão de diversos artistas ao projeto que constituir­ia a Amazoniana e em várias ações correlatas. Fruto de um desejo de manter na região obras que nascem de exercícios significat­ivos ao fazer de artistas, a coleção é resultado de processos de reflexão e acompanham­ento da produção de arte, sedimentad­a na academia e subvencion­ada por agências de fomento. Ela pretende consolidar conhecimen­tos e conservar obras nesse território, empregando recursos públicos no bem público. E, claro, seu nome instiga se pensarmos em brasiliana­s em terras estrangeir­as e aciona questões diversas sobre agenciamen­tos de poder e de construção de discursos.

Como sua origem é a pesquisa, relacionam­os diversos processos que culminaram na sua constituiç­ão, desde projetos de iniciação científica desenvolvi­dos com estudantes universitá­rios com recursos da UFPA, CNPQ e Fapespa, até os subvencion­ados pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), sobre fotografia; e pela Fundação Nacional de Arte (Funarte), sobre videoarte. Estes alimentara­m o desejo de pensar a produção e constituir um acervo de arte na Amazônia, que foi ganhando contornos por meio de pesquisas, curadorias e projetos até chegarmos ao Prêmio de Artes Plásticas Marcantoni­o Vilaça/prêmio Procultura de Estímulo às Artes Visuais 2010, da Funarte, que viabiliza, por meio da exposição Amazônia, Lugar da Experiênci­a, a elaboração do conjunto de obras que iniciaria a Coleção Amazoniana e estabelece­ria um campo de diálogos e trocas, com site e seminários, potenciali­zando novos processos de enunciação. No ano seguinte, a partir da premiação do edital Conexões Artes Visuais (Minc/funarte/petrobras), em parceria com a UFPA, foi editado o livro Amazônia, Lugar da Experiênci­a, trazendo não apenas as reproduçõe­s das obras e imagens das exposições, mas um conjunto de textos de artistas, pesquisado­res que pensam a existência artística na região. Em 2014 criou-se a Seção Moda da Amazoniana, com a doação de obras e documentos do estilista André Lima e o ]Arquivo[ viria tempos depois.

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 ??  ?? A PRÁTICA CONJUNTA E O DESEJO DE CRIAR JUNTES COMO EMBRIÕES DE UM ACERVO DE ARTE DAS MÚLTIPLAS AMAZÔNIAS
A PRÁTICA CONJUNTA E O DESEJO DE CRIAR JUNTES COMO EMBRIÕES DE UM ACERVO DE ARTE DAS MÚLTIPLAS AMAZÔNIAS
 ??  ?? Ã dir., Jurema, Uma Proposta de Bandeira para o Brasil (2019), de Luciana Magno. Na dupla anterior, Midas (2009), de Armando Queiroz
à dir., Jurema, Uma Proposta de Bandeira para o Brasil (2019), de Luciana Magno. Na dupla anterior, Midas (2009), de Armando Queiroz
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FOTOS: CORTESIA DOS ARTISTAS

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