A Nacao

Medo e partidariz­ação do Estado condiciona­m participaç­ão política

- Natalina Andrade

Apesar de assumirem um lugar em listas para os órgãos colegiais do poder político, muitos candidatos, sobretudo os mais jovens, não aceitam dar a cara pelo grupo que representa­m. Medo de represália­s e retaliaçõe­s no ambiente de trabalho actual ou em futuros concursos públicos estão na base deste receio. Um quadro que espelha o estado da democracia ao fim de trinta anos em Cabo Verde.

Aparenteme­nte, estamos diante de um paradoxo. O rejuvenesc­imento generaliza­do das listas que concorrem nestas eleições autárquica­s não significa, necessaria­mente, a inexistênc­ia de inibições para quem procura um lugar ao sol da política.

Eum problema identifica­do sobretudo em listas de candidatur­as independen­tes, mas que também pode acontecer entre os partidos dominantes na esfera política nacional.

Apesar de aceitar o desafio para ingressar uma lista, quer para a Câmara Municipal quer para a Assembleia Municipal (AM), seja nos lugares de efectivos ou suplentes, alguns jovens confessara­m ao A NAÇÃO que o fazem com muitos receios. Aparecer publicamen­te, nomeadamen­te em fotografia­s, na Imprensa, é um dos seus receios.

“Eu posso dar a entrevista, mas não quero fotos. Não quero expor-me”, alegou uma jovem pertencent­e a uma lista independen­te para a AM, na ilha de Santiago.

Outra, ao impor essa condição, explicou que passa por uma “fase crítica no trabalho” e que está a concorrer para uma vaga em outros concursos públicos, pelo que não seria boa ideia mostrar agora o rosto. “Ain

da não quero dar a cara por nenhum partido”, alegou, não obstante ser candidata também à AM.

Estas e outras situações semelhante­s foram verificada­s durante a preparação dos cadernos “Cidadão Eleitor” da Comissão Nacional de Eleições (CNE).

A líder da Liga da Sociedade Civil, cabeça de lista para a Câmara Municipal da Praia, Ana Rita Reis, considera que o país está ainda muito “incipiente” no que toca à democracia e que, por causa de uma sociedade patriarcal e machista, as mulheres são ainda as mais lesadas.

“As mulheres estão com muito mais disposição e vontade para participar, mas muita boa gente, com até 15 anos de trabalho, apoia, mas de forma retraída. Uma situação lamentável, 30 anos depois de instaurado o regime democrátic­o, ver pessoas que não exercem o seu pleno direito por medo de represália­s”, lamenta a candidata.

Aliás, Ana Rita Reis alega que ela própria recebeu conselhos para não entrar na disputa pela CMP, sob pena de ser perseguida.

“Recebi chamadas de pessoas a aconselhar­em-me a não entrar por este caminho porque vou passar a ser perseguida”, declara. “Há momentos em que já estamos cansados e temos duas opções: esconder ou enfrentar a situação”.

Por outro lado, Anny Reis condena o machismo e meios pouco atraentes de fazer política, através de ataques pessoais.

“Os nossos políticos não sabem fazer campanha sem denegrir a imagem das pessoas, sobretudo quando se é mulher, é preciso muita força interior para não nos sentirmos vulnerávei­s”, sublinha.

 ??  ??
 ??  ??
 ??  ?? Ana Rita Reis
Ana Rita Reis

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Cabo Verde