Vinho e filosofia
A Primeira Grande Expansão Vinícola: Grécia
Os gregos foram a primeira civilização histórica – ou seja, depois da invenção da escrita e da ideia de documentação – a abraçar o vinho como alimento e elemento mitológico. Depois deles, a bebida nunca mais deixou de fazer parte da mesa e dos altares da civilização ocidental, ou pelo menos da cultura dominante.
A rica e profícua mitologia grega explicava o mundo natural, a origem das coisas e as atribuições sobrenaturais com uma riqueza até hoje não igualada.
O médico austríaco Sigmund Freud (1856/1939), criador da psicanálise e um dos maiores estudiosos do comportamento humano, lançou mão dos paralelismos traçados pelos filósofos gregos como analogias de seus fundamentos: os mitos de Édipo, Electra, entre outros.
Também devemos à filosofia grega, surgida seis séculos antes de Cristo, a prática política, a democracia e as bases da ciência e da razão. Os filósofos e sábios, chamados simposiarcas, se reuniam nos simpósios, encontros de discussão filosófica regados a vinho – algo semelhante ao que ainda eventualmente praticamos com os amigos, em casa ou nas mesas dos bares e restaurantes. Simpósio significa “beber juntos” em grego, embora os mais sérios e formais simpósios atualmente sejam realizados “a seco”. Infelizmente.
Mas também devemos aos helênicos a expansão dos vinhedos pelas terras da Grécia Antiga, um vasto império que se estendia pelas costas do Mediterrâneo e abarcava todo o sul da Itália (chamada de Enotria Tellus, a terra do vinho) e as ilhas daquele mar, especialmente a Sicília (a Magna Grécia),
mas também a Córsega, bem como o sul da França e o litoral mediterrânico da Península Ibérica.
Entre o panteão de deuses que cobria quase todo o universo do comportamento humano e da fenomenologia, Dionísio se destacava como a divindade encarregada de prover fertilidade, através da terra e também da reprodução humana.
Daí as celebrações dionisíacas, posteriormente chamadas de bacanais – os Romanos alteraram o nome do deus para Baco –, rituais com procissões e festividades que celebravam as boas colheitas e agradeciam pelos períodos férteis, serem confundidas com orgias sexualizadas – o que provavelmente também eventualmente acontecia…
VINHOS RESINADOS
Os vinhos de então eram certamente muito diferentes dos atuais – provavelmente intragáveis pelos padrões de hoje –, não só pela precariedade dos sistemas e do conhecimento de vinificação e do controle sobre a ação das leveduras – fungos microscópicos que transformam, através de reações bioquímicas os açúcares da fruta em álcool–, mas pela presenca de bactérias, como a Acetobacter, e leveduras indesejadas, como a Bretanomices. Talvez por isso, os gregos bebessem seus vinhos com misturas estranhas, como água do mar e resina vegetal. O vinho Retsina, até hoje apreciado na Grécia, é um dos vinhos que mais nos trazem (talvez, com alguma pesquisa, ainda seja possível encontrar algum exemplar no Brasil) os sabores ancestrais da bebida. Ele recebe a adição de resina de pinheiro e é bastante estranho para quem não está habituado.
Há por outro lado vinhos gregos modernos bastante atraentes no mercado, com muita personalidade e produzidos a partir de uvas autóctones específicas, como Agiorgitiko (o Sangue de Hércules), Assyrtiko e Xynomavro, entre outras.